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Não são aliens: esferas teriam se formado no mar há 790 mil anos

Por  • Editado por Luciana Zaramela | 

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Abraham Loeb et al.
Abraham Loeb et al.

Um novo estudo coloca mais uma camada de dúvidas sobre as alegações de Avi Loeb, astrofísico de Harvard que afirmou ter encontrado fragmentos de um meteorito interestelar no fundo do oceano Pacífico. Segundo a nova pesquisa, os elementos químicos encontrados nas amostras definitivamente não vieram do espaço.

Há quase dois anos, Avi Loeb, conhecido anteriormente por afirmar que o objeto interestelar ‘Oumuamua seria uma nave alienígena, recebeu uma “confirmação” do Comando Espacial dos Estados Unidos (USSC) de que um meteoro de 2014 tem origem interestelar.

Isso significa que, segundo essa avaliação, o objeto que caiu na Terra naquele ano é um pedaço de um asteroide que veio de fora do Sistema Solar. Loeb, com a firme determinação de encontrar evidências de que naves alienígenas nos visitaram recentemente, liderou uma expedição rumo ao Oceano Pacífico para buscar os fragmentos desse meteorito.

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O meteoro supostamente interestelar

O astrônomo publicou atualizações constantes sobre a missão em seu blog, relatando que sua equipe “pescou” esférulas metálicas microscópicas no fundo do mar com um ímã gigante. Loeb não demorou para afirmar que se tratava dos fragmentos do meteorito extrassolar, acrescentando que “possivelmente” seriam evidências de tecnologia alienígena.

Loeb enviou as amostras a laboratórios que encontraram elementos químicos em proporções que, segundo ele, não são encontrados no Sistema Solar. Mas esse foi apenas o começo da história que agora se aproxima de um desfecho um tanto… constrangedor!

Esférulas BeLaU

Entre os mais de 800 fragmentos microscópicos encontrados no mar, o time de Loeb escolheu um deles com formato de batata para suas primeiras análises. Nele, encontraram uma quantidade alegadamente anormal de berílio (Be), lantânio (La) e urânio (U). Esse conjunto de compostos foi apelidado de “BeLaU”.

O formato de batata da amostra acima, e de muitas outras, teria sido resultado da ablação causada pela queima do meteoro durante sua entrada na atmosfera.  Ao derreter, os objetos teriam sido "colados", dando essa aparência.

Acontece que, segundo especialistas, um objeto não esférico e composto por corpos "colados" não pode ser fruto de um evento de ablação. Ainda assim, Loeb insiste, dizendo que a proporção entre os elementos isotópicos BeLaU seria inconsistente com a composição padrão dos meteoritos do Sistema Solar. 

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Origem terrestre

Embora os argumentos nos estudos e blog de Loeb pareçam convincentes, a proposta de que as esférulas são fragmentos de um objeto interestelar desmoronam ante análises independentes. A mais recente veio de um cientista planetário que mostra que a origem das esférulas é terrestre.

Os especialistas em ciência planetária deveriam ser uma das — senão as — primeiras pessoas que deveriam ser consultadas para esse tipo de pesquisa. São eles que dedicam suas carreiras estudando composições químicas que podem, ou não, ter vindo do espaço, ou até mesmo de outros sistemas estelares.

Segundo Steve Desch, o autor do novo estudo, a composição isotópica das esferas está dentro da faixa esperada para objetos do Sistema Solar, ao contrário das alegações convictas de Loeb.

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A análise das esférulas aponta que o material foi coletado em uma região conhecida como campo de tectitas da Australásia. É uma vasta área que se estende do sudeste da Ásia até à Antártida e se formou por um grande impacto há 790 mil anos.

Para resumir, as análises mostram que as esférulas de Loeb são bem consistentes com o material encontrado no campo de tectitas. Assim, é possível que tenham alguma origem espacial, mas definitivamente não se trata do meteorito supostamente interestelar de 2014.

