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ISS abriga humanos no espaço há duas décadas. E agora, qual o futuro da estação?

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Nesta segunda-feira (2) a humanidade completou 20 anos de presença permanente no espaço. Foi nesta data, no ano de 2000, que a primeira tripulação de astronautas acoplou uma nave na Estação Espacial Internacional (ISS), ficando por lá durante quatro meses. Nesse período, a equipe instalou e ativou o suporte de vida e os sistemas de comunicação, além de outros trabalhos relacionados às futuras atividades do laboratório orbital.

Percorrendo o globo terrestre na baixa órbita a uma altitude de 400 quilômetros, a ISS atinge uma velocidade de 27.700 km/h e completa 15,70 voltas em nosso planeta, todos os dias. Além de ser um grande marco na ciência, a estação também representa a colaboração entre vários países, em especial entre Estados Unidos e Rússia — um acordo assinado entre ambos, anos antes, decretou o fim da corrida espacial e da Guerra Fria, e deu início à montagem da estação orbital.

Hoje, a ISS é um dos maiores experimentos científicos já realizados no espaço, e a maior estrutura já construída fora do nosso planeta, tendo custado cerca de US$ 150 bilhões. Ao todo, mais de 240 tripulantes e visitantes de 19 países visitaram a estação e encontraram nela um lar temporário.

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Embora o lançamento do primeiro módulo da ISS tenha ocorrido no dia 20 de novembro de 1998, levaria ainda quase dois anos para a grande inauguração. É que a estação foi montada no espaço, então foi necessário esperar um tempo até que os módulos fossem enviados à órbita e a montagem da construção fosse concluída. Só depois disso, a Expedição-1 foi liberada para permanecer no espaço. Desde então, a ISS foi constantemente habitada, apesar das muitas dificuldades durante essas duas décadas.

Não foram obstáculos fáceis de superar. Por exemplo, em 2003, o ônibus espacial Columbia sofreu um acidente que matou sete astronautas. Em 2014, algumas das principais parceiras dos Estados Unidos no projeto da estação entraram em conflitos políticos devido à invasão da Crimeia pela Rússia, que também faz parte da iniciativa. Hoje, o mundo enfrenta a pandemia do novo coronavírus, que forçou as agências espaciais a adotar medidas de distanciamento social entre seus funcionários.

Apesar disso, a ISS continua constantemente ocupada por tripulações que realizam pesquisas científicas em busca de soluções tanto para o futuro da exploração espacial, quanto para problemas atuais do nosso planeta.

A primeira expedição à ISS

Em 31 de outubro de 2000, a primeira tripulação, composta por William "Bill" Shepherd, dos Estados Unidos, e os russos Sergei K. Krikalev e Yuri Gidzenko, formou a Expedição-1. Eles foram lançados em um foguete Soyuz do Cosmódromo de Baikonur, no Cazaquistão, e dois dias depois a espaçonave acoplou com sucesso na ISS. Após alguma dificuldade para abrir a escotilha da Soyuz, a tripulação conseguiu acessar a escotilha da ISS e passou a habitar na estação para “trazê-la à vida”.

Isso significa que as principais tarefas dos astronautas incluíram a instalação e ativação do suporte de vida e sistemas de comunicação. Eles também tiveram que trabalhar com outras três tripulações, que chegaram lá viajando nos ônibus espaciais, para continuar a montagem da ISS — que só terminou oficialmente em 8 de julho de 2011, na Expedição STS-135. Em sua inauguração, a estação contava apenas com os módulos Zarya, Unity e Zvezda.

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Pouco após entrar na estação, Shepherd, Gidzenko e Krikalev realizaram sua primeira conversa televisionada com o Centro de Controle de Voo em Korolev, Rússia, e com o Diretor Geral da Agência Espacial e de Aviação Russa, Yuri N. Koptev, e o administrador da NASA, Daniel S. Goldin. Em seguida, começaram a trabalhar na ativação do dispensador de água quente.

