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Oscar 2021 | As surpresas e as decepções da cerimônia

Por| Editado por Jones Oliveira | 26 de Abril de 2021 às 17h06

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Divulgação/Disney, Netflix, Amazon Studios, Vitrine Filmes
Divulgação/Disney, Netflix, Amazon Studios, Vitrine Filmes

O fim de uma temporada de premiações chegou. A cerimônia do Oscar termina um ano diferente — para dizer o mínimo. Isso foi refletido, inclusive, nos indicados, com uma lista de filmes que somava orçamentos bem diferentes de anos anteriores. Isso é positivo, visto que a criatividade pode encontrar caminhos para burlar a falta de verba e, nesse sentido, a arte sempre encontra um meio.

Para muitos, foi a pior lista de indicados de todos os tempos. A verdade, porém, é que esse mesmo comentário é repetido todos os anos, seguidamente. Pensando nisso, ou estamos ladeira abaixo há muito tempo no que diz respeito à qualidade dos filmes ou existe uma raiva pulsante sobre a premiação.

Talvez essa raiva possa ser contida se for internalizada a certeza de que, além de um prêmio artístico não ser uma verdade absoluta, o Oscar (e não somente) tem o adendo de ser um troféu político, regado por lobby. Então, tudo bem se nosso filme preferido não venceu; tudo bem se gostávamos tanto daquele curta-metragem que foi esnobado; se aquela trilha sonora original que bateu tão fundo na alma da gente não ganhou. Não somos menos sensíveis ou qualquer coisa do tipo por isso. Com politicagem ou não, um prêmio de cinema é algo humano e não exato. Essa segurança é necessária para que tudo fique mais leve.

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Além disso, o Oscar 2021 foi, de longe, o mais representativo de todos os tempos. Soma-se o fato de que podemos dizer muito sobre esse momento (do Oscar), mas é, sem dúvidas, a época do ano em que o cinema mais entra nas rodas de conversa. É claro que ainda é uma celebração essencialmente de filmes dos Estados Unidos, mas manter a arte e o entretenimento em debate, especialmente em períodos tão complicados, é essencial para que possamos permanecer com a mente sã.

A cerimônia

Steven Soderbergh, um dos produtores do evento, havia prometido uma cerimônia cinematográfica, com cara de filme mesmo. De acordo com ele, seria "mais cinema e menos TV". Isso aconteceu visivelmente nos primeiros segundos, com os créditos iniciais emulando, justamente, a abertura de um filme. Depois, o que se sucedeu foi algo como alguns dos filmes de Soderbergh: previsibilidade interrompida por pequenas surpresas, alguns bons diálogos — no caso, discursos —, um ou outro alívio cômico (como Daniel Kaluuya expondo que não veio de uma cegonha), um clima menos glamouroso (só de fachada) e um final anticlimático que, lá no fundo, também era previsível.

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Substituindo o enorme Dolby Theatre por um salão em uma estação de trem histórica de Los Angeles (a Union Station), tudo poderia parecer mais íntimo se não fosse o necessário distanciamento social. Regina King, uma das apresentadoras e diretora do indicado em três categorias Uma Noite em Miami..., disse sobre a questão de estarem protegidos da pandemia, estando a maioria vacinada por lá. O DJ, que substituía a orquestra, não interrompia os discursos de agradecimento — algo pensado por Soderbergh — e, mesmo assim, o tempo de duração foi mais enxuto do que em cerimônias passadas.

Por outro lado, apesar dessa possibilidade mais intimista e da celeridade quase casual (nem tanto), tudo parecia mais distanciado, como se evoluísse industrialmente. É interessante como, ao pensar em evoluir como um filme, a produção não tenha entendido que um evento como tal não é um filme no final das contas. Iniciar com algo de peso, pode funcionar no cinema, segurando o espectador naquela experiência. Mas começar uma cerimônia de premiação com categorias pesadas como as de roteiro foi como adiantar possíveis clímax sem ter como recuperar isso depois.

