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Crítica | Matrix Revolutions encerra a trilogia entre altos e baixos

Por| 14 de Setembro de 2020 às 18h00

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Reprodução/Warner Bros.
Reprodução/Warner Bros.

Houve muita expectativa para o lançamento da última parte da trilogia Matrix e muita gente saiu decepcionada da sala do cinema ao fim de Matrix Revolutions. O filme é o pior avaliado da trilogia em plataformas como IMDb e Rotten Tomatoes e, apesar de nem sempre o senso comum ser sinônimo de bom senso, ao menos neste caso, a “voz do povo” não parece estar totalmente equivocada.

Assistir ao filme das irmãs Wachowski hoje parece mais cansativo do que há alguns anos e eu tenho um grande palpite do porquê isso acontece: há um excesso de apelo às grandes cenas de ação, o que pode até se justificar dentro da trama, mas isso acaba por sufocar algumas partes bem interessantes e torna problemático o ritmo do filme.

Diferente dos outros dois capítulos anteriores, Matrix Revolutions faz uma opção clara pelo caminho da ação pela ação em diversos momentos. A deflagração da batalha entre humanos e máquinas deixa de lado a abordagem mais filosófica e reflexiva que marcou a trilogia e se distancia também das cenas mais localizadas, até intimistas, digamos assim, dos enfrentamentos anteriores.

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Menos filosofia, mais ação

Se Matrix e Matrix Reloaded esbanjam referências filosóficas distintas, Revolutions é menos interessante nesse aspecto. Apesar de uma clara referência à filosofia budista no desfecho da trama, quando Neo aceita que só o presente existe e que a sua derrota significaria também a derrota de Smith e à selagem da paz entre humanos e máquinas, o terceiro filme acaba focado na ação acima de tudo.

A jornada de autossacrifício e autorrealização é encerrada de maneira até surpreendente, quando Neo resolve entregar à própria existência a fim de redimir a humanidade. Esse é um lado bem positivo de Revolutions e sem dúvida está no mesmo patamar de outros momentos da trama, como a ressurreição do primeiro filme e os diálogos sobre escolha e livre arbítrio do segundo, mas isso quase passa despercebido diante de tantas explosões.

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O terceiro filme tem um ritmo demasiadamente acelerado, talvez por mirar de forma excessiva no aspecto prático do fim da trama, e com isso não tem tempo de se aprofundar em conceitos legais do universo Matrix apresentados anteriormente. Mesmo a Oráculo aparece como personagem meio esvaziada na trama, e elementos novos, como a estação de trem que funciona como “kernel” e liga o software ao hardware no filme, recebem menos atenção do que deveria.

O retorno de Merovíngio, por exemplo, poderia ter sido melhor aproveitado. Eis aí, aliás, das grandes oportunidades perdidas de Matrix Revolutions: não se explorou um pouco mais do passado do “Francês”. Não se trata de querer que o filme explique absolutamente tudo nos mínimos detalhes, mas fica a sensação de desperdício da chance de dar mais profundidade a um personagem intrigante e que poderia engrandecer um lado diferente da trama.

Tiro, porrada e bomba

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A cena dos mechas na doca de Zion, com humanos comandando máquinas e lutando contra robôs até é legal. Ela também pode ser encarada como uma contextualização extra e serve como resposta à pergunta: como os humanos se preparam para enfrentar um possível duelo com as máquinas na vida real?

Apesar disso, ela é exemplar sobre como Matrix Revolutions faz uma opção quase cega pela ação desenfreada. Recentemente, um produtor da trilogia explicou a razão pela qual os dois últimos filmes ficaram muito abaixo de Matrix e citou supostas interferências do estúdio e, juntando tudo, é possível até imaginar algumas reuniões nas quais figurões de Hollywood defendem a necessidade de mais explosões e menos discussões na tela.

É uma lástima, porém, porque essa característica essencialmente de ação de Revolutions quase torna desnecessária em sua maior parte.

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Apesar da ação ter sido uma parte incômoda da experiência de rever Revolutions, aqui vai uma ponderação: a cena final de luta entre Neo e Smith é incrível. Além de servir de pano de fundo para o acesso ao transcendental do Escolhido, pois é ali que ele recebe a iluminação suprema de como pode pôr fim a todos os conflitos, ela também completa uma trilogia, já que os personagens de Keanu Reeves e Hugo Weaving já haviam se enfrentado em batalhas épicas nos dois primeiros filmes.

A batalha é, ainda, uma espécie de cereja do bolo nas referências a obras audiovisuais de artes marciais chinesas e japonesas — e é impossível não lembrar de Dragon Ball durante aquela sequência.

O Escolhido é o que importa

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Quase tudo o que envolve Neo neste filme acaba sendo crucial para a trama, apesar de tanta ação “desnecessária”. Tanto é que o Escolhido se envolve pouco nas vias de fato e acaba decidindo mais com o cérebro e com o espírito do que com os músculos.

Se há algo realmente bom em Revolutions, é a iluminação alcançada pelo Messias, especialmente quando ele se dá conta de que a sua ligação com a Matrix e com as máquinas agora pode se dar sem qualquer conexão física — uma das teorias para isso é que, ao chegar à Fonte em Reloaded, Neo teria “atualizado” o firmware e ganhado suporte à conexão via Wi-Fi com a simulação (impossível não fazer analogias com computadores por aqui).

Independentemente de como isso se deu, é fato que ele evoluiu a ponto de sentir e enxergar tudo como energia. Se no primeiro filme seus olhos físicos ardiam porque nunca haviam sido utilizados anteriormente, no terceiro, eles se tornam desnecessários para que Neo enxergue tudo como de fato é: um amontoado de partículas energéticas.

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Essa questão da energia cósmica, informática ou espiritual (a escolha fica a seu critério) se encerra de maneira muito interessante, com Neo aceitando seu destino enquanto salvador. Se Smith é a “contra-anomalia”, a conta tentando se equilibrar, como lhe contou a Oráculo, o seu próprio sacrifício significaria, também, a derrota de seu arqui-inimigo.

A conclusão, então, é bonita e até surpreendente, pois deixa o final feliz um pouco amargo.

Poderia ter sido melhor (ou nem ter existido)

É uma pena que possíveis interferências do estúdio tenha afetado uma das franquias mais legais de toda a história do cinema. Mesmo com seus acertos, afinal eles existem, Revolutions poderia até ter sido evitado, com o “filé mignon” da sua história sendo encaixado em mais 40 minutos de tela de Reloaded, por exemplo.

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Essa opção deixaria a história menos cansativa e mais direta ao ponto, quem sabe até resultando em um produto final ainda melhor. Não teríamos uma trilogia Matrix, mas provavelmente teríamos um capítulo final mais coeso e consistente, com informação, filosofia e ação na medida certa.

Agora, o que nos resta mesmo é torcer para que Matrix 4 retome o universo criado pelas Wachowski com o mesmo primor que fez dele um clássico instantâneo lá no fim dos anos 1990.