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Anúncios falsos no YouTube usam imagem de famosos para aplicar golpes

Por| Editado por Douglas Ciriaco | 19 de Junho de 2024 às 05h00

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Nik/Unsplash
Nik/Unsplash
Tudo sobre YouTube

O YouTube passou a ser usado para exibir anúncios falsos que exploram a imagem de empresas e famosos para aplicar golpes. Em um caso relatado ao Canaltech, criminosos montaram um vídeo se passando pelo Mercado Livre com uma suposta narração do apresentador Marcos Mion projetada com IA. O material também trazia um link que levava para uma página clonada para “comprar” um celular com um preço bem abaixo da média.

No geral, as propagandas são exibidas antes de iniciar a reprodução de um vídeo ao acessar a plataforma sem fazer login ou sem assinatura do Premium. Mas também há casos em que as tentativas de fraudes surgem na passagem de um conteúdo para outro no Shorts.

Anúncios falsos no YouTube

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A fraude foi informada à reportagem no final de maio com base em um vídeo que trazia os elementos visuais do Mercado Livre, como a marca e o fundo amarelo, para promover uma oferta suspeita. Além disso, o material encaminhava os espectadores a um um site para responder a um formulário para ter acesso à página de venda falsa de um celular.

O anúncio, que foi exibido ao iniciar a reprodução de um vídeo do YouTube, trazia outros elementos para dar mais confiança. Além da voz do apresentador manipulada por IA, o material expôs um suposto comentário de uma pessoa alegando que tudo chegou “certinho” depois de responder as perguntas e receber o desconto.

Apesar da semelhança com a varejista, o vídeo foi submetido por outra organização, identificada por um site com o domínio terminado em “.com”. O CT tentou identificar os responsáveis pelo endereço com uma ferramenta de WHOIS, que mostram os proprietários de um domínio, mas as informações aparecem com o selo “GDPR masked”, que protege os dados de quem fez o registro.

Por outro lado, alguns detalhes sobre o domínio continuam disponíveis, como as datas de registro (9 de maio de 2024), da última atualização (21 de maio de 2024) e de expiração (9 de maio de 2025). 

O mesmo aconteceu com a página usada para aplicar o golpe. O endereço, no entanto, teve a identificação protegida por um serviço que esconde os dados de quem fez o registro do domínio para dar mais privacidade na web, sem depender da legislação europeia. Além disso, durante nossos testes, o site estava inacessível nesta quarta-feira (12).

Outros casos

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Os relatos sobre anúncios de golpes também pipocaram nas redes sociais. Pelo X (ex-Twitter), o perfil Fatos Históricos compartilhou o vídeo de uma das propagandas falsas que explora a imagem da varejista e do apresentador, também criada por inteligência artificial.

O material segue os mesmos passos da situação relatada anteriormente, e até indica que se trata de uma oferta para comemorar o aniversário de 25 anos do Mercado Livre. Para receber a oferta, é preciso realizar um procedimento similar: participar de uma “pesquisa de satisfação” e receber um cupom de desconto de R$ 600 para comprar um celular.

Ainda há campanhas falsas que exploram a imagem do cantor Thiaguinho, também com a oferta de um Moto G14 por R$ 169,90 — abaixo da média do mercado na varejista. Porém, na central de anúncios do Google, o anunciante era identificado como “Organização Homossexual Geral de Alagoinhas - OHGA”, e não Mercado Livre.

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Ao acessar o link fornecido na peça, a vítima é levada para a página de um questionário falso. Após o preenchimento, o site reproduz um vídeo que mostra o youtuber Gesiel Taveira, com uma dublagem que diz “você acabou de ganhar um Motorola novinho por apenas R$ 169”, e um suposto depoimento de uma pessoa que recebeu o aparelho.

O site falso ainda leva para uma página que clona o Mercado Livre, onde o celular é apresentado com o mesmo valor dos vídeos.  

Repeteco

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Apesar de serem casos emblemáticos, esta não é a primeira vez que o YouTube reproduz anúncios falsos que exploram grandes empresas para praticar golpes. No Reddit, uma publicação demonstrou uma fraude promovida na plataforma de streaming que utilizou o nome da Shopee para ofertar uma parafusadeira da Bosch por R$ 127,90 — valor também abaixo da média.

A campanha ainda levava os espectadores a uma página falsa, que se passava pela original e que se denuncia por um erro de digitação no cabeçalho: a marca era “Shoppe” em vez de “Shopee”. O endereço também não era oficial e estava com a identidade oculta durante uma análise de WHOIS feita pela reportagem na semana passada.

Outros golpes com a mesma natureza foram reportados em redes sociais nos últimos meses, todos transmitidos pela plataforma de anúncios do YouTube. Nem Elon Musk escapou ileso: o serviço exibiu uma propaganda no exterior com a imagem do bilionário e a proposta de um caminho para ganhar “US$ 1 mil por dia”.

Além do YouTube, o Google Discover também foi utilizado para veicular anúncios falsos que resultaram em golpes e prejuízo.

