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Obituário: morte do DCEU enterra uma década de frustração

Por| Editado por Durval Ramos | 21 de Dezembro de 2023 às 19h00

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Universos cinematográficos podem parecer a ideia mais batida hoje em dia, com vários estúdios tentando emplacar suas franquias interligadas, com variados resultados de sucesso ou fracasso retumbante. Só que existiu um momento em que a simples ideia de unir diferentes franquias de forma coesa parecia loucura. De certa forma, ainda é, vide a quantidade de iniciativas que morreram com poucos filmes. E o Universo Cinematográfico Estendido da DC (DCEU, na sigla em inglês) foi um deles, embora tenha levado uma década para aceitar seu fim.

A Warner Bros flertou várias vezes com a ideia de lançar filmes que juntavam vários heróis da DC Comics. Em 2002, o diretor Wolfgang Petersen (Tróia) quase fez um filme do Superman lutando contra o Batman. Em 2007, o diretor George Miller (Mad Max: Estrada da Fúria) assinou contrato para dirigir um longa da Liga da Justiça, mas sem conexão alguma com as adaptações que Christopher Nolan estava dirigindo para o estúdio.

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Só que, depois de a Marvel mostrar que essa conexão dava muito certo, a Warner resolveu investir nessa ideia meio que à força. Foi assim que, em 2013, nasceu o DCEU. E, dez anos depois, chegou a hora de enterrar esse universo.

Um começo promissor, mas já quebrado

Em 2008, a Marvel pegou todo mundo de surpresa com o lançamento de Homem de Ferro. A ideia de universos compartilhados não era nova nos cinemas, mas o plano iniciado com o filme de Jon Favreau parece ter capturado um raio numa garrafa. Heróis até então considerados de segundo escalão da editora de quadrinhos seriam apresentados em filmes solo, convergindo em um épico com todos os heróis formando a equipe dos Vingadores.

Era uma ideia ousada, mas que funcionou muito bem. Até então, a Marvel conseguia emplacar algumas franquias, como Homem-Aranha e X-Men, mas de estúdios rivais e sem relação umas com as outras. O Universo Cinematográfico da Marvel, o MCU em inglês, reunia todas as propriedades disponíveis na época em franquias separadas, compartilhando a mesma timeline. Era como os quadrinhos, mas no cinema.

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Na mesma época, a Warner tinha em suas mãos dois filmes do Batman que foram sucesso de público e crítica. Batman: O Cavaleiro das Trevas, estreou no mesmo ano que Homem de Ferro, faturando mais de US$ 1 bilhão nas bilheterias mundiais e um Oscar póstumo de melhor ator coadjuvante para Heath Ledger.

Christopher Nolan não gostava da ideia de usar a sua versão do Homem-Morcego com outros super-heróis, conseguindo fazer com que seus filmes estivessem em sua própria timeline. Mesmo assim, Nolan concordou em ser produtor executivo de um novo filme do Superman. 

Após o projeto ser oferecido a Guillermo del Toro e Robert Zemeckis, que precisaram recusar por estarem envolvidos com outros filmes, diretores como Duncan Jones (Lunar), Darren Aronofsky (Cisne Negro), Ben Affleck (Argo) e Matt Reeves (The Batman) foram cogitados. Em 2010, o escolhido foi Zack Snyder (Sucker Punch).

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Homem de Aço estreou nos cinemas de todo o mundo em 2013, finalmente começando o universo que a Warner tanto queria criar nos cinemas. Nascia ali o DCEU.

O filme foi relativamente bem aceito, apesar de muitos fãs terem torcido o nariz para algumas decisões relacionadas à forma em que o Superman foi retratado no filme. Interpretado por Henry Cavill, o personagem parece pouco com o símbolo da esperança que todos conheciam dos quadrinhos, seu relacionamento com a humanidade parecia um pouco estranho, além de um final bastante questionável.

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Apesar de não ter sido um sucesso retumbante, Homem de Aço trazia boas qualidades e, por mais que as escolhas de Zack Snyder não fossem as melhores, era uma base para que o personagem pudesse evoluir em próximos filmes. Só que as coisas foram por um caminho que decidiu todo o destino do Universo DC nos cinemas.

"Você sangra? Você vai!"

