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Satélites Starlink passarão por mudanças para que não prejudiquem a astronomia

Por| 07 de Maio de 2020 às 07h48

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Ricky Situ
Ricky Situ
Tudo sobre SpaceX

Segundo o NY Times, alguns astrônomos estão otimistas quanto às últimas novidades divulgadas pela SpaceX sobre a questão da reflexividade dos satélites Starlink, que começaram a atrapalhar observações do céu noturno desde seu segundo lançamento, no final ano passado. Na verdade, antes mesmo disso, quando a empresa lançou o primeiro lote com 60 unidades em maio de 2019, a comunidade científica já expressava preocupações — com razão. Com tanta razão que, em fevereiro de 2020, a União Astronômica Internacional se envolveu na história, prevendo que as observações astronômicas seriam severamente afetadas se a empresa de Elon Musk não tomasse, logo, uma providência para resolver o problema que já havia começado a causar.

Com a possibilidade de enviar até 42 mil satélites à órbita do planeta, e já causando estrago com pouco mais de 100 unidades lançadas até então, em dezembro a SpaceX disse que revestiria os Starlink com uma cobertura escura, como um teste para descobrir se isso resolveria o problema. Tal teste foi feito em janeiro, quando a empresa lançou um satélite apelidado de DarkSat com esse revestimento especial. Acabou que ele se mostrou, sim, mais escuro, mas não o suficiente para resolver o problema.

Lançamentos com mais 60 unidades em cada voo continuaram a acontecer, e a polêmica continuou rolando também. Em março deste ano, um estudo indicou que os Starlink poderiam prejudicar a busca por asteroides potencialmente perigosos — para piorar ainda mais essa história. Por outro lado, astrofotógrafos e entusiastas da astronomia gostaram da experiência de observar (e fotografar, claro) a passagem dos satélites Starlink acima de suas cabeças, e os brasileiros não ficaram de fora, compartilhando nas redes sociais muitas fotos das trilhas deixadas pelos satélites no céu durante exposições de longa duração.

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Agora, a SpaceX parece ainda mais comprometida a botar um ponto final nessa questão. A empresa anunciou (e explicou detalhadamente) uma série de mudanças que aplicará nos próximos satélites Starlink a serem lançados. A ideia é que esse conjunto de novas medidas impeça que "estrelas falsas" apareçam nas observações do céu noturno, atrapalhando o andamento de estudos astronômicos ao redor do mundo.

Que mudanças são essas?

Em comunicado oficial, a SpaceX, antes de qualquer coisa, faz questão de ressaltar que o projeto Starlink tem como objetivo fornecer conectividade banda larga de alta velocidade e baixa latência a todo o planeta, "inclusive a locais onde a internet é tradicionalmente muito cara, pouco confiável ou totalmente indisponível". Mas a empresa também faz questão de dizer: "acreditamos firmemente na importância de um céu noturno natural para todos nós, e é por isso que temos trabalhado com astrônomos em todo o mundo para entender melhor as especificidades de suas observações, bem como alterações de engenharia que podemos fazer para reduzir o brilho dos satélites".

Mea culpa feito, a SpaceX, então, afirma estar trabalhando para alcançar pelo menos dois objetivos principais: tornar os satélites invisíveis a olho nu dentro de uma semana após cada lançamento, e escurecer os satélites para que eles não apareçam nos registros de observatórios espacias — tentando outras técnicas que se mostrem suficientes para tal, já que o teste inicial com o DarkSat não deu lá muito certo.

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Para fazer com que os satélites não sejam mais visíveis a olho nu em até uma semana depois de serem lançados, a empresa conta que a solução pode estar na alteração da maneira como os eles se movem para sua altitude operacional. A ideia é ajustar, por meio de atualizações de software, a orientação dos satélites enquanto buscam atingir essa altitude operacional, fazendo com que seus corpos permaneçam no mesmo plano do vetor de luz — o Sol. "Isso reduzirá a luz refletida na Terra, reduzindo a área da superfície que recebe luz", explica a empresa. O resultado esperado é que os satélites deixem de brilhar no céu noturno que vemos a partir da superfície.

