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Mulheres têm relação de longa data com a tecnologia, e a visibilidade só cresce

Por| 08 de Março de 2018 às 10h28

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Ada Lovelace, Grace Hopper, Hipácia de Alexandria, Mary Kenneth Keller, Marie Curie, Carol Shaw, Susan Kare, Hedy Lamarr, Rosalind Franklin, Margaret Hamilton e Emmy Noether são apenas alguns dos nomes femininos mais notáveis na história da ciência e da tecnologia. Muitas delas "penaram" para conseguir o devido reconhecimento, enquanto algumas chegaram até mesmo a ter seus méritos "roubados" por colegas do gênero masculino. No entanto, tantas outras ficaram marcadas na história por suas pesquisas e trabalhos inovadores, especialmente ao se considerar que a presença feminina tradicionalmente é escassa nessas áreas de atuação. Quer dizer, era escassa, pois este cenário de desigualdade está mudando, e elas estão conseguindo cada vez mais visibilidade.

Há estudos que indicam que mulheres podem ser melhores programadoras do que homens, e talvez justamente por representarem uma ameaça ao "clube do bolinha" que, recentemente, um engenheiro da Google polemizou ao defender a redução de mulheres no Vale do Silício. Mas vale sempre lembrar que o universo da programação começou a existir graças ao pioneirismo feminino.

As "computadoras"

Não, você não leu errado: a indústria da informática pode ter sido dominada pelos homens nas décadas mais recentes, mas, na época da Segunda Guerra Mundial, as mulheres que ficaram conhecidas como "computadoras" eram as responsáveis por realizar cálculos extremamente complexos para atividades militares, sendo que cada um desses cálculos levava mais de 30 horas para ser concluído.

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Anos depois, em 1945, uma dessas mulheres, chamada Jean Jennings Bartik, começou a trabalhar com o ENIAC (o primeiro computador eletrônico de larga escala) para realizar tais cálculos mais rapidamente do que pelos métodos antigos. Sim, o ENIAC foi construído por homens, é verdade, mas foram as "computadoras" que desenvolveram os primeiros programas para o supercomputador, uma vez que essa tarefa era considerada tediosa e deixada de lado para que mulheres a executassem.

Naquela época, o hardware era mais valorizado por ser desenvolvido por homens. Mas a criação de softwares e a parte matemática da coisa (atividade que pagava pouco, por sinal) ficaram para elas, que não eram reconhecidas pelo trabalho realizado. Só que foi nessa mesma época que as "ENIAC Girls" conheceram Grace Hopper, a criadora do COBOL.

Hopper desenvolveu a linguagem de programação capaz de fornecer instruções às máquinas usando palavras em inglês, e sua criação foi tão importante que a linguagem é usada até os dias atuais. Nessa época, até 50% das pessoas que trabalhavam com programação eram mulheres, mas, à medida em que a atividade começou a ganhar prestígio, o interesse masculino foi atraído. Então, eles começaram a dominar a indústria, desencorajando a contratação de mulheres nesta área.

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Na década de 1980, que marcou a chegada da era da computação pessoal, o estereótipo do programador "nerd" dominou o setor, mas foi justamente naqueles anos em que Susan Kare conseguiu se destacar, revolucionando o design gráfico com seu trabalho pioneiro nos primeiros anos da Apple. Contudo, ela foi uma exceção no meio, ao lado de Carol Shaw – a primeira mulher a trabalhar na indústria de games, tendo programado o famoso River Raid para Atari 2600 em 1983.

Elas também ajudaram a construir a internet como a conhecemos

No livroBroad Band: The Untold Story of the Women Who Made the Internet ("A história das mulheres que fizeram a internet", em tradução livre), a jornalista Claire L. Evans fala, sim, sobre os nomes notáveis de Grace Hopper e Ada Lovelace, mas seu foco está justamente em nomes não tão conhecidos assim. Um exemplo é Pam Hardt-English, que participou do projeto Resource One na Bay Area dos anos 1970, desenvolvendo sistemas de comunicação usando as mais recentes tecnologias da época.

Outro nome citado no livro é o de Wendy Hall, cientista da computação que, na década de 1980, participou da criação do hypertext – texto exibido em um computador ou dispositivo eletrônico com referências (os chamados hyperlinks) a outros textos, para que o leitor imediatamente acessasse aquele conteúdo. Isso pode parecer simples e até banal nos dias de hoje, mas, antes da World Wide Web, pode apostar que não era algo tão básico assim.

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Já na década seguinte, outro nome de relevância é o de Jaime Levy, criadora de mídias digitais que levou o álbum Cyberpunk, de Billy Idol, aos disquetes físicos que, hoje, já são obsoletos. Em 1990, por exemplo, Levy criou uma revista digital distribuída por meio de disquetes que, na época, acomodavam somente 800 KB cada. Seu trabalho é considerado importante na popularização dessas mídias físicas, já que a população norte-americana estava ávida para consumir conteúdos culturais de maneira digital.

Portanto, se você clica adoidado em links relacionados na internet e consome conteúdo de entretenimento online, agradeça a essas mulheres por terem encabeçado essas novidades em suas épocas. Mas a autora faz questão de dizer que seu livro "se baseia em mulheres que contribuíram para aplicações orientadas com o uso da tecnologia, não querendo implicar que isso é necessariamente algo em que as mulheres são naturalmente boas".

Sendo assim, a ideia é enaltecer a participação delas na criação e evolução de tecnologias essenciais para o desenvolvimento da nossa sociedade digital atual e, quem sabe, inspirar novas garotas a seguirem o mesmo caminho. "Penso que se pudermos reposicionar a computação como algo em que as mulheres participaram ativamente, desestabilizamos esse senso de direito em esferas de tecnologia dominadas pelos homens", declarou em entrevista ao Verge.

