Eleições 2018 | As propostas de Jair Bolsonaro para tech, ciência e inovação
Por Wagner Wakka | •

O candidato do PSL, Jair Bolsonaro, é conhecido por sustentar uma base de governo com um tripé formado por segurança armamentista, educação “sem doutrinação” e economia. Contudo, o que pensa e propõe o candidato sobre assuntos como ciência, tecnologia, inovação e comunicações?
Embora não faça parte da base do que Bolsonaro tem como meta em seu plano de governo, seu programa conta com uma pequena seção reservada exclusivamente para inovação, ciência e tecnologia. No conjunto de 81 slides que soma o plano de governo do candidato, há apenas dois dedicados a estes temas.
O plano aponta uma estratégia de liberalismo econômico para reservar investimentos à pesquisa e à ciência. Na página 48, por exemplo, aponta indiretamente o interesse em usar capital privado para investimentos no setor. “Não há mais espaço para basear esta importante área da economia moderna em uma estratégia centralizada, comandada de Brasília e dependente exclusivamente de recursos públicos”, escreve no documento.
Os modelos atuais de pesquisa e desenvolvimento são apontados por Bolsonaro como “esgotados”. Isso quer dizer que, para ele, é preciso que quaisquer pesquisas sejam voltadas para a criação de um produto ou riqueza direta. Em termos claros, uma ideia que possa ser vendida.
Para isso, ele sugere que sejam criados “hubs tecnológicos”. Estes são centros em que pesquisadores e desenvolvedores podem apresentar seus projetos para possíveis patrocinadores, como empresas e investidores-anjo, a fim de rentabilizá-los.
Em suma, a proposta do candidato é de diminuir investimentos públicos para universidades e centros de pesquisa. Bolsonaro inclusive votou a favor a Emenda Constitucional 95, conhecida como “teto dos gastos”, a qual obriga o congelamento dos gastos públicos pelos próximos 20 anos.
Um dos setores afetados é o da educação. Em junho deste ano, um dos principais órgãos de fomento à pesquisa no Brasil, a CAPES, informou que já não teria verba para bancar bolsas de pós-graduação em 2019. Em carta aberta ao governo, o presidente da CAPES, Abilio Baeta Neves, disse que teria de interromper projetos de pesquisa de mestrandos e doutorandos, em um corte estimado na casa de R$ 580 milhões. A solução para este rombo, para Bolsonaro, seria o financiamento “sempre próximo das empresas", como citado no slide 49 de seu plano de governo.
A Sociedade Brasileira de Pesquisa e Ciência (SPBC) está organizando uma série de sabatinas com os candidatos, nas quais pretende discutir o tema do financiamento de pesquisa. Uma das propostas é que candidatos se comprometam a assinar uma carta ao afirmar que vão recuperar investimentos em educação, bem como derrubar a Emenda Constitucional 95. O órgão entrou em contato com os principais candidatos melhores posicionados na pesquisa. Segundo o presidente do SPBC, Ildeu de Castro Moreira, somente a equipe de Bolsonaro não respondeu ao pedido ainda.
Grafeno e nióbio
Outra forma de financiamento para o setor de pesquisa e inovação seria o retorno de investimento em pesquisas com o grafeno e nióbio. Embora seja uma constante do discurso do candidato em entrevistas, ambos termos aparecem apenas em um slide do plano de Bolsonaro.
O grafeno é uma das formas com que o carbono pode se organizar, tal como o grafite e o diamante. Atualmente, a Universidade Presbiteriana Mackenzie estuda como usar o material em produtos tecnológicos, tanto quanto a produção de chips e outras peças eletrônicas com mais resistência e menores. O grafeno ainda não é utilizado na indústria, mas apontado por pesquisadores como um potencial para produção eletrônica. A proposta de Bolsonaro seria incentivar pesquisas no setor visando o futuro.
Para isso, o candidato usaria investimentos da exploração do nióbio. O metal atualmente é usado para produção de algumas ligas do aço, sendo que o Brasil é o principal produtor e exportador do material. Em sabatina na Globo News, Bolsonaro aponta que pretende aumentar o preço do produto para garantir mais investimentos para setores tecnológicos. Atualmente, o quilo do nióbio é comercializado na casa dos R$ 170.
O aumento do preço, contudo, pode não resultar necessariamente em mais receita. Isso porque outros metais como o titânio e o vanádio têm funções semelhantes. Assim, caso haja uma alta do nióbio, o mercado pode optar por estes dois produtos análogos. A produção nacional é de 90 mil toneladas por ano, entretanto, Bolsonaro não aponta uma meta de crescimento do setor em seu plano de governo.
Depreciação acelerada e abertura econômica
Da mesma vertente liberal que segue para a área acadêmica, o plano parte para a inovação. O tema é citado em três dos slides do candidato, nos quais ele basicamente apresenta duas propostas. A primeira é o incentivo ao empreendedorismo como fonte de inovação, também com a iniciativa privada bancando os projetos.
