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Crítica Matrix Resurrections | Uma velha roupa colorida que não nos serve mais

Por  • Editado por Jones Oliveira | 

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Divulgação/Warner Bros.
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Logo no início de Matrix Resurrections, há um diálogo entre um recém-despertado Neo (Keanu Reeves) e Trinity (Carrie-Anne Moss) sobre como as máquinas subverteram a sua história. O herói explica a ironia de ver que toda a batalha sobre a resistência humana se transformou em um jogo de videogame dentro daquela nova realidade. A sua constatação é que a melhor forma de esconder uma verdade é colocando-a onde todo mundo pode ver. Para Neo, o segredo da vitória da Matrix é que ela transforma algo importante em trivial.

E o novo filme é essa trivialidade que o personagem aponta. Ele está longe de ser ruim, mas igualmente distante de carregar todo o simbolismo e o peso da trilogia original. Isso porque ele sabe que jamais vai conseguir ser tão importante e impactante quanto o primeiro longa e, assim, se entrega a algo inteiramente comercial e, de certo modo, vazio. E isso faz com que Resurrections seja aquilo que seu próprio protagonista critica: uma mensagem forte e relevante sendo absorvida e diluída pelo sistema.

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Matrix 4 é tão ciente dessa condição que o primeiro ato é todo cheio de piadinhas sobre isso. Ao deixar claro que a série é apenas um produto na mão de um estúdio e de sua equipe de marketing, ele brinca com todas as interpretações e leituras que os fãs fizeram da obra ao longo das últimas duas décadas. Política trans? Debates filosóficos? Um marco cultural? Nada disso, apenas um produto para ser explorado continuamente.

E não se trata de uma brincadeira com a sua importância, mas o contrário. Antes mesmo de a ação começar, o filme estabelece que a ideia é ser irrelevante mesmo, um filme pipoca para você se divertir — da forma como os executivos que abordam Neo querem. Isso faz dele um filme ruim? Claro que não, mas tira todo o verniz que sempre esteve em torno da franquia e o coloca como sendo apenas mais um filme de ação em cartaz entre tantos outros.

Discurso suavizado

Apesar de transformar aquilo que era a maior força de Matrix em algo trivial, Resurrections ainda flerta com suas origens e traz alguns debates e discussões sobre a nossa relação com a tecnologia e o mundo digital. O trailer já indicava isso ao mostrar Neo vendo as pessoas mergulhadas em seus celulares, mas a discussão vai um pouco mais além dessa crítica à la Black Mirror.

Depois do eventos de Matrix Revolutions, a guerra entre humanos e máquinas mudou bastante. Ainda temos essa realidade artificial que escraviza a humanidade para transformá-la em baterias vivas e, fora dela, pessoas vivendo escondidas em cidades-fortalezas à medida que são despertadas. Contudo, as coisas deixaram de ser tão maniqueístas quanto antes.

Primeiramente, é estabelecido que as pessoas não querem mais sair da Matrix. Elas querem ser controladas, como afirma um dos vilões, vivendo na segurança dessa farsa que lhes fornece tudo aquilo que desejam, confortáveis dentro desse mundo artificial — uma abordagem bem manjada, para ser sincero.

Por outro lado, descobrimos que as máquinas não são mais tão más assim e que algumas são capazes de despertar e ajudar os humanos. E é aqui que a gente vê o quanto a diretora Lanna Wachowski suaviza seu discurso em Matrix Resurrections.

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Enquanto a trilogia original tinha um crítica bem mais dura sobre a nossa relação com a tecnologia, apontando o quanto nós somos escravos desses sistemas que nós mesmo criamos, o novo longa ameniza e traz um tom mais conciliatório — um “veja bem, não é assim” bem claro. Afinal, o que ela diz com tudo isso é que as máquinas podem ser amigas e que podemos crescer enquanto sociedade ao trazê-las para perto.

Ainda é uma leitura bem precisa do nosso mundo atual e de como a tecnologia passou a fazer parte de nossa vida, mas que também evidencia bem o quanto Resurrections pisa no freio, como se quisesse evitar o confronto e apresentar uma discussão apenas superficial que não fugisse do lugar comum para focar apenas e unicamente em sua trama.

