Avi Loeb | Quem é o cientista de Harvard com polêmica sobre vida extraterrestre?
Por Daniele Cavalcante • Editado por Patricia Gnipper |
O polêmico astrofísico israelense-americano Abraham "Avi" Loeb conquistou a atenção da mídia por suas declarações "bombásticas" sobre seres alienígenas e naves espaciais, na mesma medida em que ganhou muitos críticos na comunidade científica. Mas a saga do cientista é muito maior que as polêmicas acerca de suas últimas pesquisas — e ainda está longe de acabar.
- O que é ciência, método científico e divulgação científica?
- Cuidado com a pesquisa leiga! Saiba como interpretar artigos científicos
Se você acompanhas notícias sobre objetos voadores não identificados (OVNIs), talvez já tenha lido algo sobre Avi Loeb, geralmente mencionado nas manchetes como “astrofísico de Harvard” — afinal, seu cargo nesta universidade passa uma sensação imediata de credibilidade às suas pesquisas sobre tecnologias extraterrestres. Nesta matéria, você conhece melhor esta figura e descobre por que ser um "cientista de Harvard" pode não ser sinônimo de credibilidade inquestionável.
Quem é Avi Loeb?
Avi Loeb tem um currículo extenso: é membro da Academia Americana de Artes e Ciências, da Sociedade Americana de Física e da Academia Internacional de Astronáutica . Em julho de 2018, foi nomeado presidente do Conselho de Física e Astronomia das Academias Nacionais dos EUA.
Durante os anos 2000 e meados dos anos 2010, Loeb foi um cosmólogo prestigiado por suas contribuições importantes sobre buracos negros, matéria escura, as primeiras estrela, e muito mais — ele acumulou mais de 800 artigos publicados. Foi presidente do Departamento de Astronomia de Harvard de 2011 a 2020, mas permaneceu neste cargo por mais tempo.
Até aí tudo bem. Mas o debate sobre objetos interestelares que veio em seguida mudou a direção de sua carreira — provavelmente para sempre. Ao deixar seu posto em Harvard, Loeb tirou um ano sabático que descreveu como "o mais produtivo de sua carreira". Tudo isso foi impulsionado pelo estopim que suas declarações e pesquisas causaram tanto nas manchetes de jornais quanto na comunidade científica.
Durante esse tempo, Loeb publicou o livro “Extraterrestre: O primeiro sinal de vida inteligente além da Terra”, um best-seller de não-ficção. A obra trata do primeiro objeto interestelar já observado pela humanidade — o 1I/'Oumuamua, que passou pelo Sistema Solar em 2017. Mas, longe das hipóteses científicas baseadas em evidências cientificamente aceitas, o livro fala da "possibilidade" de o objeto ser uma nave espacial.
No momento, Loeb se dedica a procurar por vestígios de outro objeto interestelar chamado CNEOS 2014-01-08, que passou sobre o céu de Papua Nova Guiné e caiu no mar em 2014. Este objeto — que parece ter sido um asteroide — precedeu o Oumuamua, porém só foi descoberto por Loeb e seu colega Amir Siraj anos depois.
O cientista também lançou um NFT e trabalha em uma série de relatos sobre sua expedição no oceano em busca desses detritos espaciais. Ainda, é chefe do Projeto Galileo e outras iniciativas relacionadas à busca da resposta para uma das perguntas mais intrigantes da humanidade: estamos sozinhos no universo?
Polêmica de Avi Loeb sobre o Oumuamua
Em 2017, astrônomos de todo o mundo ficaram chocados com a descoberta do Oumuamua “passeando” pelo Sistema Solar, com seu formato alongado e velocidade incomum e órbita altamente hiperbólica. Tudo indicava que se tratava de um objeto interestelar, mas não houve tempo o suficiente para observar sua composição.
No mesmo ano, Loeb sugeriu que o telescópio Green Bank buscasse por sinais de rádio na direção do Oumuamua, só para verificar se não poderia ser uma nave alienígena. “Provavelmente é de origem natural”, disse o pesquisador na ocasião, e a busca pelas ondas de rádio foram infrutíferas.
Já no ano seguinte, Loeb foi mais veemente em suas suspeitas sobre aquele objeto ser fruto de uma inteligência alienígena, publicando dois artigos científicos justificando essa hipótese. A ideia não ganhou muitos adeptos, pois os cientistas em geral não viram evidências para declarações como essas serem divulgadas.
Mesmo assim, os artigos de Loeb chamaram a atenção dos jornalistas de todo o mundo e os convites para entrevistas eram cada vez mais comuns — ele chegou a conceder 12 em um único dia.
