Minicérebros podem revelar a origem do autismo
Por Fidel Forato • Editado por Luciana Zaramela |
Para investigar as origens do transtorno do espectro autista (TEA) no cérebro humano, pesquisadores do Instituto Federal de Tecnologia de Zurique (ETHZ), na Suíça, e do Instituto de Biotecnologia Molecular (IMBA), na Áustria, usaram células-tronco para criar organoides cerebrais — de forma simples, minicérebros.
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A ideia de criar versões em miniatura de órgãos é relativamente comum na ciência, já que permite o estudo de determinadas doenças diretamente em amostras de tecidos humanos. Por exemplo, esses modelos já foram usados em investigações sobre crises convulsivas e, agora, podem melhorar a compreensão sobre o autismo. É o que aponta pesquisa publicada na revista Nature.
“Nosso modelo oferece uma nova visão para um dos distúrbios mais complexos que afetam o cérebro humano e traz a esperança necessária para novas pesquisas clínicas sobre o autismo”, afirma Jürgen Knoblich, professor do IMBA e um dos autores do estudo, em nota.
Aumento de casos de autismo no mundo
Vale apontar que, no mundo, os diagnósticos de autismo estão aumentando, e entender melhor este transtorno é fundamental para garantir que as pessoas tenham, cada vez mais, qualidade de vida.
Por exemplo, no país, o censo escolar do Brasil identificou um aumento de 280% no número de alunos com TEA em escolas públicas e particulares entre os anos de 2017 e 2021 — em parte, o aumento se deve a uma maior conscientização sobre o quadro, mas não é o único fator envolvido.
O que foi descoberto sobre o autismo com os organoides cerebrais?
Para entender como o autismo se desenvolve, os cientistas criaram uma técnica para rastrear um conjunto completo de genes associados ao transtorno — no momento, o consenso é que 36 genes estão relacionados com o TEA.
O interessante é que cada gene de interesse pode ser examinado dentro de um único organoide no sistema CHOOSE. Dessa forma, foi possível identificar os efeitos dessas mutações no nível celular, além de iniciar o mapeamento de como essas mutações impactam o desenvolvimento do cérebro como um todo.
Entre as descobertas, está o fato de que as alterações genéticas típicas do autismo afetam determinados tipos de células consideradas precursoras neurais, ou seja, as células “fundadoras” e que darão origem aos neurônios. “Isto sugere que ocorrem alterações moleculares numa fase inicial do desenvolvimento do cérebro fetal que, em última análise, levam ao autismo”, pontua Chong Li, estudante do IMBA e outro autor do estudo.
Além disso, “demonstramos que alguns tipos de células são mais suscetíveis do que outros durante o desenvolvimento do cérebro e identificamos as redes mais vulneráveis às mutações do autismo”, acrescenta Li. Agora, em estudos complementares, elas devem ser investigadas de forma mais detalhada, já que podem esconder pistas para novos tratamentos.
Uso de minicérebros é melhor que estudos em animais
Segundo os autores, o uso de organoides humanas em pesquisas que envolvam o cérebro é melhor que os modelos animais — a alternativa mais tradicional, mesmo que limitada. Por exemplo, os processos específicos responsáveis pelo desenvolvimento do córtex cerebral humano são exclusivos do cérebro humano. E quando o foco é o autismo, os genes críticos se desenvolvem justamente no córtex.
A partir desse novo modelo de pesquisa, os cientistas esperam alcançar avanços consideráveis na pesquisa desse transtorno, o que, no futuro, poderá implicar na descoberta de novos tratamentos. Em paralelo, a mesma estratégia pode ser adaptada para estudos de outras doenças.
Fonte: Nature, ETHZ e Jornal da UNESP