A ideia de colocar em um filme a Trindade da DC era algo que os fãs de quadrinhos queriam ver acontecer há décadas. Independente de qual editora você é mais fã, a animação de todo mundo era palpável quando a Warner anunciou que o próximo filme do seu universo colocaria Batman e Superman juntos na tela.

O estúdio apostou novamente em Zack Snyder para dirigir Batman vs Superman. O título já deixava claro que os dois heróis sairiam na porrada, trazendo elementos da história escrita por Frank Miller nos anos 80, Batman: O Cavaleiro das Trevas.

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O anúncio de que Ben Affleck seria o novo Batman pegou todo mundo de surpresa, assim como a escalação de Gal Gadot, que até então tinha feito participações apenas em filmes da franquia Velozes e Furiosos, como a Mulher-Maravilha.

As primeiras imagens mostravam um Batman com um visual bastante fiel aos quadrinhos, praticamente um tanque em forma de homem. A revelação da primeira imagem da Mulher-Maravilha também foi muito bem aceita durante a San Diego Comic-Con em 2014. Uma cenaque mostrava o Batman com uma armadura esperando para lutar contra o Superman impressionou todos os presentes.

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Ao mesmo tempo, algumas escolhas de Snyder já mostravam ser um pouco estranhas, como a escalação de Jesse Eisenberg (A Rede Social) como Lex Luthor, mas o público ainda estava esperançoso. 

A estreia de Batman vs Superman: A Origem da Justiça, em 2016, se mostrou ainda mais importante porque a Warner revelou que o filme traria participações de outros heróis da DC, levando até um longa da Liga da Justiça. Só que o filme dividiu severamente a opinião pública — e mostrou como esse universo estava completamente sem rumo.

Enquanto uma parcela do público adorou o tom mais "sombrio e violento" de Zack Snyder, priorizando momentos ao desenvolvimento de personagens e história, o resto rejeitou completamente a maneira como a trama foi trabalhada e, principalmente, como o Superman foi retratado. De repente, tínhamos um filme em que ele questionava se devia proteger a humanidade, algo que não combina com o personagem.

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Para muitos, Batman vs Superman é pelo menos três filmes misturados que resultam em um que não consegue agradar quem deveria. A adaptação arrecadou US$ 874 milhões, o que não é uma quantia pequena, mas que foi considerada um fracasso pelos custos do filme e pelo potencial que ele trazia. A primeira aparição de Superman, Batman e Mulher-Maravilha tinha que ter rendido mais.

Mudanças internas e insistência em um modelo que não dava certo

Durante os dez anos de filmes da DC, a Warner passou por várias mudanças de liderança, com direito a uma fusão enorme com a Discovery. Isso fez com que o direcionamento das adaptações fosse transferido para várias pessoas. No início, o autor de quadrinhos Geoff Johns se tornou responsável pelas produções, ao lado de executivos como Walter Hamada, o que parecia ser um bom norte — mas que não se sustentou por muito tempo.

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A visão mais sombria e "adulta" de Zack Snyder foi abraçada como uma forma de diferenciar o então intitulado DCEU dos filmes da Marvel. O problema é que isso foi feito de um jeito que agradava a um público cada vez menor a cada estreia do estúdio.

Mesmo assim, algumas adaptações acabavam se destacando. Se Esquadrão Suicida, de David Ayer, foi massacrado pela crítica, Mulher-Maravilha, de Patty Jenkins, lançado em seguida, foi muito bem aceito. O filme da Liga da Justiça, que uniria o grupo pela primeira vez nos cinemas, tinha tudo para dar certo. Mas não deu.

Novamente dirigido por Zack Snyder, o longa supostamente teria um tom mais leve, em resposta às reclamações do público em BvS. Antes da produção acabar, Snyder deixou a cadeira de diretor por conta de uma tragédia em sua família. Joss Whedon, diretor de Os Vingadores, assumiu a posição, terminando as filmagens e sua pós-produção.

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Em 2017, Liga da Justiça chegou aos cinemas e boa parte do público desaprovou a versão. Anos depois, relatos sobre vários problemas com o comportamento de Whedon durante seu tempo envolvido com a produção surgiram, dando um panorama melhor do porque as coisas não deram certo.

O filme arrecadou US$ 657,9 milhões de dólares, um valor absurdo quando estamos falando de um blockbuster dessa magnitude. Desse filme para frente, a Warner parece ter perdido o controle do DCEU e passou a atirar para todos os lados.

