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Esqueça o "PC barato": visitamos a fábrica da Positivo e a realidade surpreende

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Jones Oliveira/Canaltech
Jones Oliveira/Canaltech

A Positivo Tecnologia abriu suas fábricas em Manaus, Amazonas, pela primeira vez à imprensa e mostrou uma operação que vai muito além da simples montagem de computadores. Em um momento marcado pela transição para o Windows 11 e pela chegada da inteligência artificial aos PCs, a companhia brasileira aposta em uma estratégia tripla: diversificação de portfólio, verticalização da produção e democratização do acesso à tecnologia para manter se manter no topo do segmento de notebooks até R$ 2.500 no Brasil.

Durante visita às plantas industriais do Polo Industrial de Manaus (PIM), que correspondem a 80% de toda a produção fabril da corporação, ficou evidente que a Positivo não quer mais ser vista apenas como "fabricante de computadores baratos". Com quase 42 mil metros quadrados de área fabril, duas unidades fabris e cerca de 1.300 colaboradores, a Positivo produz desde placas-mãe e baterias para laptops, celulares e urnas eletrônicas até maquininhas inteligentes de pagamento, passando por notebooks e tablets de marca própria e da VAIO.

A transformação é tão profunda que a própria mudança de nomede Positivo Informática para Positivo Tecnologiajá não dá conta de descrever o novo momento da companhia. “A Positivo está diversificando. Começou há muito tempo e tem consolidado cada vez mais essa diversificação”, afirma Edson Toffoli, Diretor Industrial da Positivo em Manaus. “Do ponto de vista industrial, isso aumenta e torna a visão mais ampla”.

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Verticalização como estratégia de sobrevivência

Além de reduzir custos, a decisão de verticalizar a produção em Manaus é uma estratégia de sobrevivência em um mercado cada vez mais competitivo. Enquanto parte dos componentes utilizados nas linhas de montagem ainda são importados de parceiros da China, incluindo carcaças de plástico injetado, displays LCD e teclados, a Positivo tem concentrado esforços em fabricar internamente os componentes que realmente fazem diferença para o negócio.

A fabricação de placas-mãe e baterias na Boreo Componentes, subsidiária da Positivo dedicada exclusivamente a componentes eletrônicos, é o exemplo mais claro dessa filosofia. 

“Não justifica eu abrir aqui uma fábrica de displays LCD, por exemplo, pois esses componentes têm fabricação totalmente automatizada, com máquinas caras e que não abrem postos de emprego, além de não se aproveitar de nenhum incentivo fiscal.  Para nós, faz muito mais sentido fabricar nossas placas-mãe aqui mesmo. Nós importamos o PCB e componentes menores como portas USB, HDMI e afins da China, mas todo o trabalho de montagem, soldagem e fabricação é feito aqui, por centenas de pessoas”, explica Toffoli.

A verticalização também se manifesta no desenvolvimento de maquinário próprio, que dispensa contratos de manutenção e permite à empresa maior autonomia. Durante o tour pela fábrica, dois robôs chamaram atenção: desenvolvidos internamente do zero, eles realizam tarefas de parafusamento e testes automatizados que antes eram feitas manualmente.

Segundo Toffoli, essa abordagem traz vantagens que vão além da economia. “O equipamento que eu adquiro da China, eu preciso de um contrato de manutenção com alguém. Com esse, eu não tenho contrato de manutenção. O contrato de manutenção é comigo mesmo”, afirma. 

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Além disso, o desenvolvimento interno acelera a curva de aprendizado das equipes. “Muitas dessas pessoas chegam aqui sem nenhum conhecimento de eletrônica, e a gente treina do zero, qualifica a mão de obra, oferece a oportunidade”.

Diversificação para reduzir dependência

Se a verticalização garante autonomia, a diversificação garante estabilidade financeira. A estratégia da Positivo de atuar em múltiplas frentes não é novidade, mas ganhou relevância nos últimos anos como forma de mitigar riscos e aproveitar sinergias entre diferentes segmentos.

Você trabalha com segmentos com rentabilidades distintas, com flutuações distintas, com mercados mais estáveis e outros menos estáveis, e você faz essa composição”. O executivo relembra a crise de 2016, quando o mercado brasileiro de computadores foi reduzido pela metade praticamente da noite para o dia, justamente no momento em que a Positivo transferia sua fábrica para Manaus. “Como é que você faz uma empresa que vendia X, vender X/2 em meses?”.

