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Inovação brasileira está no caminho certo? Startup Summit faz raio-x do setor

Por| Editado por Claudio Yuge | 25 de Outubro de 2021 às 15h30

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Márcio Padrão/Canaltech
Márcio Padrão/Canaltech

Já se tornou um clichê dizer que o ecossistema brasileiro de startups vai muito bem, obrigado, mesmo com a instabilidade causada pela pandemia de covid. Na verdade isso até ajudou muitos negócios do tipo, pois eles contribuíram para acelerar a transformação digital no setor corporativo. Mas se ainda era preciso um grande evento presencial para sacralizar esse lugar comum, a quarta edição do Startup Summit, que ocorreu nos dias 14 e 15 de outubro em Florianópolis, cumpriu bem esse papel.

A conferência, que acontece anualmente sob o comando do Sebrae nacional, teve em 2020 uma edição apenas online, mas neste ano, com o avanço da vacinação contra covid no país, optou-se pelo formato híbrido, com os 60 palestrantes falando tanto para o público presente — cerca de 1.000 pessoas no Centro Sul, centro de convenções da capital catarinense — quanto em transmissões em vídeo no site do evento. Temas como captação de vendas, investimentos, inovação aberta e diversidade deram a tônica das discussões, além da apresentação de vários cases de sucesso.

A opção de sediar o Startup Summit em Florianópolis coincide com o fato de a cidade estar cada vez mais interessada em se tornar um pólo tecnológico brasileiro. Lá funciona uma rede de inovação mantida pela prefeitura em parceria com a Associação Catarinense de Tecnologia (Acate), que já tem quatro centros em desenvolvimento. Um dos mais adiantados é o Sapiens Parque, no norte da ilha, que acolhe projetos de hardware, energia sustentável e outros. O investimento total previsto para a estrutura e projetos do Sapiens é de R$ 2,4 bilhões em 20 anos.

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Setor pouco explorado no restante do ecossistema brasileiro, o hardware de fato pode ser um dos trunfos das startups catarinenses. Tanto que dede 2015 atua na ilha a Darwin Startups, uma das aceleradoras que focam nesse nicho. Ela acumula 100 empresas no portfólio, mas como em boa parte do mercado, sua aposta maior está nas fintechs; abriga 40 delas. Seu fundador, Marcos Mueller, usa o termo de forma abrangente. "Uma empresa de compra de ingressos, por exemplo, que tenha um módulo de financiamento para quem não tem dinheiro para comprar aquele ingresso. Na minha visão, é uma aplicação da lógica financeira para dentro de uma empresa de tecnologia, uma 'fintechzação' do mercado", define.

O Mercado Bitcoin, que neste ano tornou-se o primeiro unicórnio (startup com valor acima de US$ 1 bilhão) da América Latina com foco exclusivo em criptomoedas, é um dos melhores exemplos nacionais do sucesso das fintechs. Ao Canaltech, o cofundador e conselheiro da empresa, Gustavo Chamati, disse no evento que está otimista com o setor. Segundo ele, nem mesmo a recente prisão de um fraudador de ativos digitais no Rio de Janeiro chegou a causar uma grande queda de confiança nesse tipo de investimento, mas admite que o brasileiro médio ainda tem muito a aprender sobre Bitcoin e afins.

"Estamos no mercado como pioneiro, criando e obedecendo a regulação local. Isso [a prisão do fraudador] cria uma visão muito ruim para quem está trabalhando a sério [neste mercado]. Enxergamos no fundo que precisamos não só falar mais sobre a tecnologia de Bitcoin, mas principalmente ensinar aos nossos clientes, na nossa comunicação a identificar esses golpes e potenciais promessas de retorno fácil. Essa credibilidade acontece ao longo do tempo", afirma.

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Presença digital x momento econômico

Outra tendência celebrada no Startup Summit é a valorização adquirida pelas plataformas de e-commerce, já que muitos empreendimentos comerciais precisaram migrar para o online na pandemia. Saulo Marti, diretor de marketing da Olist — uma das maiores plataformas do gênero que ajuda lojistas a terem bons resultados em marketplaces como Magazine Luiza, Amazon e outros — falou sobre os desafios de crescimento de uma startup do estágio inicial (seed) ao avançado (Série D). Para ele, apesar do salto das vendas online, a experiência de compra presencial ainda será necessária em alguns casos.

