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Crítica The Last of Us | Uma adaptação à altura

Por| Editado por Jones Oliveira | 10 de Janeiro de 2023 às 04h01

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HBO
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The Last of Us não é uma adaptação fácil. Não que a história do jogo seja complexa — na verdade, ela é até bem simples —, mas há uma enorme pressão e expectativa em torno da produção justamente por tudo o que ela representa. Como um dos maiores jogos da última década, há um misto de curiosidade e temor pelo modo com que essa trama vai ser levada para as telas. No entanto, os fãs podem respirar aliviados: a HBO trouxe algo à altura do original.

Mais do que a fidelidade visual e até mesmo do roteiro que chega a repetir diálogos inteiros do game, o maior acerto da série é entender qual é o cerne dessa história e o que faz dela tão importante. É valorizar aquilo que, de fato, ela tem de melhor.

Embora seja mais uma trama em um mundo pós-apocalíptico, The Last of Us não é sobre salvar o mundo, matar zumbis e tampouco uma luta pela sobrevivência. Trata-se de algo muito menor e pessoal: a relação entre um homem quebrado pela tragédia e uma garota que só conheceu a desgraça desde que nasceu — e como eles se complementam em suas próprias falhas e fragilidades.

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E o seriado da HBO capta e recria isso muito bem ao longo de sua temporada. Seja com um roteiro muito bem construído que explora toda essa dinâmica e as nuances de seus personagens, a ótima entrega dos atores ou o próprio cuidado de usar tudo isso para enriquecer ainda mais o universo do jogo, ele é tudo aquilo que se esperava dele — e até um pouco além.

Mais do que ser uma adaptação feita apenas para agradar os jogadores, é a prova de que uma boa história funciona em qualquer formato.

Um pai sem filha, uma filha sem pai

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Diante de tantas adaptações medíocres que vimos ao longo dos últimos anos, o receio em torno de The Last of Us é tão natural quanto nossa tendência a procurar semelhanças entre o material-base e a série. Contudo, o que torna a produção tão incrível não é o quão idêntica essa Boston sitiada está de sua contraparte do PlayStation 5 ou como Bella Ramsey repete as mesmas falas de Ellie para irritar Joel (Pedro Pascal).

Como dito, é a dinâmica entre esses dois personagens que guarda todo o coração da história. Sem isso, estamos falando de apenas mais um seriado de zumbi como tantas outras, apenas substituindo o vírus por um fungo igualmente mortal. E o que a série faz é aproveitar muito bem cada cena e cada diálogo para aprofundar e desenvolver essa relação.

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Isso é tão bem feito que as comparações com o videogame logo perdem o sentido. Não apenas porque tudo está idêntico a ponto de não existirem referências, mas por conseguir replicar o envolvimento e o engajamento do público na jornada de Joel e Ellie.

A química entre Pascal e Ramsay é perfeita nesse sentido, intensificada por um roteiro e uma direção que sabem extrair e expor a emoção necessária. Os atores entregam um trabalho incrível na hora de dar vida a esses personagens tão icônicos e entregam uma interpretação bastante sensível em que tudo é dito nos detalhes.

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Dos olhares silenciosos de Joel às vaciladas de Ellie, são nesses pequenos momentos que eles mostram o quanto a série e o próprio elenco entendeu o que torna The Last of Us um nome tão poderoso dos games. Mais do que isso, como essa história funciona também e tão bem na TV.

E embora Pascal já tenha entregue algo parecido com isso em The Mandalorian, há um universo que separa seu Joel de Din Djarin. No caso de seu sobrevivente, é muito mais fácil enxergar a complexidade que ele traz ao personagem diante de suas dores e do próprio conforto que ele encontra ao lado de Ellie. Quando ele segura o riso diante de uma das piadas da garota, é impossível não se emocionar — e mostra bem por que ele se tornou um dos grandes nomes do momento.

