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Sagittarius A*: tudo o que sabemos sobre "nosso" buraco negro — até agora

Por| Editado por Rafael Rigues | 13 de Maio de 2022 às 10h25

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EHT Collaboration
EHT Collaboration

A imagem do buraco negro Sagittarius A*, divulgada na quinta-feira (12) pela colaboração Event Horizon Telescope (EHT), nos revela muito sobre o objeto que habita no coração da Via Láctea. Contudo, os astrônomos já suspeitavam de algumas coisas desde o início das investigações na região, em 1933. Confira o que já se sabe sobre ele.

Descoberta do Sagittarius A*

Tudo começou com o nascimento da radioastronomia, em 1933, quando o engenheiro de telecomunicações Karl Jansky (considerado o “pai” desse sub-ramo da astronomia, mesmo não sendo astrônomo) detectou uma emissão misteriosa de rádio na constelação de Sagitário.

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Essa fonte de rádio ficou conhecida como Sagittarius A, mas até então era apenas isso: alguma coisa na região, em direção ao centro da nossa galáxia, estava emitindo rádio. Não se sabia o que poderia ser, mas os astrônomos estavam intrigados.

Observações posteriores foram feitas por Jack Piddington e Harry Minnett usando o radiotelescópio CSIRO no Potts Hill Reservoir, Austrália. Eles refinaram a descoberta de Jansky e descobriram haver algo "brilhante" em ondas de rádio mais ao sul, mais próximo do centro galáctico.

Conforme a tecnologia dos radiotelescópios evoluiu, as observações se tornaram mais detalhadas, e os cientistas perceberam que Sagittarius A, na verdade, consiste em vários subcomponentes. Em 1974, os astrônomos Bruce Balick e Robert Brown observaram um desses componentes, brilhante e muito compacto — assim foi descoberto o Sagittarius A*.

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Abreviado como Sgr A*, o nome foi cunhado por Brown em um artigo de 1982 para destacar que a fonte de rádio estava em estado excitado (os asteriscos são usados por químicos para indicar átomos excitados, isto é, em um estado mais energético que seu estado fundamental).

Massa e tamanho do buraco negro Sgr A*

Na década de 1980, a hipótese de se tratar de um buraco negro já estava bastante popular no meio científico, mas foi só em 1994 que estudos de espectroscopia infravermelha e submilimétrica mostraram que a massa de Sgr A* correspondia ao que os físicos e astrônomos chamam de buraco negro supermassivo: algo em torno de 3 milhões de sóis.

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Por fim, em 2002, uma equipe internacional mostrou as observações do movimento da estrela S2 (e outras estrelas próximas, conhecidas como estrelas S) perto do Sgr A*, acompanhado durante um período de dez anos. A órbita rápida dessas estrelas foi uma forte evidência da presença de um objeto muito massivo no ponto central da galáxia.

Além disso, essas pesquisas mostraram que o Sagittarius A* não poderia ser um aglomerado de estrelas, por exemplo, e sim um objeto único. As observações de rádio e o movimento da S2 ajudou a equipe a determinar que a massa do objeto central seria de aproximadamente 4,1 milhões de massas solares.

Essa massa estonteante está confinada em um objeto com cerca de 6,7 bilhões de km de raio, o que corresponde às previsões teóricas de Karl Schwarzschild. Essas previsões demonstram como calcular o raio de um buraco negro baseado em sua massa, ou vice-versa.

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Medições ainda seriam refinadas mais tarde, principalmente em um monitoramento de 16 anos conduzido por Reinhard Genzel e Andrea Ghez, que já investigavam o Sgr A* por décadas. A massa do objeto foi estimada em cerca de 4,31 milhões de massas solares. Esse trabalho foi a maior evidência da existência do buraco negro até então e rendeu à dupla o Prêmio Nobel da física em 2020.

O Sgr A* está “adormecido” (mas não por completo)

Ao contrário de buracos negros em centros galácticos ativos, como é o caso do M87* (o primeiro buraco negro a ser fotografado na história), o Sgr A* é bastante quieto. Isso significa que ele não está se alimentando de muita matéria e, por isso, o brilho de seu disco de acreção (o anel laranja que observamos nas imagens) é muito fraco.

