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Mulheres Históricas: Hipácia de Alexandria, a primeira cientista de todas

Por| 14 de Julho de 2016 às 23h50

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Elbert Hubbard
Elbert Hubbard

Apesar de não terem o devido reconhecimento, as mulheres contribuíram para com a ciência desde seus primórdios. Trabalhos e teorias elaborados por mulheres vêm sendo trazidos à luz graças a historiadores interessados em estudar a questão de gênero dentro do âmbito científico, e acabamos descobrindo que o envolvimento feminino no campo da medicina, por exemplo, foi registrado em diversas civilizações antigas.

Sim, é sabido que mulheres como Merit Ptah e Peseshet praticaram medicina no antigo Egito, sendo delas o registro mais antigo de mulheres na história das ciências médicas. Já na Grécia antiga existiram nomes como Aglaonice, que previa eclipses lunares, e Teano, que estudou matemática e física com Pitágoras. No entanto, os créditos para a primeira mulher cientista de todas ficaram para Hipácia (ou Hipátia) de Alexandria, filha de Theon, diretor da célebre Biblioteca de Alexandria – que foi a maior central de conhecimento da Antiguidade, sendo completamente destruída junto com milhares de obras por conta de um incêndio de proporções míticas.

Hipácia viveu entre os anos de 355 e 415 d.C e foi uma neoplantonista grega e filósofa do Egito Romano, tornando-se chefe da escola platônica em Alexandria onde lecionou filosofia e astronomia, além de ter escrito diversos textos sobre geometria e álgebra. A ela são creditadas as invenções de um hidrômetro aprimorado, do astrolábio (um instrumento naval que era usado para medir a altura dos astros acima do horizonte) e de um instrumento para destilar água.

A vida acadêmica da cientista

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Criada em um ambiente de estudos, Hipácia tinha uma ligação bastante forte com seu pai, de quem herdou a paixão pela busca de respostas para o desconhecido. Bastante regrada, a futura cientista mantinha uma disciplina rigorosa em todos os âmbitos de sua vida, incluindo a aparência física, já que naquela época buscava-se atingir o ideal helênico de manter uma mente sã em um corpo sadio.

Quando estudou na Academia de Alexandria, Hipácia devorou conhecimentos em matemática, astronomia, filosofia, religião, poesia e artes. Acredita-se que, quando adolescente, ela teria completado sua educação em Atenas na Academia Neoplatônica e, ao retornar a Alexandria, seu destaque durante os estudos acadêmicos fez com que Hipácia fosse recebida com uma proposta de emprego para ser professora na Academia de Alexandria, onde tornou-se diretora aos 30 anos de idade. Lá, um de seus alunos e amigos foi o filósofo Sinésio de Cirene, com quem Hipácia trocou diversas cartas que revelaram invenções da professora usadas em experimentos de física e na astronomia.

A cientista ficou famosa nesse período por ser uma notável solucionadora de problemas matemáticos, tendo ajudado colegas da área a resolver os mais diversos desafios sempre que era solicitada. Hipácia era tão obcecada com seu campo de estudo e atuação, que respondia ser “casada com a verdade” quando era questionada a respeito de nunca ter se casado com um homem.

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Obras perdidas na história

Hipácia foi autora de diversas obras literárias que fizeram parte do gigantesco acervo da Biblioteca de Alexandria, que foi a mais célebre biblioteca da história da humanidade. Localizada na região portuária da cidade, foi construída no período helenístico com o objetivo de refletir os valores de sua época e acumular todo o conhecimento possível e imaginável. Sua construção foi patrocinada por Ptolomeu, que também apoiou a criação de diversas escolas de pensamento com sede no mesmo local, além de museus e exposições que atraíam um grande número de intelectuais de todo o mundo para Alexandria.

No entanto, um enorme incêndio cuja origem permanece um mistério até os dias atuais destruiu praticamente todo seu acervo, incluindo milhares de papiros, livros, pinturas e peças arqueológicas. Acredita-se que mais de 500 mil rolos de manuscritos tenham sido completamente destruídos nas chamas – e seus conteúdos perdidos para sempre.

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Sendo assim, a obra de Hipácia permanece em aberto até hoje, e não sabemos exatamente quantos textos a cientista produziu, tampouco temos acesso a esse conteúdo. Contudo, graças a citações de suas obras no material de outros autores, o nome e a importância de Hipácia na história das ciências exatas não foi perdido com o desastre. Pelo menos quatro de seus escritos constam nos registros, incluindo um comentário sobre o volume 13 de Arithmetica, de Diophantus; um comentário sobre Cônicos, de Apolônio de Pérgamo; uma edição da obra Almagesto, de Ptolomeu; uma edição de um comentário de seu pai sobre a obra Os Elementos, de Euclides; e um texto de autoria própria chamado “O Cânone Astronômico”.

Fundamentalismo religioso, perseguição e morte

O Cristianismo passou por um intenso processo de transformação durante o reinado de Teodósio I (379-392) que, para tornar a religião cristã como a oficial do Estado, autorizou a destruição de templos e santuários considerados pagãos e hereges. Em 412, quando Cirilo foi nomeado Patriarca de Alexandria, o cristão fervoroso defendia a ortodoxia da Igreja e combatia impiedosamente o que considerava herético – e uma mulher solteira dedicada às ciências não seria aceita nesse contexto. E não seria nenhuma surpresa que a Igreja a perseguisse, já que uma de suas frases mais célebres dizia que “todas as religiões dogmáticas formais são falaciosas e nunca devem ser aceitas, em definitivo, por pessoas com autoestima.”

Hipácia foi atacada por uma multidão de cristãos enfurecidos nas ruas de Alexandria em março de 415. Arrastada violentamente pelas ruas da cidade, a cientista foi levada a uma igreja onde foi cruelmente torturada e assassinada a sangue frio, tendo seu corpo jogado em uma fogueira para ser carbonizado. Outras personalidades foram atacadas de maneira similar na mesma época e historiadores acreditam que o homicídio de Hipácia teria resultado em um conflito entre duas facções cristãs; uma mais moderada e contra perseguições violentas, e outra mais rígida sob o comando de Cirilo.

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A morte da cientista é tida por estudiosos como o marco do fim da Antiguidade Clássica, tendo marcado também o início da queda da vida intelectual em Alexandria, mesmo que a filosofia helenística tenha continuado firme e forte até o século VI. Hipácia foi uma mulher que colocou a ciência, a tolerância e a filosofia como ideais de vida, sendo considerada a primeira cientista do gênero feminino e, mesmo que tenham tentado apagar sua existência dos registros da história, sua memória está mais viva do que nunca, servindo como exemplo de resistência a crendices religiosas e sendo uma representação do pensamento racional.

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