25 filmes indispensáveis para quem quer aprender cinema
Por Sihan Felix | •
Aprender cinema é tão subjetivo quanto as diferentes percepções sobre os filmes. Mas existem caminhos e, um deles, é por meio de filmes históricos e através daqueles que criaram, fundamentaram ou desenvolveram a linguagem. O cinema, sendo uma arte tão nova (com pouco mais de 100 anos de idade), tem uma trajetória cheia evoluções, modificações, revisões... então, quanto mais assistimos mais podemos perceber os caminhos percorridos, o que permite a construção de um novo olhar, talvez até de um olhar próprio. Pensando nisso, vamos à nossa lista de 25 (que poderia ser de 30, 40, 50 ou muito mais) filmes indispensáveis para quem quer aprender cinema (em ordem cronológica):
25. A Chegada do Trem à Estação
Para os irmãos Auguste e Louis Lumière, o cinema era ciência. Eles eram inventores, não viam o potencial artístico do que haviam criado, mas já estavam no caminho sem volta do cinema (tema abordado na terceira parte do nosso especial Entenda o cinema a fundo) ao permitirem que A Chegada do Trem à Estação fosse, também, entretenimento. A primeira exibição pública (que contava com outras filmagens dos irmãos), reza a história, fez muitos espectadores saírem da frente da tela. Eles acreditavam que o trem poderia atropelá-los. Em 2011, Martin Scorsese simulou esse efeito em seu filme A Invenção de Hugo Cabret, mas só voltando ao final do século XIX para ter a mesma sensação.
24. A Fada do Repolho
Muito provavelmente, o primeiro filme narrativo, não-científico, da história. Realizado pela francesa Alice Guy Blaché, é baseado em uma lenda sobre os meninos nascerem de repolhos azuis e meninas das rosas.
23. Viagem à Lua
Esse filme está na lista tanto pela inventividade de Georges Méliès ao criar a primeira ficção científica da história quanto pela sua dedicação na pintura de frames, gerando, assim, o primeiro filme a cores. Esse último ponto foi descoberto em 2002 (um século depois), sendo restaurado dessa forma e apresentado pela primeira vez ao público em 2003, no festival de cinema mudo italiano Le Giornate del Cinema Muto.
22. O Nascimento De Uma Nação
Com mais de três horas de duração, o filme é creditado por garantir o futuro dos longas-metragens, em uma época na qual a maioria dos filmes não passavam de 20 minutos de duração. Além disso, solidificou símbolos da linguagem cinematográfica, muitos que permanecem até hoje. Por outro lado, marca a história também negativamente pelo seu teor altamente racista e trazer a Ku Klux Klan como uma força heroica – algo que faria seu criador, D. W. Griffith, criar um segundo filme monumental já no ano seguinte, chamado Intolerância.
21. O Gabinete do Dr. Caligari
Até hoje, O Gabinete do Dr. Caligari é uma das mais importantes referências estéticas do cinema. Considerado uma das grandes obras (provavelmente a maior) do expressionismo alemão, o filme de Robert Wiene é uma metáfora do olhar deformado sobre o mundo. Com ruas estreitas, telhados cubistas e muitos detalhes disformes, o filme influenciou e influencia muito do que ainda vemos ainda hoje e levaria o expressionismo a culminar em obras como Nosferatu (de F. W. Murnau, 1920).
20. O Encouraçado Potemkin
Um marco no que diz respeito à montagem, O Encouraçado Potemkin é a sedimentação do pensamento de Sergei M. Eisenstein (seu realizador) de que a edição poderia ir muito mais além do que contar uma história. A montagem, para o russo, poderia ser utilizada para manipular as emoções do espectador e criar metáforas.
19. O Cantor de Jazz
O primeiro filme falado já era um musical. Ainda em um período de racismo descarado, O Cantor de Jazz trazia, como O Nascimento de uma Nação, atores brancos pintados de preto (blackface) – algo que é centro de debates por não conter as apologias do filme de Griffith e, segundo o pesquisador Cory Willis (em Style And Meaning: Studies In The Detailed Analysis Of Film), o blackface, aqui, é “uma exploração artística e expressiva da noção de duplicidade e hibridismo étnico dentro do que pode ser chamado identidade norte-americana”.
18. Um Homem Com Uma Câmera
Considerado por muitos como o precursor dos documentários, o filme documenta a vida dos habitantes de uma cidade através do olho de uma câmera. Assim, os personagens são as máquinas e as pessoas comuns, com a imagem seguindo movimentos em variadas situações.