Nos primeiros dias, a tripulação enfrentou um problema com os controladores da missão estadunidense e russo. É que os astronautas recebiam constantemente um conjunto de instruções da NASA e, posteriormente, os controladores em Moscou mudavam os planos. E vice versa. Até que o comandante Shepherd deixou claro que aquilo não devia continuar. “Somos a Estação Espacial Internacional”, disse ele. “Somos um programa para Houston e outro para Moscou. E não vamos trabalhar em um plano até que vocês tenham um plano para uma [única] estação. Então, vocês vão agir juntos”.

Apesar dos contratempos, a tripulação conseguiu instalar e ativar os sistemas críticos da estação, como o sistema de geração de oxigênio e o sistema de remoção de dióxido de carbono. Algumas semanas depois, eles receberam seus primeiros companheiros, a tripulação do ônibus espacial Endeavour, que visitou a ISS na missão STS-97 para instalar o primeiro segmento de treliça e os primeiros painéis solares para fornecer energia.

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Outras tarefas foram completadas pela equipe e outras tripulações visitantes. Em fevereiro de 2001, por exemplo, a tripulação da missão STS-98 chegou à ISS a bordo do ônibus espacial Atlantis para entregar o módulo Destiny, o principal centro de pesquisa dos EUA. No mês seguinte, o ônibus espacial Discovery chegou com um Módulo de Logística Multifuncional, entregando suprimentos e o primeiro rack de pesquisa a ser instalado no Destiny.

A Expedição 1 terminou após 141 dias, quando o Discovery pousou no Kennedy Space Center da NASA em 21 de março de 2001, trazendo de volta o trio que inaugurou uma nova era da exploração espacial.

6 pesquisas importantes da ISS

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As pesquisas realizadas na estação orbital podem não ter proporcionado grandes descobertas revolucionárias, mas deu às agências espaciais um conhecimento muito mais amplo sobre como plantar em outros mundos e maneiras de construir habitats e maquinários complexos no espaço para que futuros astronautas possam expandir a exploração humana na Lua, em Marte, e além.

Outro tipo de pesquisa importante para esses fins trouxe uma nova percepção de como a microgravidade afeta o corpo humano, além de possibilitar algumas descobertas significativas sobre a medicina no espaço. Na ISS, astronautas realizam experimentos com impressão de tecidos humanos, o que poderá ser muito útil em um futuro próximo.

Foram inúmeras pesquisas relevantes nos últimos 20 anos de permanência ininterrupta no espaço, e não poderíamos fazer uma lista com todas elas. Confira então 5 dentre as mais interessantes.

Alzheimer, Parkinson e Câncer

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Algumas pesquisas realizadas na estação espacial contribuem com os cientistas que estudam condições como o Alzheimer, Parinson, câncer, asma, entre outras, graças ao ambiente de microgravidade proporcionada à ISS. Sem a interferência da gravidade da Terra, os pesquisadores de Alzheimer, por exemplo, estudaram aglomerados de proteínas que podem causar doenças neurodegenerativas.

Já os cientistas que estudam o câncer puderam analisar o crescimento de células endoteliais (que ajudam a fornecer sangue ao corpo, sendo também necessárias aos tumores para se formarem) na estação espacial. As células cultivadas na estação espacial crescem melhor do que as da Terra e podem ajudar a testar novos tratamentos contra o câncer.

Purificação da água

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O sistema de suporte de vida da estação espacial foi desenvolvido para fornecer à tripulação ar puro e água limpa. Por isso, o Sistema de Recuperação de Água foi desenvolvido para purificar e filtrar a água da ISS, recuperando e reciclando 93% de toda a água que os astronautas usam no espaço — isso inclui a água do banho, por exemplo. Até mesmo a água nas toalhas podem ser reaproveitadas.

Esta tecnologia foi licenciada para ser adaptada a um sistema de tratamento de água aqui na Terra. Em 2016, o Iraque se tornou o primeiro lugar a receber o novo sistema de filtragem usando tecnologia da NASA.

Quinto estado da matéria

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Em 2018, o Cold Atom Lab da NASA se tornou o primeiro a produzir o quinto estado da matéria, chamado condensado de Bose-Einstein (BEC), fora do nosso planeta. O laboratório levou os átomos a temperaturas ultra-frias para estudar suas propriedades de maneiras impossíveis na Terra.