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A resposta veio na forma de novos mercados. Hoje, a Positivo fabrica maquininhas inteligentes de pagamento — sim, aquelas encontradas em lojas por todo o Brasil —, além de notebooks e tablets das marcas Positivo e VAIO, smartphones e, mais recentemente, servidores de alta performance para data centers de inteligência artificial. 

A expectativa é que, até 2026, a empresa entregue um superservidor de IA a uma empresa brasileira que deverá usar mais de 2 mil chips B200 da NVIDIA, tornando-se um dos maiores da América Latina.

A parceria com a VAIO também ilustra bem a flexibilidade e capacidade técnica da operação brasileira. Há 10 anos, a Positivo fabrica e comercializa produtos da marca no país, cumprindo requisitos de qualidade rigorosos. Mas a relação vai além da simples montagem: engenheiros brasileiros têm liberdade para sugerir projetos de notebooks e tablets “com padrão de qualidade japonês aplicado ao Brasil”, que passam pela validação da VAIO e podem ser produzidos não só aqui, mas também em outras praças mundiais.

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Inteligência artificial como eixo de transformação

A inteligência artificial deixou de ser uma promessa futurista para se tornar o grande catalisador de mudanças na Positivo — tanto nos produtos quanto nos processos industriais. Com o fim do suporte ao Windows 10, a empresa enxerga uma grande janela de oportunidade para consolidar sua posição no mercado brasileiro de notebooks acessíveis.

A recém-lançada linha Vision, primeira do país a vir com minitela integrada, exemplifica essa estratégia. Com etiqueta a partir de R$ 1.800, os modelos trazem a MIA (Minha Integração Artificial), assistente pessoal baseada em IA já integrada nativamente ao sistema.

“O objetivo é oferecer modelos acessíveis e com bom custo-benefício para 90 e tantos por cento da população que não teve contato com IA até agora começar a fazer as perguntas e receber respostas de uma forma mais prática”, disse o vice-presidente de Negócios e Mobilidade da Positivo, Norberto Maraschin Filho, em entrevista ao Canaltech durante lançamento dos novos modelos.
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Mas a IA não está presente apenas nos produtos finais. Na fábrica de Manaus, a tecnologia está sendo implementada para otimizar processos, estabelecer novos padrões e extrair insights de dados. “Hoje já existem soluções na fábrica que têm IA, principalmente em equipamentos que se corrigem sozinhos graças à IA”, revela Toffoli. 

“Além disso, a gente consegue tirar insights da enorme quantidade de dados que são gerados pela fábrica, para otimizar as esteiras de produção, novos sistemas de fábrica… Tudo sem precisar de um dinheiro absurdo para processar esses dados”.

A implementação, porém, não aconteceu da noite para o dia. Segundo o diretor industrial, foi necessário primeiro modernizar toda a infraestrutura de TI da fábrica. “A gente começou a tentar trazer soluções de inteligência artificial e de machine machine learning, mas o nosso backbone principal, a nossa coluna vertebral do sistema era muito antiga”, explica. “Então, a primeira coisa que a gente fez foi reconhecer que não adiantava ficar pendurando um monte de coisa sem trocar o backbone”.

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Agora, com o novo sistema implementado, as máquinas estão conectadas e coletando dados constantemente. 

“Sempre houve um volume muito grande de dados sendo gerados na fábrica, mas todos tinham de ser parametrizados e ter uma regra bem definida para extrair exatamente o que eu queria de informação. Com a IA, ficou muito mais fácil tirar insights daquilo tudo”, pontua Toffoli.

Inovação para formar mão de obra qualificada

Um dos maiores desafios da indústria brasileira de tecnologia é a carência de profissionais qualificados — e a Positivo encontrou na inovação uma forma de contornar essa dificuldade. Em vez de buscar no mercado pessoas com experiência pronta, a empresa aposta na formação interna de talentos.

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“A estratégia para a tecnologia é a mesma estratégia para a formação de profissionais. A gente está seguindo a mesma esteira, que é trazer pessoas sem experiência”, afirma Toffoli. “Todos os talentos precisam ser formados aqui dentro. Então, isso é uma das coisas que a gente já aprendeu”.