17. Branca de Neve e Os Sete Anões
Historicamente importante por ser considerado o primeiro filme totalmente a cores no mundo (para além das técnicas de colorização já existentes na época), o primeiro a ser produzido por Walt Disney, além de, posteriormente, ser considerado o primeiro dos Clássicos Disney. Por muito tempo, inclusive, pensava-se ser, ainda, a primeira animação em longa-metragem, até a descoberta de El Apóstol (O Apóstolo em tradução livre), filme argentino datado de 1917 que estaria na lista se existisse alguma cópia dele na atualidade. A sátira política de Quirino Cristiani foi, em grande parte, perdida durante um incêndio em 1926, restando somente algumas imagens.
16. Fantasia
Se a música no início cinema poderia ser usada para abafar o barulho do cinematógrafo, como distração ou sem intenções artísticas, em Fantasia ela é o elemento principal. Enquanto as animações, normalmente, têm suas trilhas sonoras desenvolvidas após o visual estar pronto, aqui existe o inverso: os desenhistas criam a partir das músicas e, assim, fazem um espetáculo visual.
15. Cidadão Kane
Cidadão Kane é um dos representantes (talvez o mais forte e influente) da passagem do cinema clássico para o cinema moderno. Muito pelo domínio de Orson Welles para consolidar uma crescente evolução do cinema. Nesse sentido, a estrutura técnica do filme fala tanto quanto os diálogos.
14. Ladrões de Bicicletas
Muito provavelmente o auge do neorrealismo italiano, é um dos filmes que mais efetivamente expõe a onipresença infantil para reproduzir uma certa inocência em sua análise social crua, sem a censura analítica dos adultos. Assim, mostra-se a realidade sem disfarçá-la, inclusive com cenários naturais e atores amadores. O neorrealismo aproxima-se, em alguma medida, das características de um documentário.
13. Rashomon
Utilizando uma estrutura de narrativa não convencional, Akira Kurosawa sugere a impossibilidade de obter a verdade sobre um evento quando há conflitos de pontos de vista. A partir do filme, Rashomon acabou se tornando um nome utilizado em situações nas quais a verdade é difícil de ser verificada por causa de depoimentos conflitantes de testemunhas diferentes. O filme, inclusive, emprestou seu nome à psicologia, ao batizado Efeito Rashomon.
12. Um Corpo que Cai
Há muitos motivos para Vertigo (no original) estar na lista, seja pelo controle absoluto de Alfred Hitchcock sobre a história, seja pela utilização de uma linguagem de suspense que ele sedimentaria durante a carreira, seja pela sua invencionice estética, praticamente tudo no filme serve de referência para se entender e se fazer cinema. Foi a primeira obra, por exemplo, a utilizar o Dolly Zoom, um efeito de câmera que distorce a perspectiva para criar desorientação. Esse efeito consiste no zoom da câmera enquanto ela (a câmera) se afasta do objeto – ou vice-versa. Como resultado do seu uso no filme, o efeito é muitas vezes referido como Efeito Vertigo.
11. Os Incompreendidos
Os Incompreendidos é mais conhecido como o primeiro passo da Nouvelle Vague. Na verdade, existem filmes anteriores a ele dentro do movimento batizado por Françoise Giroud para definir uma geração francesa caracterizada pela liberdade técnica e narrativa. Apesar de não ser o primeiro – posto que talvez seja de La Pointe-Courte (de Agnès Varda, 1955), o filme de François Truffaut teve um impacto praticamente imediato no cinema e popularizou a vanguarda francesa, inspirando não somente os seus, mas muito do que foi realizado no cinema posteriormente – especialmente até os anos 1970.
10. Acossado
É o primeiro longa-metragem de Jean-Luc Godard e um dos que expõem sua maneira de desconstruir o cinema a partir de um roteiro sem estrutura definida. Para Acossado, Godard escrevia as cenas pela manhã e filmava logo. Algumas falas só eram entregues aos atores à medida em que as cenas eram realizadas, resultando em uma forma que parece acompanhar a história nervosa de fuga do protagonista. À Bout de Souffle (o título original) é uma expressão da língua francesa que significa na língua portuguesa (em tradução livre) sem fôlego.
9. 2001: Uma Odisseia no Espaço
Conhecido também pelo seu perfeccionismo, o diretor Stanley Kubrick utilizou todo o seu metodismo para construir cenas que seriam referenciadas em muitas obras que surgiram depois, quase que criando um gênero próprio dentro da ficção científica. Mas o filme também é marcado por uma transição aparentemente simples que, de maneira orgânica e de um simbolismo gigante, pula milhões de anos em apenas poucos segundos.