"Nunca mais teremos um varejo que é primordialmente físico. Ele vai ser cada vez mais uma presença digital e física, tudo interligado. Tem mais gente vendendo, e vender online é mais barato para a maior parte dos varejistas. Então o físico ficará como parte de experiência." Ele cita como exemplos de retorno ao físico categorias de produtos como brinquedos, artigos de esporte e lazer. "O setor de livros me surpreendeu. Eu achava que seria 100% digital, mas acho que muita gente ainda gosta de ir à livraria para encontrar um livro. Tudo aquilo que demanda a experiência do tipo 'deixa eu ir e descobrir' vai acontecer ainda no físico", diz Marti.

E o interessante é que o setor deverá resistir bem tanto à atual crise econômica quanto à instabilidade política trazida tanto pelo atual governo quanto pela iminência das eleições presidenciais de 2022. Pelo menos essa é a previsão de outro celebrado palestrante do evento, Alfredo Soares, vice-presidente da VTEX, uma das líderes do setor para marketplaces que se tornou unicórnio em 2020. "Tem pouca intervenção política ainda na maturidade da aceleração do e-commerce. E hoje, mesmo com a economia do jeito que está, as empresas digitais estão valorizadas e capitalizadas, com poder de audiência e de mídia. Isso empodera essas empresas a não dependerem da política para crescer. Então eu não acredito que ano que vem vai ter algum desafio por conta dessa desse momento que o país vai viver", diz Soares, autor dos livros "Bora Vender" e "Bora Varejo".

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A presença digital foi importante também para a educação, com mais aulas acontecendo por videoconferências e outros tipos de ferramentas em nuvem. Janguiê Diniz, fundador do Ser Educacional, um dos maiores grupos privados da área no país, já tinha bastante experiência no ensino presencial, por ser o criador da faculdade Uninassau, no Recife, além de outras como Univeritas (Rio de Janeiro) e Uninorte (Manaus). Mas com a pandemia, precisou repensar todo o negócio para funcionar na web, comprando edtechs como Gokursos e Prova Fácil e lançando a Pós Uninassau Digital, iniciativa de programas de especialização totalmente online.

Para ele, os gestores públicos brasileiros não investem mais no combo educação-tecnologia não por falta de dinheiro, mas por não terem "cabeça empreendedora". "Vejo estados pequenos aí que não tem tanto dinheiro quanto os grandes e que realmente implantaram essa cultura, como a Paraíba. Mas há vontade nos gestores ao nível nacional. Em vez de estarem se preocupando em cuidar da situação do país, da população, da educação, da saúde, se preocupam com debates políticos e com a nova eleição. A nível nacional, que exemplo a gente tem? Quanto mais ao nível local", lamenta.

Respiro de alívio

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Natalia Bertussi, coordenadora nacional de startups do Sebrae, vem acompanhando o setor há sete anos e pôde respirar aliviada com os bons ventos, que permitiram tanto o retorno do Startup Summit ao presencial quanto o crescimento econômico das empresas. Segundo a consultoria Distrito, as startups brasileiras receberam mais de US$ 622 milhões (R$ 3,2 trilhões) de grandes empresas, mais do que o triplo dos aportes de 2020.

"As empresas tradicionais elas entraram numa crise muito grande em decorrência da pandemia, por todos os motivos que a gente já conhece. E para sobreviver a essa crise, elas tiveram que inovar. E para inovar, muitas vezes as startups ajudaram e foram o suporte para isso. Soluções para varejo e delivery tiveram um boom enorme. As de educação teve que se reinventar. No último ano e meio, apesar de ter sido ruim para a economia de forma geral, para as startups foi bem positivo", festeja.

Na sua visão, isso é resultado do amadurecimento do ecossistema de startups, na comparação com o passado. O próximo passo seria apostar mais no interior do Brasil. "Por exemplo, o governo e as universidades ainda não olhavam tanto para startups. Nós não tínhamos tantos fundos de investimento como temos hoje. Era um campo totalmente árido, inclusive para nós [do Sebrae]. Agora vejo que há sistemas muito maduros como aqui em Santa Catarina, São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais. Mas ainda tem a interiorização, que é um maior gargalo. Então eu diria que as dores são as mesmas, mas mudaram de localidades", conclui.

* O repórter viajou para Florianópolis a convite do Sebrae Nacional para a cobertura do Startup Summit 2021