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Golpes exploram ferramentas de IA

Esse tipo de golpe explora ferramentas de inteligência artificial para criar deepfakes, técnica que já foi usada para desviar US$ 127 milhões de uma empresa em Hong Kong após uma chamada falsa. No geral, a solução cria vídeos capazes de convencer o espectador que não há edições, ainda que tenha algumas falhas.

No caso dos vídeos que utilizam a marca do Mercado Livre de maneira indevida, nota-se que nem sempre o movimento da boca está alinhado ao que é dito. Em alguns casos, o som também apresenta falhas sutis que podem passar despercebidas caso não esteja prestando a atenção nos pequenos detalhes.

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O uso da imagem de pessoas e marcas conhecidas também tem um grande impacto nesse tipo de fraude. O diretor da Equipe Global de Pesquisa e Análise da Kaspersky para a América Latina, Fabio Assolini, explica que essa tática é utilizada para aumentar a eficácia dos golpes.

“Grandes empresas e pessoas famosas geralmente têm uma imagem pública positiva, são pessoas confiáveis”, explica em entrevista ao Canaltech. “Ao associar o golpe a essas entidades, os golpistas aumentam a probabilidade de que as vítimas acreditem na legitimidade da mensagem — e com isso caiam no golpe.”

O diretor da firma de cibersegurança ainda observa que “o acesso às ferramentas de edição de áudio e vídeo que usam inteligência artificial tem facilitado bastante esse tipo de golpe, que tem se popularizado e aparecido em diversos países”.

A head da área de Direito Digital e Proteção de Dados do Machado Meyer Advogados, Juliana Abrusio, segue pelo mesmo caminho. “Para aumentar a aparência de veracidade do conteúdo, aumentando as chances da vítima cair no golpe”, disse à reportagem. “Geralmente são usadas marcas e figuras de confiança das pessoas.”

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Roubo de dados e outros riscos

Os anúncios falsos implicam em alguns riscos a quem clica nos links oferecidos pela peça publicitária. Além dos possíveis casos de roubo de dados caso as páginas tenham formulários que solicitem nome, e-mail, CPF e outras informações sensíveis, esse tipo de fraude também pode resultar na perda de dinheiro.

“Caso a vítima efetue o pagamento, ela dificilmente conseguirá reaver o valor, além de não receber o produto anunciado”, pontua Assolini. “Esses golpes se valem de inteligência artificial para manipular as falas de figuras públicas com foco em engenharia social, levando as vítimas a acreditarem no golpe.”

As empresas também podem lidar com contratempos com as tentativas de golpe. Abrusio lembra que algumas vítimas acabam por processar o “nome da empresa” que está no anúncio, mesmo quando a companhia não tem nada a ver com o expediente do criminoso.

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“Na verdade, a empresa também é vítima porque teve o uso do seu nome e/ou imagem usados de forma não autorizada e de modo indevido”, observa a advogada. O mesmo é válido para as pessoas mencionadas nos anúncios falsos.

“As empresas e as figuras públicas costumam ganhar o processo uma vez que provam que sua marca ou imagem foi usada ilegalmente”, acrescenta. “Mas no fim é um desgaste para todos, para a empresa ou figura pública que teve seu nome usado indevidamente e precisa lidar com um processo a mais e, também, um desgaste sobretudo e especialmente para a pessoa que perdeu seu dinheiro e buscou o Judiciário esperando ter um ressarcimento, porém não o consegue pois processou a pessoa errada.”

Ela ainda lembra que o Marco Civil da Internet determina que é somente após a ordem judicial que os provedores, como o Google, podem ser responsabilizados por conteúdos que gerem danos a terceiros.

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Como se prevenir de golpes com anúncios falsos

A desconfiança é uma das principais defesas contra fraudes na internet. Em outras palavras: se um anúncio promete um desconto muito grande, fora do normal, desconfie. Também é importante ficar atento a pequenos detalhes nas páginas da web e vídeos para confirmar se é, de fato, um golpe ou não.

Assolini destaca que é essencial adotar uma “postura de ceticismo” para se prevenir contra golpes de IA. Para isso, é importante verificar a autenticidade de qualquer solicitação incomum, especialmente aquelas que envolvem transferências de dinheiro ou informações pessoais. 

“É importante desconfiar de pedidos urgentes ou emocionais, mesmo que pareçam vir de fontes confiáveis – se parecer bom demais, deve ser golpe”, orienta. “Se viu uma promoção em uma propaganda em redes sociais, visite o site da empresa e confirme se é real.” 

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O especialista em segurança digital também lembra da importância de compartilhar sobre o golpe para conhecidos e familiares para prevenir futuras ocorrências. 

Caí no golpe. E agora?

Se você realizou a suposta compra do celular promovida pelo golpe, o diretor da Kaspersky orienta a procurar o seu banco o quanto antes para tentar reverter as transações e alertar a instituição financeira sobre a fraude.

