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Quais são os prós e contras da quebra de patentes de vacinas contra COVID-19?

Por| Editado por Luciana Zaramela | 10 de Maio de 2021 às 14h10

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BBTree2012/Envato
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Na última semana, o governo dos Estados Unidos anunciou o apoio ao projeto que propõe a quebra de patentes de vacinas contra a COVID-19 na Organização Mundial do Comércio (OMC). Países emergentes, como a Índia e a África do Sul, lideram iniciativas para a suspensão da propriedade intelectual dos imunizantes contra o coronavírus SARS-CoV-2. O objetivo é ampliar as doses de vacinas disponibilizadas no mundo contra a pandemia, mas seria tão simples assim resolver esta equação?

Independente de qual for a decisão, a quebra das patentes de vacinas contra a COVID-19 está longe de se tornar uma realidade. Isso porque ela só poderá acontecer caso todos os países da OMC concordem com a medida, o que não é consenso. Para entender quais as questões que estão envolvidas no caso dos imunizantes, listamos os prós e os contras.

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Faltam vacinas contra COVID-19 nos países mais pobres

Até agora, a distribuição de vacinas contra o coronavírus no mundo é desigual, "privilegiando" as economias mais fortes, como os Estados Unidos e o Reino Unido. Na última quinta-feira (6), 44% da população dos EUA e 51% da população britânica já estavam vacinadas contra a COVID-19. Em paralelo, no Brasil, apenas 16,4% dos brasileiros receberem ao menos uma dose na mesma data.

No momento, iniciativas pela distribuição de vacinas de forma mais igualitária existem, mas ainda não alcançam resultados expressivos. É o caso da COVAX Facility, liderada pela Organização mundial da Saúde (OMS).

Preços das doses e a necessidade de vacinar milhões 

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Realmente, as vacinas contra a COVID-19 não custam centenas ou milhares de dólares, como alguns remédios. Por exemplo, um medicamento aprovado — o coquetel de anticorpos REGN-COV2 — pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) contra a doença, dificilmente, poderá ser administrado nos milhares de infectados diariamente no Brasil.

O coquetel é composto por dois fármacos de anticorpos monoclonais, casirivimabe e imdevimabe, desenvolvidos em laboratório pela empresa farmacêutica Regeneron, dos EUA, em parceria com a companhia Roche, da Suíça. A ideia é que a medicação reduza os riscos de piora do quadro de pacientes do coronavírus, mas valor do tratamento é estimado entre R$ 15 mil e R$ 25 mil.

Por outro lado, o preço das vacinas é mais acessível. Por exemplo, o preço por dose do imunizante da Moderna pode variar entre US$ 25 (R$ 134) e US$ 37 (R$ 199), segundo apuração da CNN em março. Atualmente, o Brasil trabalha em acordo de R$ 6,6 bilhões para obter 100 milhões de doses da Pfizer/BioNTech.

Países emergentes não conseguiriam produzir vacinas

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No curto prazo, por exemplo, as farmacêuticas estimam que a quebra de patentes não deve contribuir para o maior acesso aos imunizantes que são produzidos por empresas norte-americanas e europeias. Por exemplo, as vacinas de mRNA (RNA mensageiro) são uma tecnologia nova, complexa e cara, o que dificultaria a capacidade de aprendizado e produção por outros pesquisadores e grupos.

"Acreditamos que isso [a quebra de patentes] não ajudará a fornecer mais vacinas de mRNA ao mundo em 2021 e 2022, que é o momento mais crítico da pandemia", defendeu o CEO da Moderna, Stéphane Bancel. Isso porque "não há fabricação ociosa de mRNA no mundo", completou, em nota.

Para contar esta barreira, os países emergentes precisariam investir grandes quantias na pesquisa, o que deveria levar tempo. Por outro lado, a quebra de patentes pode facilitar a replicação de vacinas que usam tecnologias tradicionais contra a COVID-19, como a Covishield (Oxford/AstraZeneca) ou mesmo a CoronaVac. Inclusive, no caso brasileiro, as duas fórmulas já têm previsão de serem produzidas no país, mas a partir de um acordo comercial para a transferência de tecnologia.

Brasil e o remédio contra AIDS

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Em 2007, o Brasil fez algo similar com a patente do medicamento Efavirenz, produzido pelo laboratório norte-americano Merck Sharp & Dohme, usado no controle do HIV. Na época, o que ocorreu foi o licenciamento compulsório da droga contra a AIDS, que tem como objetivo evitar possíveis abusos cometidos por quem detém a patente, como preços exagerados.

Com a tecnologia brasileira, especialmente com a capacidade de produção do Instituto de Tecnologia em Fármacos (Farmanguinhos/Fiocruz), o Brasil conseguiu produzir o medicamento, de forma mais barata. Em maio de 2018, o Sistema Único de Saúde (SUS) celebrou 11 anos do licenciamento compulsório do Efavirenz e, neste intervalo, produziu 130 milhões de comprimidos. Naquele momento, 55,4 mil pacientes que viviam com a doença no país se beneficiariam da medida.

Atualmente, a droga saiu do protocolo de tratamento do HIV, mas "a sua produção é considerada um marco para a unidade [Farmanguinhos], que demonstrou sua capacidade de desenvolvimento tecnológico, e permitiu ao país negociar preços de outros medicamentos considerados estratégicos", afirmou nota da Fiocruz.

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Desestimulando a inovação em saúde

Por fim, um dos principais argumentos contra a quebra das patentes é de que a manobra desestimularia investimentos na área de inovação em saúde. No caso da pandemia da COVID-19, os laboratórios e farmacêuticas investiram bilhões de reais em pesquisa, estudos e testes e alcançaram resultados sólidos no combate à infecção. Pela primeira vez na história da ciência, tantas vacinas seguras e eficazes foram desenvolvidas em um espaço tão curto de tempo (menos de um ano e meio). Inclusive, estes imunizantes são as principais apostas de governos, em todo o mundo, para que a humanidade supere o vírus.

Agora, é justo que estas empresas se beneficiem do retorno comercial destas quantias bilionárias investidas e que não eram de lucro 100% garantido, já que as fórmulas poderiam falhar. Algumas, é verdade, foram até descontinuadas, após se verificar a incapacidade de proteção contra o coronavírus. Além disso, especialistas apontam que, caso as patentes sejam quebradas, é possível que se crie um precedente perigoso.

Por enquanto, países, entidades internacionais e os próprios laboratórios precisam pensar em formas eficazes de ampliar a distribuição de vacinas contra a COVID-19, permitindo que estas doses cheguem até os países mais pobres, também. Afinal, se há algo indiscutível na questão, é o interesse público no tema em pauta na OMC.

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Fonte: Com informações: The Conversation, G1, CNN e Agência Fiocruz