Mesmo assim, o buraco negro da nossa galáxia às vezes se alimenta — e dá claros sinais disso. Em 2015, por exemplo, a NASA relatou uma explosão de raios-X 400 vezes mais brilhante do que o normal no Sgr A*. Isso é uma evidência de que algum objeto caiu em seu disco de acreção.

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Embora seja um recorde para ele, esse brilho corresponde a um objeto pequeno, como um asteroide, caindo no buraco negro. Em centros galácticos muito ativos, como quasares, os buracos negros supermassivos se alimentam de objetos maiores, como nuvens imensas de gás e poeira, ou mesmo estrelas.

Já em 2019, astrônomos usando o Observatório Keck observaram um brilho inesperado no Sgr A*, 75 vezes acima do normal. Isso é indício de que outro objeto teve o “azar” de cair na besta adormecida no centro de nossa galáxia. Segundo estudos recentes, a atividade deste buraco negro é caótica e irregular.

Será que o buraco negro pode engolir a Terra?

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Pode ficar tranquilo. Embora o monstruoso buraco negro tenha massa de 4,31 milhões de sóis, não há nenhuma chance de ameaçar a Terra. Na verdade, ele não capturou nem mesmo as estrelas S, as mais próximas do centro galáctico.

A distância entre o Sistema Solar e o Sagittarius A* é de incríveis 26 mil anos-luz. Isso tem outra implicação impressionante: a “luz” (ondas de rádio e raios-X) que os astrônomos capturam do buraco negro leva 26 mil de anos para chegar até nós. Ou seja, estamos vendo como ele era naquela época.

O poder gravitacional de um buraco negro é impressionante, mas não o suficiente para engolir matéria relativamente distante. Para termos uma ideia, ainda que o Sol se tornasse um buraco negro, ele não conseguiria engolir os planetas, nem mesmo o mais próximo, Mercúrio. Ele só poderia se alimentar de asteroides e cometas que, às vezes, caíssem em direção a ele.

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Isso revela que os buracos negros não são “aspiradores cósmicos”, como às vezes imaginamos. Eles são apenas objetos que se tornaram compactos demais e, portanto, densos o suficiente para “segurar” gravitacionalmente coisas que atravessam o horizonte de eventos.

Para chegar ao horizonte de eventos do buraco negro, entretanto, será preciso se aproximar muito mais que as estrelas S, que estão “ali do ladinho” do Sgr A*. É por isso que ele é um buraco negro inativo — nada se aproximou muito dele nos últimos tempos. E a Terra ainda continuará ao redor do Sol por muito tempo.

A imagem do Sagittarius A*

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Até pouco tempo, um debate ainda permanecia entre alguns cientistas: será que o Sagittarius A* é mesmo um buraco negro? Artigos já sugeriram outras propostas, como a possibilidade de se tratar, na verdade, de matéria escura.

Com a imagem divulgada pelo EHT, qualquer dúvida parece ter sido enterrada de uma vez. O anel fechado do disco de acreção com lente gravitacional — ambos previstos com precisão pela Relatividade Geral de Albert Einstein — é evidência mais que forte de que se trata realmente de um buraco negro.

Muitas outras imagens foram capturadas pelo EHT durante a observação do Sgr A*, realizada em 2017. Esse conjunto mostra que o disco de acreção gira ao redor do objeto em velocidade próxima à da luz e é bastante turbulento.

Há muito mais para se descobrir sobre o Sagittarius A* e buracos negros em geral, inclusive os maiores mistérios da física atual: como buracos negros supermassivos formaram? O que acontece dentro deles? Para onde vai a informação da matéria que cai no horizonte de eventos? Essas questões ainda estão em aberto e podem ser resolvidas nos próximos anos ou décadas.

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Fonte: CSIRO, IOPscienceAstronomical Notes, The Astrophysical Journal, ESO