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Crítica Mulher-Hulk | Temporada tem final brilhante com interação e autocrítica

Por| Editado por Jones Oliveira | 14 de Outubro de 2022 às 18h00

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Marvel Studios
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Se você é uma dessas pessoas que se incomodam com um protagonismo feminino, talvez Mulher-Hulk: Defensora de Heróis tenha te incomodado. Se isso estiver acontecendo, a série e sua trama atingiram com sucesso seu objetivo.

Esse incômodo que algumas pessoas podem sentir surge não só pela personagem de Tatiana Maslany ser o centro das atenções, como pela série, a todo momento, fazer piada com a existência do sexismo e em como o problema é visto no mundo do entretenimento — principalmente no mundo masculino dos super-heróis.

Maslany, que alcançou o estrelato em Orphan Black interpretando múltiplas personagens, foi Jennifer Walters em Mulher-Hulk, série que agora concluiu sua primeira temporada. E é um fechamento impecável que põe um ponto final absoluto na queda de braço que acompanhou toda a temporada sobre seu humor ácido e problemas de roteiro ou mesmo sobre a qualidade dos efeitos visuais.

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No fim, vence uma história inteligente que sabe reconhecer suas próprias falhas, que brinca com isso, mas sem a chance de provocar quem não está disposto a dar o braço a torcer.

Atenção: esta crítica pode conter spoilers da primeira temporada de Mulher-Hulk!

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Autocrítica

Mulher-Hulk é uma série que mal parece ser da Marvel, uma vez que a quantidade de vezes que a trama faz piada com ela mesma é incontável. E a missão foi fácil, pois Jennifer é uma personagem que quebra a quarta parede a todo o momento para conversar com o público e os roteiristas.

Essa é uma característica que vem dos quadrinhos. Muito antes de Deadpool ser o herói referência desse estilo narrativo, a gigante esmeralda já fazia isso muito bem em sua revista. Na época, a Marvel já tinha percebido que o fato de Mulher-Hulk não ser um de seus medalhões dava a liberdade para experimentar na linguagem, brincando tanto com a história que está sendo contada como também com o formato da HQ e com a própria Marvel em si. Eram histórias em que ela reclamava dos roteiristas e do rumo que suas aventuras seguiam.

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E isso é algo que Defensora de Heróis replica muito bem, mas com uma energia e com uma identidade própria. Em uma das quebras mais invasivas da história da televisão, a protagonista de Maslany quebra o Disney+ e invade o Marvel Studios para questionar roteiristas e o "próprio" Kevin Feige sobre o final dado para o seu show. E é nesse momento que a série brilha demais.

Não apenas por brincar com a linguagem de uma forma muito criativa e que emula a HQ, mas por dar um passo além. Jennifer não economiza críticas às fórmulas clichês de séries de super-heróis, afirmando que não era isso que desejava para a sua própria série. Afinal, ela mesma disse que se tratava de uma comédia sobre advocacia — a sua própria história — e não só mais uma série da Marvel.

Trata-se de uma autocrítica inesperada vindo da Marvel. Ao colocar sua protagonista apontando o dedo para a pobreza do próprio roteiro, o estúdio se mostra consciente do quanto sua fórmula já chegou ao limite — e que eles sabem disso. E isso fica mais do que evidente quando chefe de todo o Universo Cinematográfico da Marvel (MCU, na sigla em inglês) não é uma pessoa, mas esse robô de boné que controla o "algoritmo máximo do entretenimento".

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Mais do que isso, ao brincar que todas as produções do MCU seguem essa mesma estrutura quase monolítica de roteiro, Mulher-Hulk escancara o quanto a própria Marvel educou o seu público a pensar e a consumir um único tipo de história, se fechando para possibilidades que fujam do script repetitido ao longo desses quase 15 anos. Não por acaso, o vilão da série é o próprio fã — ou parte dele.

O Hulk-Rei que odeia Jeniffer por ela "não merecer" o poder que tem ou pelo simples protagonismo que ela recebe em seu mundo é o mesmo que repete gestos de Wakanda e compra relíquias do país sem entender o que eles significam. É a mesma lógica de quem vê ou lê X-Men e não enxerga a crítica existente naqueles personagens.