Para seus colegas, o problema não é exatamente teorizar sobre o Oumuamua ser uma nave ou não, mas sim o modo como isso é feito. Em outras palavras: a conduta de Loeb foi considerada anticientífica e irresponsável para com o público leigo, que interpreta suas declarações confiantes nas entrevistas como uma confirmação de que os aliens estão “por aí”.
Avi Loeb e as "esferas alienígenas" no fundo mar
Em junho de 2023, Loeb anunciou que sua expedição com o Projeto Galileo em busca do meteoro interestelar de 2014 (chamado CNEOS 20140108) a bordo de um barco chamado Silver Star, havia encontrado um material que poderia ser remanescente de uma nave estelar alienígena.
Estes materiais são esferas minúsculas compostas por uma liga metálica que seria, supostamente, inigualável a qualquer outra existente em nosso Sistema Solar. Para observá-las, é preciso um microscópio, enquanto testes minuciosos em laboratório são necessários para determinar se são naturais ou tecnológicas.
Loeb está confiante que essas esferículas podem ser a primeira evidência sólida de seres interestelares. "Nossas descobertas abrem uma nova fronteira na astronomia para estudar o que existe fora do Sistema Solar por meio de microscópios em vez de telescópios", disse. Novamente, seus colegas entendem as declarações precipitadas — e até mesmo arrogantes.
Por que Loeb é tão criticado por cientistas?
As alegações de Loeb são descritas por muitos membros da comunidade científica como precipitadas, sensacionalistas e prejudiciais para a ciência. Peter Brown, físico de meteoros da University of Western Ontario, disse que o material encontrado no mar pode ser explicado como não interestelar — não sendo sinônimo de seres alienígenas.
Brown ainda declarou que está incomodado com a falta de envolvimento de Loeb com “especialistas relevantes” e que seu comportamento distorce a percepção pública de como a ciência realmente funciona.
Steve Desch, astrofísico da Arizona State University, concorda, afirmando que as "as alegações de Loeb estão poluindo a boa ciência — elas estão juntando a boa ciência que produzimos a esse sensacionalismo ridículo, e dominando o debate sem dar espaço a mais ninguém".
Além disso, muitos artigos escritos por Loeb nunca passaram por revisão de pares, um processo indispensável para qualquer trabalho científico ser considerado válido. Na revisão, todo o método utilizado no estudo e suas conclusões passam por um crivo rigoroso, após o qual, se aprovado, o artigo poderá ser publicado em revistas especializadas.
De acordo com Desch, vários de seus colegas não querem a se envolver com os estudos de Loeb na revisão por pares, afirmando que seu trabalho é “um verdadeiro colapso do processo de revisão por pares e do método científico; e é tão desmoralizante e cansativo”.
Por fim, Ethan Siegel, um dos maiores críticos de Loeb, publicou vários textos em seu blog para rebater as alegações do "colega", inclusive dizendo que não há evidência alguma de que as esferas encontradas no mar estão associadas ao meteoro de 2014. “Na verdade, teria sido chocante se Loeb tivesse ido a qualquer local no fundo do oceano e não tivesse encontrado esférulas de metal à base de ferro”, disse.
Padrões científicos
Cientistas são exigentes com as evidências para declarações sobre novas descobertas, sejam quais forem. Os muitos anos de ciência “mal feita” ou até mesmo enganosa em outros tempos levaram ao desenvolvimento do método científico e de três padrões de ouro que se resumem nos seguintes axiomas:
- Navalha de Occan: a explicação mais simples costuma ser a correta.
- Navalha de Hitchen: O que pode ser afirmado sem provas também pode ser descartado sem provas.
- O Padrão de Sagan: afirmações extraordinárias requerem evidências extraordinárias.
Se colocadas sob esses padrões, as afirmações de Avi Loeb sobre tecnologias extraterrestres falham — tanto no caso do Oumuamua, quanto nas esferas de Nova Papua Guiné. Isso não significa que ele esteja atrás de um “ouro de tolo”, mas que ele não segue as exigências do método científico — sua metodologia parece ser, digamos, mais “intuitiva”.
Apenas o tempo dirá se Loeb encontrará provas cabais de que descobriu tecnologias alienígenas, mas, por enquanto, há explicações muito mais simples para os objetos discutidos até aqui. E, como já sabemos, as explicações mais simples têm mais chances de serem as verdadeiras.
Fonte: New York Times, Times of Israel, Usa Today, Starts With a Bang