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Por que a China concentra mais de 70% do mercado global de celulares 5G?

Por| 29 de Setembro de 2020 às 20h00

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Samsung
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Relatório divulgado pela consultoria Counterpoint Research aponta que a China representou 72% do faturamento do segmento de celulares 5G no segundo trimestre de 2020. Apesar da porcentagem desproporcional em relação a outros mercados, o número pode ser explicado por uma série de fatores, incluindo o investimento em infraestrutura, disponibilidade de aparelhos e componentes e, claro, a participação do governo.

O dado foi revelado em meio a uma pesquisa apresentando uma queda geral no comércio de celulares ao redor do mundo, influenciada pela pandemia da COVID-19. Apesar da baixa nas vendas, a consultoria identificou que o preço médio de venda dos aparelhos (ASP, na sigla em inglês) cresceu em todos os mercados, exceto na América Latina.

A aumento da média de preço dos celulares adquiridos na China, que cresceu 13% na comparação com o valor dos aparelhos comprados no segundo semestre de 2019, ajuda a entender o sucesso dos aparelhos 5G no país asiático, resultado que pode ser atribuído a diversas causas que se juntaram no período.

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Investimento estatal

Diferentemente do que acontece na maioria dos países ocidentais — incluindo o Brasil —, a infraestrutura das redes de telecomunicações na China é em grande parte um investimento público. As três operadoras nacionais (China Telecom, China Mobile e China Unicom) são controladas pelo governo, e parte da estrutura usada por elas é resultado de projetos tocados pelos governos locais.

O que já era tratado como prioridade nacional, para reduzir a distância tecnológica do país em relação aos Estados Unidos em setores como carros autônomos, ganhou um impulso com a COVID-19. A pandemia foi vista como oportunidade para investimentos em sistemas médicos conectados, realidade virtual na indústria, educação à distância e outros projetos de tecnologia.

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Em março, quando o país já reduzia as restrições em resposta à pandemia, as operadoras China Unicom e China Telecom anunciaram a aceleração do plano de instalação de estações-base (leia-se antenas), com a construção de 250.000 estações 5G até o final do terceiro trimestre, contra 130.000 instaladas pelas três empresas durante o ano de 2019.

Para efeito de comparação, o total de estações-base das operadoras brasileiras era de 106.226 em agosto de 2020, segundo números da Anatel compilados pela consultoria Teleco.

Um dos motivos para a agilidade de implantação do outro lado do mundo está novamente no envolvimento estatal, enquanto por aqui as operadoras enfrentam a burocracia e uma avalanche de leis para a instalação de cada nova torre.

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21 governos provinciais do país asiático — equivalentes aos governos estaduais brasileiros — anunciaram planos de investimento em estações-base para redes 5G neste ano. Dados da GSMA indicam que o investimento público em telecomunicações em 2019 na China foi superior a R$ 500 bilhões, e a previsão é que, já em 2025, metade das conexões móveis no país serão feitas pelas redes de nova geração.

No último mês, o ministério chinês de indústria e tecnologia da informação anunciou que as cidades de Shenzhen e Pequim alcançaram cobertura total por redes 5G. A divulgação destaca o investimento dos governos locais, que se confunde com a participação das operadoras nas notícias vindas do país.

O outro lado da moeda é que críticos do governo chinês podem argumentar que o investimento na digitalização pode ser usado como ferramenta de monitoramento de seus cidadãos. A estrutura do 5G pode ser aplicada para turbinar os sistemas de reconhecimento facial e crédito social usados no país, por exempo, além de facilitar a censura contra opositores e suprimir minorias étnicas e religiosas, como os muçulmanos uigures e os tibetanos.

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Abertura dos mercados

Outro fator que ajudou na participação da China no “mercado 5G” durante o segundo trimestre foi a reabertura da indústria e do comércio no país após o pico da pandemia da COVID-19. Enquanto os países ocidentais começavam a implementar medidas de restrição à circulação para conter a expansão do novo coronavírus, a China foi exemplar na contenção da disseminação da doença e já começava a relaxar suas restrições.

