Crítica O Esquadrão Suicida | A redenção que veio ao aceitar o ridículo
Por Durval Ramos • Editado por Jones Oliveira |
Mesmo cinco anos após seu lançamento, o Esquadrão Suicida ainda é lembrado como um filme terrível — e não sem razão. E por mais que haja outras adaptações de quadrinhos piores, ele virou um estigma no currículo da DC por não entregar o que prometeu. No embalo do sucesso de Guardiões da Galáxia e Deadpool, todos os trailers nos venderam algo caótico e divertido, algo bem diferente do que vimos nas telonas. Só que, mais do que essa traição de expectativa, a versão de David Ayer falhou ao se levar a sério demais onde não precisava.
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Dito isso, a entrada de James Gunn na sequência era justamente o que faltava à Warner para dar o tom que o grupo de vilões necessita. Afinal, o que poderia sair de um filme protagonizado por um bando de personagens absurdos além de um próprio filme ridículo? Por mais que isso soe como uma crítica, o fato de O Esquadrão Suicida abraçar sem qualquer vergonha o burlesco e o estranho faz dele um filme incrível.
Ele é aquilo que a gente já conhece do diretor em Guardiões da Galáxia — ou seja, um apanhado de personagens desconhecidos em um grupo disfuncional —, mas elevado à enésima potência. Isso significa que temos um Gunn totalmente à vontade para fazer suas maluquices, o que implica em muitas piadas, violência e ação em um ritmo quase desenfreado e que, mesmo assim, consegue fugir do óbvio e do piegas e entregar uma história bastante divertida.
Atenção! Daqui em diante esta crítica pode conter spoilers.
Elenco de peso para vilões de terceira
Quando O Esquadrão Suicida foi anunciado, a maior surpresa não foi o fato de a equipe ser formada por vilões desconhecidos até mesmo para leitores de quadrinhos, como o Doninha (Sean Gunn), Dardo (Flula Borg) e o próprio Pacificador (John Cena) e Sanguinário (Idris Elba). O que mais chamou a atenção foi o filme reaproveitar personagens como Arlequina, Rick Flag e Amanda Waller, dando continuidade à história de 2016 que todo mundo queria esquecer.
Só que mal o longa começa e a gente entende o porquê de manter parte desses atores. Viola Davis entrega uma Waller monstruosa em todos os sentidos, seja pela sua interpretação que te convence com apenas um olhar do quão poderosa ela é ou pelas suas próprias ações questionáveis. Já Margot Robbie prova por que ela é a Arlequina e segue divertidíssima — e nem mesmo o papel de coadjuvante de luxo apaga seu brilho.
E o retorno de Joel Kinnaman como Rick Flag é o que mais faz sentido. O Esquadrão Suicida deixa de lado a imagem do personagem como o militar genérico e dá muito mais personalidade a ele, principalmente por ser o único que sabe lidar com aquele bando de desajustados. Isso deixa toda a trama muito mais rica, pois ele consegue conectar vilões absurdos como a própria Arlequina e o Bolinha (David Dastmalchian) com a parte mais séria do grupo, como o já citado Sanguinário.
Isso tudo faz com que esse grupo de vilões bizarros seja muito, mas muito carismático. Pouco importa que eles sejam grandes desconhecidos do público, uma vez que funcionam muito bem quando colocados lado a lado na telona. E, assim como deu certo com os Guardiões da Galáxia na Marvel, a tensão e o fato de o time não ter nenhum entrosamento é o que torna tudo muito divertido. A rivalidade entre Sanguinário e Pacificador é muito bem explorada, da mesma forma que a falta de humanidade do Tubarão-Rei rende não apenas boas risadas, mas também alguns momentos muito bonitinhos.
A maior surpresa nesse sentido, contudo, está na personagem Caça-Ratos 2 (Daniela Melchior). Ela foi criada especialmente para o filme e todo mundo se perguntou por que James Gunn preferiu usar uma segunda versão de um vilão do Batman tão bucha quanto o Caça-Ratos original. E o filme responde isso muito bem, entregando uma das melhores personagens do longa e que adiciona muito coração à história repleta de sangue e explosões. Aliás, ela é a responsável por também trazer Sebastian para o Universo Cinematográfico Estendido da DC (DCEU, na sigla em inglês) — esse, sim, a melhor coisa de todo o longa.