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E é aí que a gente vê como o novo filme é vazio em relação aos seus antecessores. Mesmo com seus problemas, Reloaded e Revolutions ainda avançavam na discussão que o primeiro Matrix apresentou, fazendo toda a trama de Neo, Trinity e Morpheus avançar em favor do debate e das alegorias que eram construídas sobre todas as temáticas que as diretoras apresentaram na época — as mesmas que são ironizadas por aqui.

Em Resurrections, é exatamente o oposto: as críticas estão presentes quase que por obrigação, porque Matrix exige. Só que, no fundo, fica claro que a intenção é apenas revisitar esse mundo e mostrar como estão esses personagens tanto tempo depois.

Velhos conhecidos

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Ao ter isso em mente, é possível aproveitar muito mais o que Matrix Resurrections tem a oferecer. E não há como negar que voltar para esse universo é realmente interessante, ainda mais quando tanta coisa mudou dentro e fora das telas.

O roteiro em si não é nada genial, mas funciona bem dentro da proposta apresentada, ainda mais pelo mistério em torno desse Neo de volta à Matrix ser algo tão instigante. E a solução encontrada para colocá-lo novamente dentro da simulação e referenciar a trilogia original é algo que funciona bem. Quem jogou os games da série Assassin’s Creed vai se sentir em casa.

Ainda assim, é uma grande surpresa ver que o longa está muito mais para Star Wars: Os Últimos Jedi do que para O Despertar da Força — ou seja, trata-se de uma história que leva o universo para frente ao invés de ficar girando em torno da nostalgia disfarçada de soft reboot. Nesse sentido, é muito interessante ver o que aconteceu com Neo e Trinity e para onde eles vão a partir de agora.

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E é aí que a gente tem aquilo que há de melhor em Matrix Resurrections: o novo elenco. Todos os novos personagens estão muito bons, seja em termos de atuação quanto de papel dentro da história — alguns mais do que outros, é verdade.

Bugs (Jessica Henwick) funciona muito bem como aquela que crê nas antigas histórias e que traz de volta as lendas do passado. Mesmo que a sua tripulação seja bem apagada e não tenha muito tempo de tela para se destacar em tela, toda a dinâmica do grupo com os velhos heróis e com todo o núcleo de fora da Matrix é muito bom.

Quem também chama muito a atenção é o analista de Neil Patrick Harris. É impossível falar sobre o personagem sem entrar em spoilers, mas saiba que ele rouba a cena sempre que aparece e que o ator sabe usar muito bem o seu jeito mais expansivo para dar vida a alguém único na saga.

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Morpheus (Yahya Abdul-Mateen II) e o vilão de Jonathan Groff são muito bons, mas acabam ficando um tanto quanto avulsos na trama. Apesar de seus personagens estarem ótimos e entregarem momentos de ação bem acima da média e atuações muito boas, eles acabam não sendo bem aproveitados pelo roteiro. Groff, por exemplo, aparece inicialmente como uma grande promessa, mas acaba sendo esquecido para retornar como um grande Deus Ex Machina mais para frente. Já o novo Morpheus é mais uma ferramenta do que realmente um personagem em si, infelizmente.

Menos revolução, mais moderação

Como dito, Matrix Resurrections não é um filme ruim — bem longe disso. Tudo o que ele apresenta funciona bem e, mesmo não sendo original e nem mesmo um remix de ideias tão interessante quanto antes, consegue conquistar o espectador não apenas pela nostalgia, mas por seus próprios méritos.

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O principal problema é que, além de não ser inventivo em nada que faz, ele tampouco tem coragem de ser contestador como fora no passado. É como aquela pessoa que, quando jovem, era um rockeiro cheio de atitude e vontade de mudar o mundo, mas que virou um tiozão quando mais velho.

Era óbvio que o novo filme jamais seria tão grande e revolucionário quanto o primeiro Matrix foi, mas ele sequer tenta se aproximar disso. Ele apenas aceita que essa é uma história trivial e que, assim como a história de seu protagonista, toda essa importância foi absorvida para virar um produto vazio e sem muito a dizer. O que é muito triste, já que muita da expectativa em torno de Resurrections está justamente em ver como a franquia poderia se encaixar no futuro que ela mesmo previu.

No fim, Matrix parece ter se tornado a velha roupa colorida de Belchior: o que era jovem e novo, hoje é antigo e o passado é essa roupa que nos serve mais. Só é uma pena que a série tenha desistido de se rejuvenescer.

Matrix Resurrections está em cartaz nos cinemas de todo o Brasil; garanta o seu ingresso na Ingresso.com.