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O espaço delas ao sol da atualidade

E foi justamente com a evolução da internet, em especial com a explosão das redes sociais, que o castelo desse tal "clube do bolinha" tecnológico começou a ruir. Com a possibilidade de publicar ideias à vontade em tantas plataformas por aí, as mulheres começaram a difundir ideais que dizem respeito à igualdade entre os gêneros, inclusive no mercado de trabalho, derrubando tabus quanto às capacidades femininas em áreas técnicas, bem como deixando claro que não é aceitável que um determinado setor seja dominado por homens por puro e simples preconceito de gênero.

E para mostrar que o mercado tecnológico não vê mais com bons olhos essa segregação, há exemplos atuais de empresas que veem na diversidade a chance de compensá-las pelo passado de exclusão. Sim, ainda há muito o que conquistar, como, por exemplo, a equiparação salarial; mas, segundo apresentação do W20 (fórum de gênero do G20 que aconteceu na Argentina em 2017), a desigualdade salarial entre homens e mulheres no ramo tecnológico pode cair 25% nos próximos 10 anos.

Camila Achutti, CTO do MasterTech e criadora do site Mulheres na Computação, é uma das líderes do movimento por igualdade de gêneros no mercado de TI do Brasil. "Nós vemos um monte de mulher empreendendo por necessidade e não por oportunidade", diz Camila, que entende que "ser empreendedora em tecnologia é não se reconhecer no entorno" pelo fato de o mercado ainda ser predominantemente masculino.

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Ainda segundo a executiva, cerca de 54% dos empreendedores são mulheres, "mas é tudo negócio offline, com pouca margem de lucro, é a 'lojinha', e a gente tira dessas mulheres a possibilidade de se envolverem com tecnologia, pois a gente não mostra para elas outra possibilidade". Na tentativa de ajudar a reverter esse cenário, uma empresa decidiu equilibrar seu quadro de funcionários: a startup Real Trends tem proporção igualitária de colaboradores, 50% para cada um desses dois gêneros, com um grande número de mulheres ocupando cargos de liderança.

Já a 99, empresa de mobilidade urbana que oferece o aplicativo homônimo, quer que o cenário revelado pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) – em que apenas 20% dos cargos do mercado de TI são ocupados por mulheres –, seja transformado. Uma desenvolvedora de backend da empresa, Walkirya Heto, contou que dos 45 alunos de sua turma de Ciências da Computação somente cinco eram mulheres e apenas duas concluíram o curso, sendo que um professor chegou a dizer que ela deveria desistir da graduação.

E sua história de resiliência não é única: a mexicana Geraldine Haneine, de apenas 28 anos, hoje é gerente de produtos da 99, mas precisou se mudar de seu país natal para a Inglaterra para conseguir seguir a carreira desejada. "Conhecimento e competência devem pesar mais do que gênero e idade”, destaca a designer.

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Mas, enquanto muitas mulheres batem na tecla da igualdade, para Leila von Dreifus, head da área de Resultados e Execução da companhia, a coisa não é bem assim. Calma, que ela explica: "Demorei muito tempo para entender que homens e mulheres não são iguais. Queria provar a qualquer custo que era igual a um homem, quando não sou. Todos nós somos diferentes uns dos outros, e ter essa consciência ajuda a melhorar a performance profissional e reduzir a distância entre os gêneros no mercado de trabalho".

O pensamento da executiva está de acordo com as "Metas do Milênio" da ONU, que entendem ser necessário buscar a equidade social, valorizando o respeito às diferenças e promovendo a garantia de direitos iguais a partir das especificidades de cada um. Isso significa que é preciso respeitar as diferenças entre homens e mulheres, como, por exemplo, no caso da gestação: a mulher precisa ter o direito à maternidade e à amamentação sem ser desvalorizada no ambiente de trabalho, permanecendo no mercado de maneira justa.

Outra empresa tecnológica que detém um app de mobilidade urbana e está inserida no conceito da igualdade de gêneros é a Easy, que acaba de lançar a campanha #ElasQueGuiam, a favor do empoderamento feminino nessa área de atuação. Para derrubar, de vez, o mito do "mulher ao volante, perigo constante", a empresa quer levantar o debate e valorizar as mulheres taxistas. Quatro documentários em vídeo foram produzidos sobre as motoristas do aplicativo que fogem do estereótipo imposto a elas. Mais de 42 taxistas foram ouvidas, incluindo uma mulher homossexual e uma jogadora de bocha – justamente mulheres que fogem aos padrões que a sociedade tenta impor.

Grupos de apoio

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Ainda há grupos que incentivam mulheres a trabalharem com tecnologia. O PyLadies quer que mulheres compartilhem conhecimentos entre si sobre a linguagem de programação Pyton, enquanto o CloudGirls pretende dar autonomia às mulheres do setor em outros segmentos relacionados.

Outros nomes, como Rails Girls, Woman Who Code, Code Girl, MariaLab e Meninas Digitais também surgiram com o ideal de acabar com a falta de diversidade neste universo e, graças a eles, muitas profissionais já conseguiram iniciar uma carreira na área.

E justamente graças à mudança de mindset de empresas e iniciativas como as que citamos nesta matéria é que o "clube do bolinha" da tecnologia está com os dias contados. Mas isso não significa que os homens devam se sentir ameaçados: a ideia, aqui, é que um mercado inclusivo e igualitário deve crescer a passos largos, dando oportunidades para todas as pessoas, e não somente a uma classe privilegiada.