Essa pluralidade de vilões buchas que se revelam grandes surpresas é o principal trunfo de O Esquadrão Suicida, pois você não sabe bem o que esperar de nenhum deles e o diretor James Gunn consegue fazer com que cada um tenha seu momento. Ainda que o protagonismo fique em torno do Sanguinário, a liderança que ele assume da Força-Tarefa X justifica a presença de cada um dos demais membros e é muito bom ver todo mundo em ação.
Ao mesmo tempo, a ótima dinâmica criada ao longo da história também faz com que cada perda seja sentida. Ao contrário do que vimos em 2016, a nova película não tem medo de matar quem quer que seja, quebrando um dos maiores tabus dos filmes de super-heróis. Afinal, como se impactar quando você sabe que os mocinhos vão sempre escapar? Pois O Esquadrão Suicida mostra que, nesse caso, ninguém está a salvo — e, por isso, toda a conexão construída com o público é tão importante.
Só que, tão vital quanto essa dinâmica, o grande acerto do filme está em aceitar o quanto tudo isso é ridículo. O roteiro faz questão de destacar o quanto cada um dos personagens é bizarro, o quanto a ideia de juntar esse bando de malucos não faz sentido e que invadir uma republiqueta sul-americana para enfrentar uma estrela-do-mar gigante é absurda. E ao deixar claro tudo isso, é como se ele tivesse salvo-conduto para criar situações exageradas e pesar a mão inclusive na violência. A bizarrice é a todo momento realçada e você simplesmente aceita. Assim como uma boa história em quadrinhos, aquela bobajada está ali apenas para te divertir — e, nesse quesito, o filme se sai muito bem.
Sem freios e um pouco descontrolado
Por outro lado, dizer que James Gunn comandou O Esquadrão Suicida completamente sem freios também significa que ele seguiu descontrolado e cometendo alguns acidentes pelo caminho. O maior deles é esticar demais a história sem grandes necessidades.
Ao todo, O Esquadrão Suicida tem 2h12, mas a sua história poderia ser facilmente contada com uns 15 minutos a menos sem grandes prejuízos. Há uma enorme barriga no segundo ato que quebra o ritmo da trama e estica o roteiro sem nenhuma necessidade irremediável. Trata-se de um trecho todo feito para dar mais destaque à Arlequina, mas que não leva o filme a lugar nenhum, podendo ser resolvido em uma ou duas linhas de diálogo.
O porquê disso é óbvio: Margot Robbie é uma das estrelas do filme, a personagem é amada pelo público e ela não tem um grande destaque na trama como um todo — embora todas as suas participações sejam ótimas. Assim, a impressão que fica é que há todo um trecho que foi imposto pelo estúdio para agradar aos fãs, mas que acaba prejudicando bastante o andamento da história.
Outro problema antecede a chegada de O Esquadrão Suicida aos cinemas. A Warner estava tão ávida em mostrar que o novo filme seria diferente daquele de 2016 e que, desta vez, teríamos toda a loucura que o grupo exigia que não economizou nos trailers. O problema é que isso entregou não apenas todas as piadas no material promocional, como também revelou a trama quase que completa do filme. Assim, se você acompanhou o marketing do longa, saiba que não há muito mais o que ver, já que o melhor foi exibido antes da estreia.
Sem medo do ridículo
Apesar de tudo, esses problemas não atrapalham o filme e O Esquadrão Suicida se mostra a volta por cima de um grupo que tinha tudo para ser enterrado e esquecido nos porões da Warner. É a prova de que você não precisa de medalhões como Batman e Superman para contar uma boa história. Quando você sai da sessão querendo ver mais da Caça-Ratos 2, é porque alguma coisa deu muito certo.
E o segredo está em aceitar aquilo que se é. Ao invés de esconder que se trata de uma história de quadrinhos, James Gunn faz questão de destacar isso, evidenciando cada exagero e absurdo que faz parte desse tipo de linguagem. E, pelo ridículo de toda a situação, traz a redenção que o Esquadrão Suicida merecia. É a prova de que não há problema algum em rir de si mesmo.