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Crítica The Flash | Filme acerta em trama que faz seu herói brilhar

Por| Editado por Jones Oliveira | 14 de Junho de 2023 às 18h30

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The Flash é um filme profundamente marcado pelos seus problemas de bastidores. Para além das controvérsias do ator Ezra Miller, o longa sofreu muitas transformações ao longo de quase uma década de produção, seja com mudanças radicais no roteiro ou no próprio universo da DC no qual ele está (ou deveria estar) inserido. E é impressionante como, mesmo com essa trajetória tão conturbada, o resultado ainda consegue ser tão positivo.

Tudo isso porque o diretor Andy Muschietti (It: Capítulo Dois) optou por seguir um caminho mais simples. Ainda que traga a temática do multiverso tão em voga no mundo dos super-heróis para brincar com participações especiais e versões alternativas, ele não se deixa levar por isso e usa esses elementos apenas como acessório dentro de uma aventura bem básica de origem. E é nessa simplicidade que explora aquilo que o personagem tem de melhor.

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Só que, ao mesmo tempo em que The Flash trabalha muito bem o caráter trágico de seu protagonista e a inevitabilidade do sacrifício do herói, ele também traz marcas bem claras desse caos que foi a produção do longa e repetindo vícios que levaram o universo da DC a diversas reformulações. E embora não sejam falhas que maculem o filme de forma severa, impedem que o Velocista Escarlate vá tão longe quanto poderia ir.

Uma história de origem disfarçada

O maior acerto de The Flash é ele ser um filme totalmente voltado para seu protagonista. Parece algo óbvio, mas as histórias de herói recentes parecem ter esquecido em meio a participações especiais, easter eggs e grandes sagas. Mesmo o longa sendo, em tese, o fechamento do Universo Cinematográfico Estendido da DC (DCEU, na sigla em inglês), ele trabalha muito bem o herói em sua jornada.

Não por acaso, esse é o ponto alto da trama. Ainda que a gente já conheça este Flash de filmes como Liga da Justiça, o roteiro trabalha muito bem esse Barry Allen (Ezra Miller) para dar mais profundidade e justificar seu jeito abobalhado como para apresentar uma evolução bastante convincente.

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É somente aqui que a gente conhece de verdade o personagem e acompanha sua transformação em algo além de alguém com poderes e um uniforme duvidoso. Mais do que isso, é ao conferir sua origem que vemos como ele também é uma figura trágica e como isso é algo definidor para sua história.

E aqui está a grande sacada de The Flash. A ideia de levar o Velocista Escarlate para o passado para tentar salvar a mãe é tanto uma forma de trazer as brincadeiras com o multiverso — como os quadrinhos fizeram em Ponto de Ignição, por exemplo —, como também para apresentar sua origem. E tudo isso é tão bem amarrado que impulsiona Barry para frente, criando um excelente arco de amadurecimento.

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Amarrar a trama àquela versão mais boboca do Flash que já havia sido mostrada em outros filmes foi uma decisão muito inteligente, pois serve tanto para consertar a interpretação de Miller e dar um tom mais sério para o papel ao mesmo tempo em que deixa clara a transformação pela qual ele passa ao encarar seu eu do passado.

E, por mais que a temática da responsabilidade do herói e a importância do sacrifício sejam temáticas bastante recorrentes em histórias assim — inclusive em produções recentes —, há um tempero a mais por aqui ao conectar esses assuntos à tragédia que é inerente a quem decide vestir um uniforme para salvar o mundo. Há uma fala do Batman de Ben Affleck logo no início que pontua como as cicatrizes são o que definem esses personagens e essa é uma lição muito bem trabalhada por esse Barry Allen ao tentar se livrar das suas dores.

Acertando o tom

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É nesse ponto que Miller surpreende com uma atuação bem mais sóbria como seu Barry principal. Ainda que ele comece todo afetado e cheio dos trejeitos, como em Liga da Justiça, tudo isso é bem fundamentado no arco inicial da história. E é ao se deparar com seu eu do passado (o Barry-2, como vamos chamar aqui em diante) que ele vira a chave para algo muito melhor.

A ideia do roteiro é mostrar uma versão do personagem mais jovem e inconsequente. Sem nunca ter perdido os pais, esse Barry-2 não cresceu marcado pela dor e, por isso mesmo, nunca foi forçado a amadurecer e a encarar as responsabilidades de sua outra variante. Há vários problemas nisso — já falaremos sobre —, mas essa diferença é bem construída a ponto de fazer o Barry-1 perceber o quanto seu jeito pode ser irritante e isso o direciona a essa evolução tão necessária.

O grande charme narrativo do multiverso não é apenas introduzir o máximo de referências e participações especiais possíveis, mas trabalhar essa temática do “e se”, explorando futuros possíveis a partir de mudanças pontuais. E The Flash usa isso muito bem ao mostrar como a “linha do tempo perfeita” criaria um Barry Allen completamente diferente e que, confirmando aquilo que o Bat-Affleck já tinha lhe dito antes, são as dores que formam o caráter heróico que ele tanto necessita. Citando um outro fantasiado, grandes poderes trazem grandes responsabilidades.

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Assim, o filme trabalha muito bem esse paralelo entre os dois Flashes para construir esse amadurecimento calcado na tragédia. E embora a temática não seja original e tenha sido recém-utilizada por Homem-Aranha Através do Aranhaverso, trata-se de um outro olhar igualmente interessante e que funciona bem.