O resultado foi que, enquanto o comércio fechava nos países da Europa e das Américas, as lojas chinesas já reabriam. E quando os clientes voltaram a consumir, as operadoras e fabricantes já estavam prontas para oferecer aparelhos 5G, aumentando mais do que duas vezes a participação nas vendas dos novos modelos na comparação com os primeiros três meses do ano.

Economia digital

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Junto com o investimento estatal, a penetração das tecnologias móveis na China foi um fator que não só incentivou a injeção de recursos públicos, como também a adoção dos novos aparelhos pelos consumidores. A importância de “superapps” como o WeChat na China destaca a relevância das redes móveis, que possibilitam ao aplicativo substituir em um só lugar serviços como o WhatsApp, pagamentos móveis, aluguel de veículos, compra de passagens, ingressos e reservas de hospedagem e agendamento de consultas médicas.

A pandemia impulsionou ainda a adoção de tecnologias como telemedicina, educação à distância e trabalho remoto, o que reforçou ainda mais a importância das redes de telecomunicações, especialmente em um país que praticamente “pulou” a adoção de PCs e celulares básicos para ir direto para os smartphones e tablets como dispositivos de computação pessoal.

Disponibilidade de produtos

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Apesar de a rede 5G só ter chegado comercialmente à China na segunda metade de 2019, o mercado no país se preparou rapidamente para dar conta da demanda. Não apenas a infraestrutura se expandiu rapidamente, como as fabricantes estavam prontas para oferecer aparelhos compatíveis.

Mas as marcas chinesas não estavam igualmente prontas para o crescimento do 5G. A Huawei em especial registrou uma expansão durante o período, conquistando 60% das vendas de aparelhos de nova geração — contra 46% do total do mercado de celulares no país. Um dos fatores que ajudam a entender a fatia de mercado é que a empresa, com a ajuda de sua subsidiária HiSilicon, estava “no lugar certo, na hora certa”.

No final do primeiro trimestre, a gigante chinesa anunciou o processador intermediário Kirin 820 com modem 5G integrado. O componente equipa aparelhos na faixa de preço abaixo dos R$ 2.000 e ajudou a baratear o acesso às redes de nova geração.

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O segundo trimestre do ano na China teve uma série de anúncios de novos modelos 5G, com aparelhos equipados com o chip Snapdragon 765 quebrando a mesma faixa de preço, caso do Xiaomi Mi 10 Youth 5G, e um verdadeiro batalhão de novos componentes 5G da fabricante taiwanesa MediaTek e modelos equipados com eles.

A demanda pelos processadores 5G da MediaTek na China foi tamanha que os celulares equipados com eles sequer foram oferecidos em outros países.

Paralelo a isso, a norte-americana Qualcomm também anunciou seus próprios processadores intermediários 5G, com a chegada da nova conexão aos chips da linha Snapdragon 600 e a promessa de CPUs básicas da linha Snapdragon 400 com 5G já para o começo de 2021.

Tendência temporária

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Apesar do domínio chinês na venda de aparelhos 5G no segundo trimestre do ano, alguns fatores devem reorganizar a fatia do segmento representada pelos consumidores do país. O primeiro é a reabertura do comércio no ocidente ao longo da segunda metade do ano, além das datas comerciais — Prime Day, Black Friday e Natal.

Outro ponto são as sanções comerciais impostas pelos Estados Unidos à Huawei e potenciais fornecedores da marca chinesa, que afetam diretamente o estoque de seus chips 5G, fabricados pela taiwanesa TSMC. Com número limitado de processadores, analistas estimam que as vendas da fabricante devem despencar ao longo dos próximos trimestres.

Um terceiro fator é o lançamento do iPhone 12, e a esperada estreia do modem 5G nos celulares da Apple. As milhões de unidades que o celular vende a cada ano por si só devem impulsionar a adoção do novo padrão — inclusive por pessoas que não dão a mínima para a tecnologia — e irão ampliar a participação nas vendas de aparelhos de nova geração nos países em que a marca norte-americana é tradicionalmente forte, como nos Estados Unidos e Inglaterra.

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Fonte: Counterpoint Research, Xinhua, Reuters, Teleco, GSMA