Sinal produzido por caminhão

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Há outras camadas de fatores que colocam as afirmações de Loeb no campo da especulação. Uma delas é sobre o sinal de ondas sonoras utilizado para rastrear a localização das esférulas. Essas ondas teriam sido produzidas pela queda do meteorito de 2014.

O problema é que os dados sismológicos usados para esse rastreamento não foram resultado de um impacto, mas sim de um caminhão passando perto da estação sísmica. Em outras palavras, não há nenhuma evidência real de que o meteorito realmente caiu naquela localização.

Benjamin Fernando, principal autor do estudo que analisou o sinal de ondas sonoras, afirmou o seguinte:

Olhamos para o sinal exato que ele estava olhando, e vinha de uma estrada principal. Com o tempo, passou de uma estrada principal em direção a um hospital e depois voltou para a estrada principal. Assim, a partir da análise dos dados, parece-nos que é muito mais provável que o sinal tenha vindo de um caminhão que saiu da estrada principal, passou pelo sismógrafo perto do hospital e depois dirigiu no sentido contrário. Não houve nenhum meteoro envolvido.
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Apesar desses estudos, Loeb dobrou a aposta e insistiu na origem interestelar do meteorito com ainda mais vigor. O próximo capítulo dessa história será um novo estudo de Patricio A. Gallardo sobre a composição BeLau, que pode ser publicado em breve.

Definitivamente, não alienígena

No final de 2023, Gallardo publicou um artigo mostrando que as esférulas são consistentes com cinzas de carvão, um contaminante existente desde a revolução industrial. Loeb minimizou este artigo, mas uma nova análise trará dados mais detalhados.

Agora, Gallardo compartilhou com seu colega Ethan Siegel seu próximo estudo, já submetido a um periódico científico. Nele, há gráficos mostrando com ainda maior certeza que concentrações dos elementos BeLaU nas esférulas de Loeb estão dentro da faixa esperada de cinzas de carvão.

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Para Gallardo, as cinzas de carvão terrestres são muito semelhantes às esférulas coletadas, colocando a última (por enquanto) camada de incerteza sobre as afirmações de Loeb.

Claro, isso não significa que não haja meteoritos interestelares por aí. Na verdade, os astrônomos estimam que há milhares desses objetos capturados pelo Sistema Solar, e muitos provavelmente já devem ter caído em nosso planeta.

Conduta científica

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A boa prática científica é que cada descoberta deve ser revisada por pesquisadores independentes, com o objetivo de eliminar qualquer possibilidade de erro. Se as revisões mostram grandes chances de que a descoberta é um alarme falso, a postura correta é buscar evidências mais consistentes

Não é o que Loeb tem feito; na verdade, seus argumentos são na insistência de que suas evidências são boas o suficiente para sustentar a hipótese da origem interestelar das esférulas. Seus colegas, por outro lado, trazem cada vez mais dados que mostram o contrário.

Por que isso é tão importante? É que a postura de Loeb em relação a esses colegas tem sido um tanto hostil, com insinuações de que eles não têm competência suficiente para refutar suas alegações — como se fosse uma espécie de disputa.

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Segundo Ethan Siegel, um dos maiores críticos dessa postura de Loeb (desde as alegações sobre o ‘Oumuamua), essa história serve como uma advertência. “Qualquer cientista que pretenda entrar num campo fora do seu deve compreender [...] é preciso adquirir a experiência necessária para aprender como é fazer ciência de forma responsável num novo campo”.

Por último, mas não menos importante, as alegações de Loeb acabam por confundir o público, principalmente os mais ansiosos para ver provas de que a Terra foi visitada por alienígenas, prejudicando a ciência que busca essas evidências com maior seriedade e cautela.

O cientista de Harvard publicou “Extraterrestre: O primeiro sinal de vida inteligente além da Terra”, um livro sobre sua hipótese sobre o 'Oumuamua que se tornou um best-seller. Por sinal, essa hipótese também já recebeu respostas, com estudos que dão ao 'Oumuamua uma explicação muito mais provável.

Fonte: arXiv.org, Starts With a BangResearch Notes of the AAS