“Em caso de Pix, a vítima pode solicitar o MED (Mecanismo Especial de Devolução) para tentar reaver os valores”, orienta Assolini. “Aqui a celeridade é essencial, caso a vítima demore a acionar o banco, o valor não será ressarcido, pois os golpistas rapidamente pulverizam os valores recebidos para contas de laranjas.”

Já no caso de pagamentos com cartão de crédito, o especialista informa que é necessário entrar em contato com o emissor para abrir uma disputa para que a instituição financeira cancele o valor pago. 

A head do escritório de advocacia também lembra que a vítima pode procurar um advogado ou uma delegacia para receber instruções de como agir. 

“As empresas ou figuras públicas que tiverem seus nomes usadas sem autorização, ou seja, ilegalmente, podem comunicar o provedor de aplicação para derrubarem o conteúdo fraudulento (vídeo, anúncio, o que seja...) visando a evitar que outras pessoas caiam no golpe”, conclui Juliana Abrusio.

O que dizem os citados?

O Canaltech entrou em contato com o YouTube. Em nota, a empresa explicou que possui políticas que delimitam a forma como as pessoas e empresas podem anunciar pelo Google Ads e que suspendem os materiais quando há alguma violação das regras. Contudo, a companhia não revelou como essas campanhas foram aprovadas e como a análise é realizada.

Veja o posicionamento na íntegra:

Temos políticas rígidas que delimitam a forma como pessoas e empresas podem anunciar produtos por meio do Google Ads. Quando identificamos uma violação às nossas políticas, agimos imediatamente suspendendo o anúncio e, até mesmo, bloqueando a conta do anunciante. No total, apenas em 2023, nós bloqueamos ou removemos, globalmente, 5,5 bilhões de anúncios e 12,7 milhões de contas por violações às nossas políticas. Se algum consumidor suspeitar ou for vítima de golpe, oferecemos uma ferramenta para denunciar violações de nossas políticas. Este é o link (support.google.com) para denúncias.

Além disso, no YouTube, não permitimos certos tipos de conteúdo enganoso que podem causar danos graves. Isso inclui determinados tipos de informação incorreta que podem causar danos reais, como, por exemplo, alguns tipos de conteúdo tecnicamente manipulados. Se qualquer pessoa encontrar conteúdo que viola esta política, é possível fazer uma denúncia e, caso seja necessário, também é possível relatar violações em vários vídeos ou comentários, denunciando o canal.

Já o Mercado Livre informa que tem conhecimento dessas práticas e que combate ativamente as tentativas de golpe de engenharia social:

O Mercado Livre tem conhecimento destas práticas de golpistas que utilizam indevidamente a imagem da empresa em anúncios no YouTube e informa que combate ativamente tentativas de golpe e fraude de engenharia social, que lesam a sua marca fora da plataforma. Para isso, investe massivamente em segurança, tecnologia e equipes especializadas, além de todo trabalho de conscientização de usuários e da parceria com o poder público para a investigação de crimes de cibersegurança. 

Nos últimos anos, a companhia tem percebido a efetividade das ações de educação dos usuários compradores e vendedores, que têm papel relevante na proteção dos seus dados pessoais e na identificação de tentativas de golpe de engenharia social fora da plataforma, que se utilizam de técnicas de persuasão e manipulação para convencer vítimas. 

Atualmente, devido ao seu trabalho de Inteligência Anti-Ciberameaças, a plataforma já derruba cerca de 250 páginas falsas por dia, a partir dos seus esforços proativos de detecção de páginas e posts fraudulentos, que são reportados ao aos servidores e plataformas, solicitando a baixa imediata.

Para garantir uma negociação e compra seguras, o Mercado Livre sempre orienta que toda comunicação e transação entre usuários seja realizada dentro da sua plataforma, assim como os orienta a nunca compartilhar dados pessoais e clicar em links suspeitos. É recomendável ainda verificar os anúncios diretamente na plataforma, o remetente de e-mails recebidos e desconfiar de mensagens via WhatsApp, e-mail ou SMS sem que o usuário tenha solicitado atendimento.

Diante de qualquer suspeita, a empresa recomenda sempre consultar os dados da transação dentro na plataforma, consultar os Termos e Condições de Uso e a seção de Segurança, além de acionar os canais de atendimento oficiais. A companhia reforça ainda que, dentro da plataforma, qualquer anúncio ou vendedor pode ser reportado por usuários compradores através do botão ‘denunciar’, presente em todos os anúncios, assim como a conta com programas reconhecidos de proteção a vendedores, marcas e detentores de direitos autorais, assim como parcerias público-privadas para a investigação externa de práticas proibidas.

A assessoria do apresentador Marcos Mion, por sua vez, informou que trabalha juntamente com o Mercado Livre para tomar as atitudes cabíveis.

Procurados, a Shopee e o youtuber Gesiel Taveira não responderam aos questionamentos do Canaltech até o momento da publicação — o espaço segue aberto para a inclusão dos posicionamentos. A assessoria do cantor Thiaguinho não se pronunciou sobre o caso.