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Crítica Back To Black | Biografia é a antítese da força do jazz de Amy Winehouse

Por| Editado por Durval Ramos | 15 de Maio de 2024 às 19h00

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 StudioCanal UK
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Louca, depravada, puta e bêbada! Esses são alguns dos vários adjetivos que a imprensa e o público usou para descrever Amy Winehouse, uma das vozes mais potentes do jazz e do R&B britânico. A moça, nascida em Londres, teve sua vida recontada na cinebiografia Back To Black, dirigida por Sam Taylor-Johnson, a mesma deCinquenta Tons de Cinza. Só que Johnson pintou uma fábula da vida de Amy mostrando seus problemas com álcool e falta de amor próprio, mas deixando muita coisa para trás.

A principal delas é a relação com a família. Assumidamente filhinha do papai — como sua tatuagem daddy’s girl prova —, Amy tinha uma admiração imensa por Mitchell Winehouse (Eddie Marsan), mas cresceu vendo-o trair a mãe inúmeras vezes, o que a perturbou emocionalmente. A relação com a mãe, Janis, por sua vez, quase não aparece no filme, como se esta não tivesse relevância nenhuma na vida da filha.

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Aliás, essa parte da infância e da adolescência, incluindo o transtorno de bulimia desenvolvido aos 15 anos, é deixada de lado para que a obra foque na relação da estrela com o problemático Blake (Jack O'Connell), seu marido.

No núcleo familiar só quem realmente ganha relevância é Cynthia, sua “nan”, mãe do seu pai e sua grande inspiração de vida e de estilo. Ela serve para dar um pouco mais de contexto ao público e mostrar a relação de Amy com sua fé judaica. Mas quando Blake, o bad boy, aparece, tudo passa a ser sobre a relação dos dois.

De todos os vícios que a cantora britânica teve, nenhum foi pior do que se tornar adicta a um homem sem caráter e cafajeste. Se, na vida pessoal, Amy se destruía e se curvava para um amor vadio, isso também fez com que compusesse as melhores músicas de fossa já ouvidas e que, somadas à sua voz grave de quem fuma dois maços de cigarro por dia, embalaram o Reino Unido e a América.

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Acertando no tom

O tom melancólico da obra combina com o clima chuvoso que Londres proporciona, e os cenários não poderiam ter sido mais bem escolhidos: pubs escuros e esfumaçados. A caracterização também é fundamental para transformar a jovem sonhadora em uma deprimida compulsiva. E, por fim, outra boa escolha é a forma como a trama conta como as tatuagens de Amy foram surgindo em seu corpo, sem precisar explicar o óbvio.

Mas os acertos param por aí, e se não fosse a boa atuação de Marisa Abela como a protagonista, o resultado seria ainda pior. Figurante em Barbie, ela supera a falta de semelhança física interpretando com maestria as caras e bocas da cantora, e entrega o que pode mesmo sofrendo com um roteiro mixuruca.

Há diálogos vergonhosos, e um deles acontece quando o pai lhe pergunta “você usa drogas?”, ao que Amy responde “sim!”, e pronto, um corte seco leva o público para outra cena qualquer. 

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A montagem também sofre com a linha temporal que não consegue lidar com o passar dos anos. Em um momento, Amy está cantando em um pub regional, em outro é assediada por paparazzis. Fica difícil entender como ela se tornou tão famosa. Aliás toda sua força enquanto mulher e todo seu “girl power” é esvaziado na tela. Ela diz que não é nenhuma Spice Girl, mas em Back To Black não passa de uma mulher mal amada por si mesma.

Um filme para dizer "no, no, no"!

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Como se já não bastasse todas essas frustrações, o longa pinta Mitchell como o grande herói da vida da filha e ainda exime Blake da culpa de ser um canalha, dando a ele a oportunidade para dizer que Amy é um fardo em seu caminho. Nessa altura, parece que não há como errar mais, mas o final reserva um desfecho genérico e vazio, não retratando a recaída da cantora ao alcoolismo, nem mostrando sua morte. 

Não fossem as músicas compondo a excelente trilha sonora, Back To Black seria vazio de tudo, e até para quem é apaixonado por biografias fica difícil defender uma história que não diz nada do biografado. Longe de se parecer com o excelente documentário Amy, de Asif Kapadia, a obra é uma tentativa falha de Mitchell em criar um filme legado da filha, no qual ele seja o mocinho, mas nessa tentativa ele cria a antítese da força que ela tinha.