Até porque The Flash sabe aproveitar o tom emotivo a seu favor a partir da relação de Barry com sua mãe. Essa conexão de mãe e filho é algo bem manjado, mas sempre muito poderoso por ser o tipo de relação universal e que é muito fácil de a gente reconhecer. E a trama usa isso a seu favor para criar cenas que são tão emocionantes quanto fundamentais na evolução do Velocista.

Isso é algo que fica bem claro quando a Supergirl (Sasha Calle) entra em cena. Por mais que a personagem tenha uma participação pequena dentro da história, ela rapidamente chama a atenção por ser alguém bem diferente do Superman que conhecemos. Mais agressiva e desconfiada com a humanidade, ela é alguém que também passou pela tragédia da perda, mas nunca teve a criação amorosa que Kal-El teve com os Kents ou que Barry teve com sua mãe. É mais um espalho que o roteiro usa para diferenciar seu protagonista e levá-lo adiante.

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Participações especiais

Mas não há como falar de The Flash sem citar as participações especiais. E, embora a Supergirl traga esse paralelo interessante, não se equipara ao peso de ter Michael Keaton de volta ao papel de Batman. O ator viveu o Homem-Morcego há mais de 30 anos e retorna para vestir o manto com uma presença de tela que mostra por que ele é o pai de todo esse gênero que vemos hoje.

Além de ser uma interpretação bem diferente do herói que carrega um tipo de cinismo que nenhum de seus sucessores mostrou até então, ele dosa isso muito bem com o peso dramático que o personagem exige. O resultado é um Batman que espelha bem os dilemas de Barry Allen, mas sem soar melancólico, dando um “novo” ar para esse personagem que conhecemos tão bem. Um novo de três décadas atrás.

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Só que, ao contrário do que muita gente temia, Keaton não rouba o filme para si. Mesmo sendo uma das melhores coisas do longa, ele ainda está ali para servir o Flash e cumpre bem esse papel com bons diálogos, além de belíssimas cenas de ação e uma boa dose de nostalgia.

Perdendo a mão

Só que, como dito, The Flash não consegue esconder seu desenvolvimento sinuoso e isso fica evidente em dois pontos principais. O primeiro deles é o próprio roteiro, por mais contraditório que isso pareça.

Ainda que o longa consiga amarrar muita coisa de forma impressionante para criar uma história que desenvolve bem seu protagonista, há coisas ali que não são tão bem desenvolvidas assim. E o Barry-2 é o maior exemplo disso.

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A ideia de fazer dele uma versão ainda imatura do herói é algo que faz sentido, mas a forma como isso é escrito não funciona tão bem assim. O personagem é insuportável e puxa o longa para baixo em muitos momentos com uma tentativa de criar um humor quase pastelão ao trazer uma caricatura bastante questionável do que é ser um adolescente.

É quase como se os roteiristas nunca tivessem visto um jovem na vida e tentassem replicar comportamentos apenas com base nos filmes do Seth Rogen. O resultado é essa tentativa mal escrita de alívio cômico que se torna um peso que traz piadas bastante fracas e em momentos inoportunos e com uma atuação infantilóide bastante exagerada por parte de Miller.

E é bizarro quando ele é o único trazendo esse tom, já que todo o restante do elenco está bem mais sóbrio, inclusive nas cenas mais engraçadinhas. É algo completamente fora do tom e que remete aos piores momentos do personagem em Liga da Justiça, por exemplo.

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Outro problema que pesa muito em The Flash são os efeitos visuais. E não se trata apenas de uma reclamação padrão dos filmes de heróis: a coisa é ruim até mesmo para os baixos padrões que a Marvel vem apresentando ultimamente. A sequência inicial, com Flash salvando bebês em queda, é terrível em um nível PlayStation 2 e há várias cenas de corrida que tudo parece artificial e sem peso algum.

E é algo que atrapalha de verdade a experiência, pois tira o impacto de momentos chaves. Há participações especiais que são feitas inteiramente (e sem propósito em certos casos) em CGI que ficam parecendo bonecos de cera com os quais é impossível criar qualquer conexão. O que deveria ser a apoteose nerd se torna só algo vergonhoso.

Vislumbrando um potencial

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Ainda que esses tropeços incomodem bastante — eu não teria problema algum em apagar o Barry-2 da existência do multiverso —, The Flash é um filme surpreendentemente bom. Levando em conta o caos que foi sua produção, com todas as trocas de diretores e mudanças de roteiro, é incrível ver como ele chega aos cinemas com muito mais acertos do que até os fãs mais otimistas poderiam esperar.

E esse não é um comentário feito na maldade. Historicamente, longas com bastidores tão turbulentos assim costumam refletir na tela esses problemas e, com o Velocista Escarlate, ele consegue sair relativamente ileso de todos esses problemas. Com uma história consistente que sabe trabalhar seu herói e desenvolvê-lo de forma até bastante emotiva, é uma obra à altura do personagem e do momento no qual está inserido.

The Flash está longe de ser aquela produção revolucionária e nem se propõe a ser algo assim. Ele acerta naquilo que é importante ao mesmo tempo em que escancara as marcas deixadas por todos os contratempos pelo qual passou. É um bom filme que mostra o potencial existente nesse personagem e que o agora finado DCEU nunca soube aproveitar muito bem — da mesma forma que traz vícios que nos lembram por que esse universo merece mesmo ser apagado.