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As estatuetas

Sem surpresas muito significativas, Nomadland garantiu os Oscars de Melhor Filme e Melhor Direção. Chloé Zhao, provavelmente, foi quem fez o discurso mais abrangente da noite, evocando o que há de bom em todos nós. Mas nada perfurante quanto, por exemplo, Joaquin Phoenix ao vencer no ano passado por sua atuação em Coringa.

Aliás, Thomas Vinterberg, que venceu com Druk – Mais uma Rodada, na categoria de Melhor Filme Internacional, proporcionou o momento mais genuíno e humano da noite, lembrando de sua filha e da relação do significado que o filme passou a ter a partir da morte dela em um acidente de carro (quando alguém estava dirigindo e utilizando o celular), com direito à lembrança do poder que tem a atuação de Mads Mikkelsen no filme.

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Entre todas as previsibilidades, talvez a estatueta de Melhor Fotografia para Mank tenha sido uma das maiores quebras de expectativa da noite. Mesmo assim, não é difícil perceber que a Academia parece reservar esse prêmio para filmes em preto e branco. É verdade, porém, que o trabalho no filme de David Fincher é merecedor (tanto quanto o de Nomadland). Não se trata de um p&b que visa a estética pela estética, mas de um mergulho na alma de sua época e, claro, do clássico Cidadão Kane.

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Outra categoria que pode ter surpreendido tantos e embaralhado bolões foi a de Melhor Montagem. Com Meu Pai e Os 7 de Chicago concorrendo, quem acabou levando essa foi O Som do Silêncio. Tecnicamente merecido, sem dúvida, mas acontece que a edição inteira do filme dirigido por Florian Zeller (Meu Pai) é o que, de fato, constrói a experiência de assisti-lo. A organicidade da montagem imerge o espectador na mente do protagonista interpretado por Anthony Hopkins (voltaremos a ele).

Talvez — não mais que talvez —, os votantes tenham colocado essa conta no roteiro adaptado, visto que, nessa categoria, Meu Pai bateu o favorito Nomadland e Uma Noite em Miami... — este que é regido por diálogos excepcionais. De todo modo, o roteiro de Florian Zeller e do já oscarizado Christopher Hampton também fala alto e venceu merecidamente.

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O final

O pior, no mais, ficou para o final. Parece não haver dúvidas de que a produção e a direção do evento (ô, Soderbergh) planejou algo diferente, com uma homenagem a Chadwick Boseman pela vitória na categoria de Melhor Ator. O favoritismo de Boseman era certo para muitos. Acontece que A Voz Suprema do Blues estreou comercialmente nos EUA em dezembro de 2020, pela Netflix. Meu Pai havia passado por muitos festivais, mas sem fazer tanto barulho e só estreou para o público em geral no último 26 de fevereiro, pouco antes da data limite desse ano para a inscrição no Oscar (28).

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O filme chegou forte na reta final — muito forte — e, para quem o assistiu, por mais que Boseman tenha desempenhado o papel de sua vida, pode ser bem difícil discordar de que premiar Anthony Hopkins era uma obrigação. O ator de 83 anos de idade está em uma atuação que, se não for a maior, é uma das maiores e, sem dúvida, a mais frágil — no melhor sentido — de toda a sua carreira. Constatar isso a partir de um gigante para a história do cinema (como Hopkins) é algo descomunal, mais do que expressivo.

A questão é que os responsáveis provavelmente não esperavam pelo senhorzinho sincero que evita aparecer em premiações (inclusive em vídeo) e tem dificuldades sociais devido a estar no espectro autista. E ele chegou... chegou com força, com a potência de uma das melhores atuações dos últimos muitos anos. E essa sua força destruiu os planos de um encerramento cheio de emoção e substituiu por um último prêmio sem discurso, com o próprio apresentador simbolicamente recebendo a estatueta.

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Assim, o anticlímax involuntário de Soderbergh e companhia fechou a noite. Felizmente, com chave de ouro.