8. Tubarão
Além de ser a raiz do termo blockbuster, sua música é um marco. Com as trilhas sonoras completamente consolidadas no cinema, John Williams transformou o seu trabalho musical em um personagem. Se o tubarão do título nacional só é visto a partir do terceiro ato, sente-se a presença dele pelo intervalo simples entre duas notas (uma segunda menor na música), criando um simbolismo auditivo que ficaria marcado para sempre como o som desse predador dos mares.
7. Star Wars: Episódio 4 – Uma Nova Esperança
Com o termo blockbuster sedimentado por Tubarão, o primeiro filme da franquia Star Wars não criou somente uma mitologia, mas, na prática, fundou o que viria a ser chamado de filme-evento (termo explorado pelo Universo Cinematográfico Marvel – UCM). A produção de George Lucas renderia, a partir do seu lançamento, um universo expansível e criativo sem precedentes na história do cinema.
6. O Exterminador do Futuro 2: O Julgamento Final
Pela primeira vez, é vista a captura de movimento em um personagem gerado por computador, sendo a primeira vez, também, que o personagem principal é parcialmente produzido por computador. Algo que, anos depois, geraria frutos como Gollum (da trilogia O Senhor dos Anéis – de Peter Jackson) e continuaria evoluindo para Avatar e Projeto Gemini.
5. Cassiopeia
A primeira animação completamente realizada em computador é brasileira, dirigida por Clóvis Vieira. Existe a controvérsia com Toy Story, lançado alguns meses antes, mas o filme da Pixar utilizou moldes de argila para serem escaneados digitalmente (rotoscopia), o que, de fato, não o faz ser 100% digital. Cassiopeia, por sua vez, foi totalmente feito por imagens geradas pela computação gráfica, sem rotoscopia e sem vetorização de modelos reais. Além disso, o filme seria lançado antes de Toy Story, mas problemas de produção impediram o feito, gerando a tal briga de quem foi o primeiro.
4. Festa de Família
Primeiro filme do manifesto Dogma 95, que foi escrito para a criação de um cinema mais realista e menos comercial, Festa de Família foi aclamado em seu lançamento. Os filmes do manifesto seguem 10 regras estipuladas por Thomas Vinterberg (diretor de Festa de Família) e Lars von Trier. Para ter seu filme como parte do Dogma 95, os realizadores devem enviar cópias à entidade que gerencia, submetendo-os a uma avaliação. Caso aprovado e verificado que o voto de castidade (as 10 regras) foi cumprido, os autores recebem o Certificado Dogma 95.
3. Matrix
Matrix foi uma revolução tanto para os filmes de ficção científica quanto para o cinema em si. Para isso, o filme conta com elementos dos mais variados utilizados pelas irmãs Wachowski, com muito do que tiveram contato durante a vida. De religião a artes marciais, de filosofia a mangá, de cyber punk à cultura pop, o filme definiu um novo rumo para o cinema de Hollywood e, por este ser hegemônico, acabou por influenciar o planeta.
2. Dançando no Escuro
O controverso filme de Lars von Trier foi um dos centros dos debates sobre novas tecnologias no cinema durante o Festival de Cannes em seu ano. Mesmo assim, o mais prestigiado festival de cinema do planeta consagrou, exatamente, Dançando no Escuro, que teve cenas realizadas com nada menos que 100 câmeras digitais. A partir desse filme, métodos de produção e exibição começaram a ser repensados em todo o mundo.
1. Avatar
O inventivo James Cameron (segundo filme dele na lista) não somente deu ao mundo o poder da nova tecnologia 3D (que já havia existido de forma menos funcional anteriormente no cinema), mas não foi somente isso. Além de fazer a terceira dimensão ser um acréscimo para a linguagem cinematográfica, Avatar permitiu a percepção de que a era de uma imaginação sem limites havia chegado.
Existem outros filmes que poderiam estar na lista, como O Grande Roubo do Trem, Ouro e Maldição, Vaidade e Beleza, ...E o Vento Levou, O Mágico de Oz, Casablanca, Crepúsculo dos Deuses, 8½; brasileiros que deram voz ao nosso cinema – especialmente à criação de movimentos como o Cinema Marginal e Cinema Novo –; produções mais recentes como Projeto Gemini, Vingadores: Ultimato e até mesmo Hamilton; e tantos outros que modificaram pontos do cinema, sejam estes históricos, de linguagem, sociais, de público…
E para vocês? Quais são os filmes indispensáveis?