Para estimular este mercado, o plano cita políticas que façam os projetos de inovação e tecnologia mais baratos a possíveis investidores. Uma dessas políticas seria a da depreciação acelerada. Se implantada, incute a diminuição de tributos já nos primeiros anos de uso de um ativo (como maquinários e equipamentos para pesquisa, por exemplo). A ideia é que, como a tais tecnologias são trocadas muito rápido, se a dedução do imposto acontecer somente depois de muito tempo, o custo de tal maquinário ou equipamento cai só quando nem é mais usado, desestimulando investimentos no setor. Ou seja, a ideia é fazer com que o investidor pague menos pela compra de tais ativos.
A consequência, contudo, é menos recolhimento de impostos e taxas para o setor, embora incentive financiamentos privados.
Outra proposta, citada no slide 66 do plano do candidato, é abertura comercial para investimentos internacionais e a diminuição de tributos para compra de “equipamentos necessários à migração para a indústria 4.0”. Junto disso, o candidato propõe investimentos em requalificação da mão de obra para utilização de equipamentos de ponta.
Embora não informe no plano o que entende sobre “indústria 4.0”, Bolsonaro cita o termo em algumas entrevistas. Uma delas é durante a sabatina no evento Diálogos da Indústria, com os Candidatos à Presidência da República, organizado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) em julho. Na ocasião, ele citou projetos de machine learning, computação em nuvem, outros setores das ciências da computação e bioengenharia como principais setores que devem ser estimuladas no país.
Desta forma, pode-se esperar que o Bolsonaro diminuirá impostos sobre importação de equipamentos eletrônicos e de alta tecnologia, o que pode gerar um desestímulo ao desenvolvimento nacional.
Manutenção de ministérios
Outro principal gargalo para investimentos em ciência no Brasil foi a junção entre os ministérios da Ciência, Tecnologia e Inovação com o da Comunicação. A união aconteceu em 2016 e, desde então, entidades como a CAPES passaram a competir por atenção com telecom. Isso faz com que temas como o corte de investimento em pesquisas perdesse força dentro do ministério, agora unificado, porque o setor de telecomunicações, com muito mais investimento privado, exerce um lobby maior que o da educação superior. Entidades como a SBPC e outros setores da área acadêmica pedem pela separação novamente.
Embora Bolsonaro não fale diretamente sobre o tema, o discurso do candidato vai na direção de que é preciso diminuir o número de ministérios, indicando que não pretende priorizar as demandas das universidades.
Privatização e desburocratização
A questão energética é citada de forma muito sucinta no plano de governo do candidato. Bolsonaro aponta no documento que investimentos públicos devem ser direcionados apenas à especialização de setores como o de desenvolvimento de pesquisas em energia eólica e de fontes renováveis no Nordeste.
Para outros setores, ele deve buscar parcerias privadas e até negociações de vendas de estatais. O candidato considera que houve sucateamento da Eletrobrás e subsidiárias, propondo uma tríade de privatização, desburocratização e simplificação do setor. Para cumprir estes últimos dois objetivos, Bolsonaro propõe facilitar com que empresas consigam permissões ambientais para implantação de projetos energéticos. O exemplo citado no plano de governo é o de diminuir o prazo de licenciamento ambiental para pequenas centrais hidrelétricas de 10 anos para o máximo de três meses.
Delegação de funções
O discurso de Bolsonaro em relação a temas mais técnicos como inovação, telecomunicações e ciência é de que ele vai buscar especialistas para auxiliá-lo em tais assuntos.
Da sua lista de ministeriáveis (ao todo, serão 15 pelo seu plano), já são conhecidos o economista Paulo Guedes; o general Augusto Heleno (para Defesa); e Marcos Pontes, o astronauta brasileiro (para Ciência e Tecnologia).
Pontes é conhecido por ser engajado com o setor público, mas esta seria a primeira vez que o tenente-coronel da FAB e astronauta abraçaria a vida pública oficialmente. Em 2014, Pontes se candidatou como deputado federal pelo PSB, tendo recebido 0,21% dos votos em São Paulo.
Longe de ser um socialista convicto (apesar da filiação ao PSB), na época, Pontes tinha a proposta de fazer o Brasil voltar a olhar para a pesquisa espacial. Atualmente, Pontes é um dos incentivadores do turismo espacial em parceria com a Virgin. Contudo, sempre se mostrou interessado em buscar investimentos para desenvolvimento de satélites. Em coletiva no mês passado em São Paulo, Pontes reforçou esse desejo pela pesquisa e aproximação educacional, mas não citou propostas políticas nem um convite oficial de Bolsonaro.
O Canaltech entrou em contato com a assessoria do candidato, abrindo o espaço para uma entrevista sobre o tema. A comunicação do partido optou por declinar o convite e encaminhou nossa reportagem para o plano de governo do PSL.
Esta matéria faz parte do especial Eleições 2018 do Canaltech. Fique ligado: a cada dia publicaremos as propostas de um candidato à presidência para Tecnologia, Inovação, Ciência e Telecomunicações!
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Fonte: PSL