A abordagem tem funcionado. Os robôs colaborativos que hoje operam na linha de produção, por exemplo, são mantidos por técnicos que nunca haviam visto equipamentos similares antes de serem treinados pela empresa. “Os meninos que estão dando manutenção, nunca tinham visto um robô. Agora eles estão aqui aprendendo. A gente está aprendendo junto”, conta o executivo.

Essa filosofia de desenvolvimento interno se estende aos próprios equipamentos. Ao desenvolver maquinário do zero, a Positivo não só economiza em contratos de manutenção como também qualifica seus profissionais de forma mais profunda. “Quando eu construo [o maquinário] do zero, quanto eu não consigo passar para o pessoal lá embaixo? Qual que é o meu nível de conhecimento do equipamento que eu desenvolvo frente ao equipamento que eu compro?”

A empresa conta com o apoio de institutos de pesquisa da região, aproveitando os incentivos do Polo Industrial de Manaus para investimentos em Pesquisa e Desenvolvimento. 

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“Alguns institutos de pesquisa aqui na região têm nos ajudado nos projetos mais complexos”, destaca Toffoli. “Esses institutos estão aqui dentro nos ajudando a formar um ciclo para ter esses profissionais”.

Acessibilidade como missão inabalável

Em meio a tanta tecnologia e inovação, o que realmente diferencia a Positivo de outras fabricantes é algo mais simples — e mais difícil de executar: a obsessão pela acessibilidade. Enquanto concorrentes aproveitam o momento de transição para o Windows 11 e a chegada da IA para elevar preços e vender máquinas que partem de R$ 7 mil, a Positivo mantém o foco em seu público histórico.

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“A nossa missão é melhorar a vida das pessoas com o uso da tecnologia de maneira acessível. Se ela não for acessível, a gente não está cumprindo a nossa missão”, afirma categoricamente Toffoli.

Essa mentalidade permeia todas as decisões da companhia, da estratégia de verticalização à escolha de quais equipamentos desenvolver internamente. 

A linha Vision com minitela, lançada por a partir de R$ 1.800, cristaliza essa abordagem. Ao trazer recursos de máquinas high-end para modelos mais acessíveis, a Positivo democratiza o acesso a tecnologias que até então eram exclusivas de equipamentos premium. É a primeira linha de notebooks com minitela integrada comercializada no Brasil, desenvolvida inteiramente "dentro de casa", como faz questão de destacar Toffoli.

Mesmo permitindo upgrades de hardware — os modelos mais avançados podem ter até 64 GB de RAM e 4 TB de SSD —, a empresa mantém os preços competitivos. “Nos notebooks com Intel Core e AMD Ryzen, a gente entende que seria uma sacanagem não permitir o upgrade", afirmou Norberto Maraschin sobre a decisão de manter essa possibilidade, algo cada vez mais raro no mercado.

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Desafio de mudar percepções

Para uma empresa que domina o segmento de notebooks até R$ 2.500 no Brasil, a Positivo enfrenta um desafio tão grande quanto sua operação industrial: mudar a percepção de parte do público entusiasta de tecnologia. Historicamente vista como "marca de computador barato", a companhia trabalha para mostrar que acessibilidade não significa falta de qualidade ou inovação.

A aposta em inteligência artificial, tanto nos produtos quanto nos processos fabris, é parte dessa estratégia de reposicionamento. A expectativa é que o segmento de servidores com IA represente pelo menos 10% da receita da companhia em 2025 — algo em torno de R$ 500 milhões —, podendo ultrapassar R$ 1 bilhão por ano nos próximos exercícios.

A diversificação também contribui para esse novo posicionamento. Com a recente aquisição da Algar Tech MSP e a criação da Positivo S+, unidade de serviços gerenciados de TI que já representa 16% da receita, a empresa deixa claro que não quer mais ser vista apenas como fabricante de hardware. São 1,6 milhão de maquininhas inteligentes de pagamento produzidas desde 2017, superservidores para processamento de IA e uma operação industrial com escala e nível tecnológico impressionantes.

Enquanto o mercado debate sobre AI PCs que custam a partir de R$ 7.000 e notebooks premium cada vez mais caros, a Positivo Tecnologia segue na contramão, apostando que o futuro da tecnologia no Brasil passa pela democratização do acesso e provando que essa visão pode ser lucrativa e sustentável.

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