Ao mesmo tempo, Ramsey é uma enorme surpresa como Ellie. Ainda que demore um pouco mais para que a vejamos como a heroína do game, ela transita muito bem entre o irritante e a inocência, o que dá todo sentido à sua transformação e ao impacto que ela causa em Joel. Mesmo não roubando a cena, é fácil se apaixonar e querer proteger essa menina.

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Fidelidade máxima

Em relação à tão comentada fidelidade com o material original, The Last of Us cai na mesma situação que vimos há pouco tempo com Sandman. Trata-se de uma adaptação tão literal que mal dá para chamar de adaptação.

Quem conhece o game vai perceber como tudo está idêntico. E não apenas nos cenários ou no visual dos personagens. Há situações inteiras que são recriadas inclusive com os mesmos diálogos e enquadramentos.

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Por um lado, isso é tudo o que o fã purista poderia esperar. Afinal, diante da grande possibilidade de a série “estragar” o jogo, ver como ele respeita e se baseia no game é um atestado mais do que óbvio de como ele segue tudo ao pé da letra. Só que, por outro lado, tira um pouco do propósito de adaptar e torna tudo bem mais previsível e até um pouco monótono.

Longe de mim dizer que o problema de The Last of Us é ser bom demais ou coisa parecida. Contudo, como alguém que jogou inúmeras vezes, pareceu apenas que eu estava com o PlayStation 4 ou PlayStation 5 ligado e quase não senti vontade de devorar a temporada do início ao fim.

Ainda assim, a série consegue ser muito melhor resolvida nesse sentido do que Sandman, por exemplo. Primeiro porque o game já tem uma linguagem cinematográfica que faz com que essa transposição de mídia funcione de forma bem mais orgânica e de modo menos truncado entre um arco e outro.

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Além disso, há algumas mudanças aqui e ali que se revelam as grandes surpresas para quem jogou. E esse é um grande acerto da HBO, pois essas adições não só expandem o universo, mas também preenchem algumas lacunas que o jogo deixa em aberto. E não apenas por mostrar mais de antes da infestação, mas por desenvolver melhor alguns personagens em tramas que são muito bonitas e impactantes. Não por acaso, esses momentos foram os pontos altos para mim.

Essa mesma lógica dita o funcionamento do próprio cordyceps, o fungo que transforma as pessoas em zumbis. Ele é um pouco diferente do que é mostrado no jogo e com um aspecto bem mais visual, mas que funciona muito melhor. Ao mesmo tempo, os cortes fazem pouca diferença. Não há esporos e a solução encontrada para substituir essa ameaça local é até mais terrível.

Na essência

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Diante disso tudo, não há como negar que a HBO conseguiu fazer com que The Last of Us seja realmente a melhor adaptação de um jogo que vimos até hoje. Ele traduz muito bem a essência do game, entende o porquê de ele ser um sucesso e replica isso muito bem com um roteiro que capta todos os detalhes necessários, uma atuação incrível de todos os atores envolvidos e uma direção que potencializa tudo isso a cada nova cena.

Os infectados estão lá, há tensão no encontro com os Clickers e tensão na luta contra outros sobreviventes, mas a série não se distrai com a ação e o lado “videogame” da coisa e usa esses elementos apenas para criar a tensão necessária para desenvolver seus personagens. É perceptível o cuidado em cada um dos episódios para fazer com que tanto os fãs se sentissem representados quanto para mostrar a quem está chegando agora por que essa é uma história amada por tanta gente.

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Ainda que nove episódios pareçam muito pouco para abarcar toda a trama do jogo, o ritmo encontrado é perfeito: não há nada sobrando e tampouco coisas importantes ficam de fora — tudo é usado para aprofundar seus personagens e fazer com que a gente sinta cada uma de suas dores.

No fim, The Last of Us consegue nos colocar contra a parede tanto quanto o jogo, o que só mostra o quanto ele é feliz em sua adaptação.

Enfim, é para respirar aliviado.

The Last of Us estreia na HBO e na HBO Max no dia 15 de janeiro com episódios semanais.