Os BECs dão aos cientistas que estudam a física quântica uma nova ferramenta para observar nesses condensados algumas propriedades que surgem apenas em átomos individuais. Ao se manifestarem em BECs, essas propriedades se tornam visíveis em uma escala muito maior. O estudo pode fornecer informações sobre as leis fundamentais da mecânica quântica.

Estudando buracos negros e quasares

Do lado de fora da estação orbital, existem dois instrumentos instaladas para trabalharem juntos no estudo de objetos distantes no espaço profundo. Observando fontes de raios-X, as ferramentas Neutron Star Interior Composition Explorer (NICER, da NASA) e o Monitor of All-sky X-ray Image (MAXI, da agência japonesa JAXA), ajuda na melhor compreensão de buracos negros e quasares.

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Em 2018, por exemplo, o MAXI detectou uma nova fonte de raios-X, que foi batizada de MAXI J1820+070. Pouco depois, o NICER começou a monitorar esse objeto misterioso e descobriu que era um sistema binário de um buraco negro que orbita uma estrela.

Poucos dias depois, o objeto se tornou uma das fontes de raios-X mais brilhantes do céu, e o NICER ajudou os cientistas a observar a evolução desse sistema binário. Eles puderam coletar dados valiosos enquanto a borda interna do disco de acreção do buraco negro mudava de tamanho e forma conforme consumia o material da sua estrela companheira.

Mudanças no corpo humano

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Um dos maiores interesses da NASA e outras agências espaciais é saber como o corpo humano pode se modificar em estadias prolongadas no espaço. A permanência prolongada na estação espacial foi capaz de revelar que alguns astronautas da ISS desenvolveram mudanças na visão.

Como parte de pesquisas dessa natureza, o astronauta Scott Kelly passou quase um ano na ISS, enquanto seu irmão gêmeo ficou por aqui, enquanto a NASA estudou o organismo de ambos para descobrir mais a fundo os impactos causados no organismo após longos períodos no espaço. Eles descobriram que o corpo de Scott mostrou algumas mudanças no espaço, só que quase todas as alterações voltaram ao normal após seu retorno — em especial sua atividade genética.

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Durante sua missão na Estação Espacial em 2015, a astronauta Samantha Cristoforetti, da ESA, descongelou células imunológicas congeladas de mamíferos e as colocou na centrífuga Biolab, que gera gravidade artificial. As células foram giradas para recriar diferentes níveis de gravidade, do zero ao nível que sentimos na Terra, permitindo aos pesquisadores comparar amostras e excluir outros fatores nos resultados.

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Como resultado, foi descoberto que o tempo que as células imunes de mamíferos levam para se adaptar à microgravidade é 42 segundos, coincidentemente o significado da vida, de acordo com Douglas Adams no Guia do Mochileiro das Galáxias. Também é o número da Expedição que foi à ISS realizar o experimento!

Bonus: Um brasileiro no espaço

O Brasil também teve uma rápida participação no programa com Marcos Pontes, o primeiro brasileiro a ir ao espaço. A sua viagem aconteceu em março de 2006 com a Missão Centenário, um programa criado entre o Brasil e a Rússia, que possibilitou 10 dias de experimentos.

O ex-astronauta (e hoje Ministro da Ciência, Tecnologia e Inovações) chegou à ISS ao lado do astronauta Jeffrey Williams, da NASA, e do cosmonauta Pavel Vinogradov, a partir de uma nave russa Soyuz. Lá, ele realizou oito experimentos científicos elaborados por universidades e centros de pesquisas de nosso país, mas, infelizmente, seus resultados não tiveram relevância para serem considerados avanços da ciência nacional.

O futuro da ISS

Embora o futuro fatal da ISS seja explodir e cair no oceano, de modo seguro para nós, habitantes da Terra, ainda não se sabe exatamente quando isso vai acontecer. Mas até lá, há muito o que se fazer na estação orbital, inclusive dar início à era dos lançamentos de astronautas de empresas comerciais.

Para manter a ISS por mais algum tempo, será necessário trazer parceiros comerciais para ajudar no financiamento da estação. Uma ideia é criar habitats comerciais que seriam anexados à estação e vender viagens turísticas à ISS para aqueles que desejam experimentar como é estar na baixa órbita da Terra.