Às vezes, o estúdio acertava, como aconteceu com o sucesso de Aquaman, que faturou mais de US$ 1 bilhão de dólares e foi aprovado pelos fãs. Shazam também teve um sucesso moderado, ainda que tenha sido mais um acerto. Só que Aves de Rapina e Mulher-Maravilha 1984 falharam em cativar o público.

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Atores começaram a demonstrar pouca vontade de voltar para seus papeis, como Ben Affleck, que alegou problemas particulares para não interpretar o Batman ou dirigir o filme solo do herói — mais tarde, ele disse que viver o Homem-Morcego quase fez com que ele desistisse de atuar. O filme acabou sendo retrabalhado como uma produção fora do DCEU, estrelado por Robert Pattinson.

Enquanto isso, uma parcela bem vocal da internet clamava pelo retorno daquele que muitos consideravam o salvador do DCEU: Zack Snyder.

A maldição do Snyderverso

Durante anos após o lançamento de Liga da Justiça, Zack Snyder alegava que tinha uma versão do filme que trazia diferenças sensíveis em relação ao longa que chegou aos cinemas. Participação de outros heróis, um foco em preparar terreno para a chegada do vilão Darkseid, com a aparição do próprio, entre outras promessas foram feitas. 

Isso fez com que fãs começassem uma campanha para que a Warner lançasse de alguma forma essa versão, seja nos cinemas ou em home video. Executivos da Warner foram vítimas de ataques na internet por malucos que clamavam pelo Snyder Cut da Liga da Justiça.

Criou-se uma noção de que todos os problemas do DCEU seriam resolvidos com o lançamento dessa versão do diretor, que supostamente estaria pronta, mas que a Warner se recusava a lançar. Anos de campanhas e ataques gratuitos na internet fizeram com a liderança da Warner se reunisse com Snyder para saber o quão pronto estava o filme.

O diretor revelou que precisava de gravar mais cenas, necessitando que o elenco retornasse para participar dessas gravações. Liga da Justiça, que já tinha custado à Warner aproximadamente US$ 300 milhões, custou mais US$ 70 mi para terminar o que supostamente já estava pronto. Na prática, o Snydercut nunca existiu. O que existia era uma ideia que o Snyder não conseguiu filmar porque deixou a produção.

Liga da Justiça de Zack Snyder foi lançado em 2021 na HBO Max, melhorando em alguns aspectos o filme original, piorando em outros, mas só complicava a vida de todo mundo ao preparar terreno para filmes que não seriam feitos. O gancho deixado no final da versão fez com que fãs do diretor cobrassem a Warner a ignorar tudo o que estava fazendo para que Snyder pudesse voltar e dar continuidade ao seu "Snyderverso".

Felizmente, os executivos da Warner não deram mais atenção e tentaram seguir o fluxo de seus planos.

Uma nova esperança

Entre os novos filmes do DCEU, uma espécie de reboot e continuação de O Esquadrão Suicida foi dirigido e escrito por James Gunn, diretor da trilogia Guardiões da Galáxia, da Marvel. O diretor havia sido demitido por piadas feitas uma década antes e não dirigiria a conclusão da trilogia dos Guardiões.

Nesse período, a Warner conseguiu atraí-lo, oferecendo até mesmo um filme do Superman para ele. Gunn preferiu algo mais do seu gosto, abraçando uma nova história com a Força Tarefa X. O filme deu certo, inclusive gerando um spin-off para o streaming na forma da série O Pacificador. O diretor acabou voltando às graças da Marvel e retornou para fazer seu último filme com o estúdio, Guardiões da Galáxia Vol 3. Só que Gunn continuou no radar da Warner.

Novas lideranças buscavam alguém para cuidar da divisão de adaptações da DC Comics. Assim como Kevin Feige cuida do Marvel Studios, a DC precisava de alguém para liderar o DC Studios. A Warner já estava sendo bastante criticada por ter engavetado um filme da Batgirl que já havia sido completamente filmado, tentando encontrar alívio fiscal para seus problemas financeiros.

Em outubro de 2022, James Gunn e o produtor Peter Safran foram escolhidos para serem co-CEOs do DC Studios, iniciando uma nova era dentro da Warner. Só que para iniciar essa nova era, seria necessário enfrentar mais drama.

