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Tomografias revelam segredos sobre múmias egípcias e técnicas de embalsamamento

Por  • Editado por Luciana Zaramela | 

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Morgan Clark/The Field Museum
Morgan Clark/The Field Museum

Usando técnicas modernas não-invasivas, pesquisadores do Museu de História Natural de Campo de Chicago analisaram dezenas de múmias, revelando segredos dos métodos de mumificação e das vidas dos antigos egípcios sepultados nos sarcófagos. O esforço mostra a mudança recente nos métodos de investigação, mais respeitosos com os falecidos milenares.

As tomografias computadorizadas realizadas nos restos mortais duraram quatro dias, mas a análise dos modelos 3D gerados poderá levar até três anos, segundo contou o coordenador do projeto, J.P. Brown, em comunicado. Com cerca de 3.000 anos, 26 múmias em exibição no museu foram levadas em carrinhos especiais até uma máquina de tomografia móvel.

O além-vida egípcio

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O museu em Chicago possui exibições muito populares sobre o Egito, incluindo uma réplica de três andares de um tipo antigo de tumba conhecida como mastaba.

As câmaras mortuárias do local, datadas de 2400 a.C., trazem 23 múmias humanas e 30 de animais. Os antigos egípcios acreditavam que a alma continuava no corpo após a morte, então a mumificação era a maneira de preservar o espírito depois da morte.

O ritual todo levava até 70 dias, removendo todos os órgãos internos da futura múmia — menos o coração, onde se acreditava que residia a alma —, secando o corpo com salitre e o envolvendo em ataduras, às vezes com orações escritas nelas ou incluindo amuletos de proteção. A parte final do processo era um enterro ritual.

Os órgãos internos eram colocados em vasos canópicos, cada um com uma tampa iconográfica retratando um dos quatro filhos do deus egípcio Hórus, para proteção. Imseti, com cabeça humana,  guardava o coração; Hapi, com cabeça de babuíno, os pulmões; Duamutefe, com cabeça de chacal, o estômago; e Quebesenuefe, com cabeça de falcão, os intestinos.

Na nova pesquisa, no entanto, novidades incluíram a presença de pacotes com os órgãos, recolocados na posição original do órgão na múmia — uma prática bem diferente, onde os tecidos foram identificados por estarem dentro de estátuas representando cada deus

Os pesquisadores comparam o enterro egípcio com os planos de aposentadoria modernos: as pessoas se preparavam para o além-vida, guardando dinheiro e planejando tudo para aproveitar o pós-morte com conforto. Nem todo egípcio era mumificado, mas a classe média-alta e a aristocracia comumente eram.

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Múmias de destaque

Dois indivíduos, na pesquisa estadunidense, se destacaram pelas novidades trazidas. Um deles era a múmia da Dama Chenet-aa, que viveu na 22ª dinastia, há cerca de 3.000 anos.

Com prestígio social, ela faleceu no final dos seus 30 anos ou início dos 40, e desgastes nos dentes mostram que sua comida incluía grãos de areia, danosos ao esmalte. Havia enchimento na traqueia da múmia, posto para garantir que o pescoço não caísse.

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Ela também tinha olhos artificiais — uma adição bem literal, como a tradição pedia. Para ter órgãos assim no além-vida, era preciso ter olhos físicos no cadáver, ou alguma alusão física a eles. Camadas caras de tecido enrolavam Chenet-aa, envoltas, finalmente, por um sarcófago de cartonagem, um caixão funerário de material semelhante ao papel-machê.

Havia mistério, no entanto, sobre o método de colocação da múmia na cartonagem. Não havia costuras aparentes, e uma abertura pequena aos pés, não sendo o suficiente para inserir o corpo. Como a tomografia revelou o interior, os cientistas solucionaram o caso: a caixa foi, basicamente, enlaçada na parte de trás antes de ser colada a um painel, criando a ilusão de continuidade.

A múmia teria sido deixada de pé, e a cartonagem, umedecida para se flexibilizar, podendo ser moldada no formato do corpo. A parte de trás foi cortada para inserção do corpo e depois costurada de volta. Não há como ver cores na análise, mas foi possível ver padrões artísticos no topo da cartonagem.

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Outra múmia interessante é Harwa, um sujeito que faleceu também há 3.000 anos e era “porteiro” de um silo de grãos. Ele morreu em meados de seus 40 anos e tinha uma posição social alta, tendo provavelmente vivido confortavelmente.

Não há desgaste indicando trabalho físico extenuante, mostrando que ambas as múmias eram de classe alta, mas os dentes de ambos estão gastos, algo comum pela areia do deserto ou pelo uso de pedras para moer a comida.

Um dos sarcófagos continha um egípcio de 14 anos e era bem maior do que o necessário — provavelmente sendo um caixão usado, adquirido com desconto ou emprestado, já que nem todo mundo podia pagar por algo personalizado para o enterro.

Respeito aos mortos

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As práticas de estudo, mais respeitosas, incluíram conversas do museu com representantes egípcios. Conversou-se sobre a devolução das múmias para o Egito, mas as autoridades do país quiseram que elas continuassem expostas em Chicago.

Harwa é um exemplo da mudança: em 1939, ele foi a primeira pessoa mumificada a viajar de avião, sendo levado para um show da Broadway quando chegou em Nova York. Ele ficou exposto na Feira de Nova York por dois anos, voltando ao Museu de Campo após ser perdido na bagagem, sendo levado a São Francisco.

Hoje em dia, aventuras assim não são mais consideradas éticas — para os antigos egípcios, o pós-morte é uma continuação da vida. Agora, cientistas estão tratando múmias como pessoas, não apenas objetos de arte ou artefatos arqueológicos curiosos.

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Entender como os povos do passado tratavam seus mortos ajuda os pesquisadores a contar suas histórias e respeitar o seu além-vida com dignidade.

Fonte: Chicago Field Museum