Colaboração comercial

A startup Axiom Space é uma das empresas que deverá ter um módulo comercial a ser anexado à ISS. Assim, a estação deixará de ser estrtamente comandada por agências governamentais. A Axiom também planeja enviar a primeira de suas equipes de astronautas particulares no próximo ano.

No ano passado, a própria NASA já anunciava oficialmente que a ISS seria aberta para abrigar temporariamente astronautas privados. A ideia é acelerar a economia comercial na órbita baixa da Terra. Entretanto, há algumas exigências a serem cumpridas para que as empresas interessadas tenham a chance de levar seus próprios astronautas ao espaço.

Subiu, tem que descer

Bem, não necessariamente tem que descer. Muitos satélites sobem e mesmo após deixarem de funcionar ficam lá mesmo, em uma órbita mais afastada conhecida como “órbita do cemitério”. Mas não será o caso da ISS. Ela não vai durar para sempre e também não poderá ser enviada para flutuar eternamente no espaço mais distante de nós. Terá que ser "desorbitada".

Por enquanto, os voos até a estação orbital vão continuar pelo menos até 2024. Os países participantes da construção e manutenção da ISS — Estados Unidos, Rússia, Canadá, Japão e as nações participantes da Agência Espacial Europeia — terão que decidir juntos quando retirá-la de órbita, um assunto que envolve tanto engenharia quanto política.

É possível que não haja um consenso sobre até quando o laboratório espacial deverá funcionar. Funcionários da NASA, por exemplo, já disseram que se depender deles, o programa vai até 2028. “Nossa análise não identificou nenhum problema que nos impeça de ir além de 2028, se necessário”, escreveram à Space.com. Mas mantê-la na órbita é caro e, independente dos acordos sobre a data, algum dia será o fim da ISS — ou ela poderá apresentar riscos.

Mas como se livrar da carcaça quando tudo se tornar um grande e inconveniente entulho espacial? Os envolvidos sempre souberam que eventualmente teriam que tirá-la de órbita, mas parece que os detalhes só começaram a ser elaborados recentemente. Para pensar melhor no assunto, um grupo da NASA que avalia as medidas de segurança da agência começou a levantar preocupações sobre o assunto — há pelo menos uma década.

De acordo com a NASA, já está em andamento a elaboração de alguns cenários para a retirada da ISS de órbita, além de uma resposta se algo der muito errado, mas esses planos ainda não são públicos. Mas o risco de a estação espacial cair sozinha na Terra, com suas 400 toneladas, ainda é significativo.

Uma das opções está em um plano de 2017, apresentado por um grupo de engenheiros da NASA e da russa Roscosmos. O artigo descreve como a ISS poderia ser impulsionada pelos propulsores de veículos russos de carga Progress, que permaneceriam acoplados à estação. Os propulsores do módulo de serviço também podem ser usados, somando energia para levar a estação em direção à Terra.

Cuidadosamente cronometradas, as manobrariam levariam a estação para baixo, tornando a reentrada mais previsível e permitindo que os controladores direcionem tudo para o oceano Pacífico sul. O resto dependerá da queima durante a reentrada na atmosfera terrestre, mas é certo que muito da ISS sobreviverá ao processo.

Ainda é cedo para dizer se essa estratégia será ou não adotada ou ao menos usada como base para um futuro plano mais elaborado. Mas o tempo está passando e as agências precisam decidir o quanto antes como dar à Estação Espacial Internacional um final digno, ou seja, sem nenhuma complicação para a vida na Terra.

Ilustrações comemorativas

Para celebrar o 20º aniversário de permanência contínua na Estação Espacial Internacional, a ESA contratou dois artistas italianos para ilustrar a ISS a partir de duas perspectivas — interna e externa. O ilustrador Ale Giorgini escolheu a visão de dentro do observatório Cupola da ISS, enquanto Riccardo Guasco desenhou a estação de uma perspectiva externa.

Abaixo, você confere o processo de cada um até o resultado final. Primeiro, a imagem interna, que destaca o trabalho dos astrunautas, enquanto eles parecem se sentir em casa.

Por fim, a visão externa em uma pintura digital extraordinária.

Fonte: NASA (1, 2), Space.com (1, 2), The New York Times, ESA (1, 2)