The Rock e sua tentativa de golpe

Na mesma época, Adão Negro chegou aos cinemas de todo o mundo. O filme estrelado por Dwayne "The Rock" Johnson estava em pré-produção desde o início dos anos 2000, quando o ator começou a mexer seus pauzinhos para fazer com que o vilão do Shazam ganhasse um filme solo.

Ao longo da divulgação de Adão Negro, Johnson ficava falando que seu filme mudaria todo o panorama do universo DC nos cinemas, que seu objetivo era enfrentar o Superman e mostrar quem era o mais poderoso. Em cada nova entrevista, ficava claro que o The Rock não se importava tanto com o personagem quanto "parecer mais forte que o Superman".

Nesse período, Henry Cavill parecia ter deixado o papel de Clark Kent para trás, estrelando a adaptação de The Witcher. Só que The Rock ficava prometendo algo que parecia não poder cumprir, até que, na malandragem, conseguiu.

Johnson e seus parceiros de negócio Dany Garcia e Hiram Garcia, conseguiram um acordo com a então diretoria de filmes da Warner Bros para que Cavill fizesse uma participação como Superman na cena pós-créditos de Adão Negro. Após praticamente falar "O Superman está no filme" logo antes da estreia, o Superman apareceu no filme.

Cavill foi até o seu Instagram para anunciar o seu retorno ao DCEU, agradecendo os fãs pela sua paciência.

Só que tinha um problema aí. Gunn e Safran, os novos chefes do DC Studios, não aprovaram nada disso e tinham carta branca para resetar todo o universo de filmes da DC. Cavill não tinha nenhum contrato além da participação em Adão Negro.

Não demorou muito para que os novos responsáveis precisassem falar com o ator, que revelou em seu Instagram que não voltaria mesmo como Superman, já que o estúdio seguiria com uma nova versão do personagem. 

Johnson também viu seus planos de ser o grande líder do DCEU irem por água abaixo. O drama parecia estar no fim, mas nada é fácil para o universo DC nos cinemas.

The Flash e um ator completamente descontrolado

James Gunn anunciou uma nova leva de adaptações que marcaria o início do DCU, o novo universo da DC nos cinemas e streaming. Filmes e séries farão parte dessa nova empreitada, que deve começar a partir de 2024. Só que o DCEU ainda estava vivo.

Uma sequência de Shazam, Aquaman o filme solo do Flash e a estreia de Besouro Azul e estavam em produção. Enquanto Shazam! Fúria dos Deuses estava caminhando bem para a sua estreia, o mesmo caso de Besouro Azul, as aventuras de Barry Allen e Arthur Curry tinham problemas.

Enquanto Aquaman 2: O Reino Perdido não parecia agradar ninguém em exibições teste, The Flash tinha um problema enorme chamado Ezra Miller. O astro do longa tentou gabaritar o código penal americano, todo mês ficando envolvido com alguma polêmica potencialmente perigosa.

O filme, que poderia dar o pontapé para o reboot por adaptar o arco Ponto de Ignição, que tratava de viagens no tempo e multiverso, ainda traria o retorno de Michael Keaton (Os Fantasmas se Divertem) no papel do Batman. Até Ben Affleck foi convencido a retornar uma última vez ao papel de Bruce Wayne.

Só que cada estreia da DC em 2023, se mostrou mais fraca do que o esperado. Independente da qualidade dos filmes, o público parecia ter finalmente desistido do DCEU. Aliado a uma possível fadiga com o gênero de super-heróis, os filmes da DC não ajudaram muito a mudar essa percepção.

A estreia de Aquaman 2: O Reino Perdido mostra que esse universo iniciado meio de qualquer jeito lá em 2013 já estava dando seus últimos suspiros. É notável que o maior problema do DCEU foi ter apostado todas as suas fichas na visão de um diretor divisivo, sem que existisse um plano claro para o seu futuro. 

James Gunn também pode ser divisivo, mas seu currículo, que inclusive cruza com o de Zack Snyder (Gunn é roteirista de Madrugada dos Mortos, primeiro filme de Snyder), mostra sucessos que podem fazer mais sentido para a DC.

Foram dez anos de "Agora vai?" e decepções logo em seguida. O DCEU está morto. Nadou, nadou, e morreu nas praias de Atlântida com um Aquaman que ninguém mais parece se importar. A esperança é que, tal qual já aconteceu várias vezes nos quadrinhos, ele renasça um pouco diferente. Resta saber se melhor ou não.