Já para que os Starlink deixem de aparecer em observações astronômicas, a empresa revela planos de adicionar "um visor implantável ao satélite, para impedir que a luz do Sol atinja suas partes mais brilhantes". Esse visor deverá funcionar mais ou menos como um guarda-sol, explicando de maneira bastante genérica, e as antenas dos satélites também receberão revestimentos similares a viseiras para reduzir sua reflexividade. O primeiro teste com esse visor será realizado em uma unidade chamada VisorSat, que faz parte do próximo lançamento, previso para o dia 18 de maio. Confiante de que os resultados serão positivos, a empresa já disse que "no voo de 9 de junho, todos os futuros satélites Starlink terão esses visores".

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Observatórios gigantes ainda podem ser prejudicados

Observatórios da nova geração, muito maiores e mais sensíveis que os atuais, ainda podem ter seus estudos prejudicados, mesmo se as medidas citadas acima forem um sucesso. É o caso do Observatório Vera C. Rubin, anteriormente chamado LSST (Large Synoptic Survey Telescope), que deve ser inaugurado entre 2022 e 2023 no Chile.

Este observatório vem sendo apontado como o próximo a revolucionar nosso entendimento do universo, pois, além de estudar a matéria escura, também será capaz de observar pequenos objetos pelo Sistema Solar, como asteroides, cometas e até mesmo rochas além da órbita de Netuno, com detalhes sem precedentes. Ele será tão poderoso que poderá detectar um objeto espacial do tamanho de uma bola de golfe a uma distância equivalente à da Lua, para se ter uma ideia de sua sensibilidade. Ou seja: mesmo contando com "truques" para passarem despercebidos no céu a olho nu e para a maioria dos telescópios, os satélites de Elon Musk acabarão aparecendo nas varreduras de observatórios extremamente sensíveis como o Vera C. Rubin, projetados justamente para "enxergar" objetos pequenos e fracos por aí.

Espera-se que ele aumente em pelo menos dez vezes a quantidade de pequenos objetos espaciais que conhecemos, e melhore em até cem vezes as medições que atualmente temos da posição de todos os corpos do tipo já catalogados. Isso tudo será possível graças a um enorme campo de visão — algo equivalente a um círculo com diâmetro sete vezes maior do que a Lua cheia. Além disso, este observatório mapeará todo o céu a cada três dias e, portanto, qualquer interferência da passagem de satélites Starlink será extremamente prejudicial.

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A SpaceX se mostra preocupada com mais esse problema e, no mesmo comunicado oficial, explica que vem trabalhando lado a lado com cientistas envolvidos com o Observatório Vera C. Rubin para compreender, em primeiro lugar, como seus sensores astronômicos funcionarão. A empresa declarou ter tomado ciência de que mesmo uma fonte de luz muito pequena, porém brilhante, poderá impactar essas observações e, "embora não seja possível criar satélites invisíveis aos equipamentos ópticos mais avançados", está "comprometida em tornar futuros projetos de satélites o mais escuro possível".

Enquanto isso, cientistas também atuam do outro lado, buscando soluções para contornar o problema sem depender da SpaceX para isso. Anthony Tyson, cientista chefe do Observatório Vera C. Rubin, contou ao NY Times que ele e seus colegas criaram um algoritmo para tirar os "fantasmas" dos satélites nas observações, só que essa técnica só se mostrou eficaz para satélites mais fracos — o que não é o caso dos Starlink atuais. Contudo, se a SpaceX tiver sucesso em seus novos planos de reduzir a reflexividade dos satélites que lançará a partir de junho, pode ser que o algoritmo criado pelo time de Tyson seja suficiente para mitigar o problema. O NY Times revelou que Tyson está "cautelosamente otimista de que a interferência dos satélites Starlink se tornará um fantasma do passado". E esperamos que isso realmente aconteça.

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Fonte: SpaceX, NY Times