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Pangenoma | Somos 99,9% idênticos e cientistas buscam desvendar o 0,1% restante

Por  • Editado por Luciana Zaramela | 

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ktsimage/Envato
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O Projeto Genoma, de 1990, é considerado um dos esforços científicos mais importantes de todos os tempos, levando 13 anos e identificando cerca de 20.000 genes, que deram à ciência uma “planta baixa” da nossa genética, o que transformou a medicina moderna. Embora de suma importância para a busca de tratamentos e remédios, o projeto nunca terminou realmente.

A questão é que talvez o projeto de mapeamento genômico nunca termine — isso porque os seres humanos são, na verdade, 99,9% idênticos, nunca sendo exatamente iguais. Esse aparentemente ínfimo 0,1% explica nossas diferenças e caráter único de cada pessoa, sendo uma boa explicação para o porquê de alguns indivíduos serem mais suscetíveis a certas doenças. Mapear um único genoma em sua totalidade não abarca todos nós.

Isso não quer dizer que a ciência deixará de tentar. Um estudo publicado na última quarta-feira (10) busca preencher essa lacuna ao analisar sequências genéticas das mais diversas, buscando incluir seres humanos mais desviantes do genoma considerado “padrão” e estabelecer uma estrutura fundamental de referência para a variação humana, nas palavras dos cientistas. Isso deve ajudar, por exemplo, a eliminar vieses e permitir serviços de saúde mais igualitários e inclusivos.

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O que é Pangenoma?

Os pesquisadores estão chamando o objetivo da pesquisa de pangenoma, ou seja, uma coleção de sequências de DNA múltiplas e possíveis dentro de uma mesma espécie. No passado, o genoma de referência se baseava em um grupo de poucos indivíduos, mas que supostamente deveria representar uma porção maior de genes. Já o pangenoma é criado a partir de múltiplas pessoas de todo o mundo, refletindo de forma mais acurada a diversidade genética do ser humano.

O estudo não busca culpar os cientistas do passado, no entanto, já que não era sua intenção deixar variações genéticas de fora: eles simplesmente não conseguiam abarcar todas elas. Entre os anos 1990 e 2000, a tecnologia não permitia notar grandes variações entre os haplótipos — grupos de genes herdados de um dos pais — de pessoas diferentes.

É nessa diferença que o pangenoma foca. Sua importância advém da associação de algumas mutações com diferentes traços e doenças. Um exemplo é o gene da lipoproteína (a), cuja estrutura é complexa e ainda não foi sequenciada em humanos, mas que pode gerar variações associadas a maiores riscos de doenças cardíacas em populações pretas. Descobrindo mais sobre o gene, poderemos analisar e tratar casos antes inexplicáveis de doenças coronárias nessas pessoas.

O que o trabalho já revelou

Para o pangenoma, os pesquisadores reuniram dados de 47 pessoas geneticamente diversas, metade vindo da África e o restante de 4 outros continentes, incluindo Austrália e Antártica. Essas informações foram juntadas a 119 milhões de pares de base e 1.115 duplicações, ou seja, mutações onde uma porção do DNA de um gene é repetida.

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Mais de 99% das sequências genéticas eram similares entre essas pessoas, como esperado — mas a inclusão do “menos de 1%” no novo rascunho do pangenoma mostrou que mudanças estruturais dos genes explicavam 90 milhões dos pares de base identificados.

Em outras palavras, a mudança na representação do nosso genoma consegue descrever, de forma mais precisa — embora nunca perfeita ou completa — as variações da nossa espécie. Com isso, geneticistas poderão melhor identificar e caracterizar mutações genéticas difíceis de se encontrar, diferenças que podem significar vida ou morte de um paciente com uma condição rara.

Ao analisar um conjunto separado de informações genéticas usando o rascunho do pangenoma como referência, foram detectadas 104% variantes estruturais a mais. A precisão da sequência de comparação também foi melhorada, diminuindo a taxa de erro variante em 34%.

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Pangenoma em construção

Ainda que já tenha nos providenciado uma base estrutural mais robusta, o rascunho do pangenoma é apenas a primeira fase do projeto, que ainda levará anos para ser completo. A equipe de pesquisadores responsável busca a ajuda de outros cientistas por todo o mundo, especialmente mirando em comunidades onde há menos dados genômicos catalogados, como membros de culturas indígenas.

É possível que os rascunhos sejam finalizados apenas daqui a algumas décadas, caso o objetivo realmente seja um panorama completo do genoma humano. Há diversos desafios pela frente, como estratégias eficientes para comparar múltiplos genomas e um plano concreto para a testagem de variações genéticas no campo médico. Os cientistas acreditam que o esforço valerá a pena, tornando possível, por exemplo, finalmente levar os genes humanos totalmente em consideração na hora de tratar doenças.

Fonte: Nature