Ele representa esse público que só absorve a camada mais superficial das histórias que consome e não enxerga (ou não quer enxergar) as mensagens que estão por trás da aventura simples do super-herói. E a Marvel mostra estar ciente de sua parcela de culpa por ter educado esse espectador dessa maneira.

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Quando Jen invade o estúdio e aponta todos os clichês do seu roteiro, ela não apenas reclama do roteiro ruim daquele episódio. Na verdade, ela enumera cada uma das saídas fáceis que a fórmula Marvel estabeleceu durante todo esse tempo. Da luta sem sentido no final contra um vilão genérico às aparições feitas apenas para gerar hype para o que vem em seguida, tudo o que a série mostra são situações que vimos à exaustão em filmes e séries e que é preciso girar a chave e fazer diferente para que o MCU — e o próprio entretenimento — possam seguir em frente com ideias novas e cada vez mais criativas.

E por mais que muita gente torça o nariz, Mulher-Hulk personifica muito bem essa mudança, tanto enquanto série como personagem. Enquanto Jennifer, ela é uma versão parecida com alguém que a gente já conhece, mas diferente o bastante para trazer novos ares e levar a história para caminhos totalmente novos. Como série, ela sinaliza que a Marvel está ciente do que precisa ser feito, mesmo que isso represente deixar alguns Hulk-Reis pelo caminho.

Portanto, mais uma vez: se você se sentiu incomodado com isso, o seriado atingiu um de seus objetivos.

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Camadas

Só que esse não é o único acerto de Mulher-Hulk. O que deixa a série ainda mais genial é a liberdade para brincar com o universo da Marvel do começo ao fim, mas com foco no sexismo. E é impossível fugir desse assunto quando se trata da personagem. Se você não gostou dessa abordagem, você foi o alvo dos roteiristas e da showrunner Jessica Gao.

Vimos a protagonista ser vítima de machismo pela sua carreira de advogada e por ser uma Hulk, mas em nenhum momento ela se vitimizou, como dizem. Walters simplesmente pontuou o que uma mulher sofre na sociedade e escolheu não aceitar. A maior representação disso é a questão da mulher raivosa e o controle de seus poderes.

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Jennifer diz que é mais fácil controlar a sua transformação do que Bruce Banner (Mark Ruffalo), já que a paciência das mulheres é testada a cada segundo todos os dias, desde o nascimento. Com isso, na maioria das vezes, há a necessidade de se controlar para não ser definida como "sem paciência", "descontrolada" ou "está naqueles dias".

É um subtexto não tão sutil assim e que está presente em praticamente todos os episódios. Do interesse dos homens apenas no seu lado Hulk às perguntas banais que canais de TV e até premiações fazem a mulheres em posição de destaque, são alfinetadas que combinam muito bem com o que é a Mulher-Hulk.

A mulher em posição de poder que é descontrolada é um estereótipo comum em filmes e séries e ver isso ser subvertido em alguém que é literalmente um Hulk é incrível e dá à personagem um tom próprio e que a difere de qualquer versão vinda dos quadrinhos.

Embora seja fácil perceber as influências que vêm dos quadrinhos, da quebra de quarta parede aos absurdos de cada caso semanal, o verdadeiro charme de Defensora de Heróis é ter encontrado uma voz própria que enriquece muito daquilo que as HQs apresentaram, mas ainda brilha única com seu roteiro e atuação impecável de Maslany.

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Portanto, Mulher-Hulk vai além de contar mais uma história do universo da Marvel, brincando com isso e alfinetando os envolvidos para forçar essa saída da zona de conforto. E tudo isso funciona tão bem que, apesar da grande quantidade de participações especiais, em nenhum momento o brilho é do Wong (Benedict Wong), do Demolidor (Charlie Cox) ou do próprio Mark Ruffalo. A trama é sobre ela, Jennifer Walters e sua Mulher-Hulk, como ela própria faz questão de lembrar.

A primeira temporada de Mulher-Hulk já está disponível completa no Disney+.