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A curiosa história do uruguaio que viajou de SP ao Alasca em um Jeep Willys

Por  • Editado por Jones Oliveira | 

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Arquivo Pessoal/Hugo J. Vidal
Arquivo Pessoal/Hugo J. Vidal

Hoje em dia é muito difícil encontrar um motorista que se disponha a ir de um ponto A a um ponto B dirigindo seu carro, por mais curto que seja o caminho, sem utilizar um aplicativo de trânsito, como Waze ou Google Maps. Imagine, então, ir de São Paulo ao Alasca sem qualquer ajuda da tecnologia.

Foi isso o que o uruguaio Hugo Juan Vidal realizou, com êxito, ao lado de dois amigos. E ele fez isso em 1955, época em que não existiam telefones celulares e muito menos aplicativos de trânsito inteligentes como os de hoje. Aliás, não estavam nem perto de serem projetados ou inventados.

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Hugo Vidal era um jovem sonhador que, ao lado de dois amigos, o britânico Charles Downey e o brasileiro Jan Stekly, escoteiros como ele, resolveu pegar um Jeep Willys CJ3B, o popular “Cara de Cavalo”, e, aos 19 anos, se arriscar em uma missão bastante ousada: atravessar o mundo e chegar ao Alasca dirigindo o carro emprestado pela Agromotor, empresa que, à época, era distribuidora Jeep no Brasil.

A ideia inicial da viagem, porém, era outra. Os três amigos faziam parte do Grupo Escoteiro Carajás e tinham em mente participar do VII Jamboree, que seria realizado no Canadá. A “esticadinha” foi definida no caminho da volta de Niagara-on-the-Lake, na região de Ontário, após o encontro que reuniu mais de 12 mil escoteiros.

Aventura entre São Paulo e Alasca virou livro

Convidado de honra pela Jeep para acompanhar e participar da montagem do veículo de número 1 milhão da montadora a ser produzido na fábrica de Goiana, em Pernambuco, o senhor Hugo Vidal, hoje com 88 anos, conversou com a reportagem do Canaltech e brincou sobre seu feito histórico:

“Hoje tudo ficou mais fácil, né? Os carros são cheios de tecnologia, tem GPS, aplicativos para tudo. Naquela época não tinha nem aqueles guias de papel. Para não perder o rumo, só perguntando. As comunicações não existiam, por isso usamos só aqueles mapas de criança, da escola mesmo”.

A inusitada e curiosa história dos três jovens amigos foi imortalizada no Livro Operação Abacaxi — Flashes de uma Aventura, ainda disponível nas livrarias brasileiras. Uma boa parte da viagem foi relembrada, ao vivo e a cores, por um dos personagens neste divertido bate-papo com a reportagem.

O nome da missão (e do livro) foi uma escolha curiosa. No Brasil, “abacaxi” é sinônimo de problema, e Hugo e os demais escoteiros foram patrocinados por 25 empresas do ramo automotivo para provar que as peças nacionais usadas na adaptação do Willys CJ3B eram confiáveis, e não “verdadeiros abacaxis”.

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A viagem (e os perrengues) de São Paulo ao Alasca

A viagem ao Alasca durou exatamente 1 ano e 12 dias, tempo no qual os aventureiros percorreram nada menos que 72.985 quilômetros a bordo do valente Willys CJ3B. E Hugo Vidal se lembra de tudo nos mínimos detalhes, como se a aventura tivesse acontecido ontem. Principalmente dos maiores perrengues que enfrentaram ao longo da missão.

“Dificuldades foram muitas. A mais grave, uma capotada na Nicarágua. Além disso, também chegamos a ficar sem gasolina na Times Square, em Nova York”, contou, feliz em compartilhar mais uma vez as experiências vividas entre 2 de abril de 1955 e 14 de abril de 1956.

Ao todo, Hugo Vidal e seus companheiros passaram por 19 países, incluindo Honduras, El Salvador, México, Guatemala e Estados Unidos. Nos trechos em que não foi possível transitar dirigindo o carro, o Willys foi devidamente acomodado em um navio ou, então, em um avião cargueiro da PanAm.

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Durante os quase 400 dias de convívio, alguns desentendimentos aconteceram. E como resolver isso em meio a uma viagem tão longa? Segundo Hugo, a receita era simples: pegar um pouco de dinheiro, desaparecer por dois dias e, depois, se reencontrar em um ponto previamente marcado: “Era um santo remédio”.

O custo total da aventura, segundo relatado no livro, foi pequeno, quando comparado ao tamanho da viagem: pouco mais de US$ 4.500 e 11 pneus furados. Para cortar gastos, dormiam em barracas, sacos de dormir ou, então, em abrigos improvisados, como uma cela de delegacia.

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O Jeep Willys CJ3B

O carro usado por Hugo Vidal e seus amigos escoteiros para chegar de São Paulo ao Alasca foi um Willys CJ3B, lançado nos Estados Unidos em janeiro de 1953 e produzido no Brasil pela Willys-Overland a partir do ano seguinte.

Conhecido também como “Cara de Cavalo”, o CJ3B (Civilian Jeep 3B) era montado em São Bernardo do Campo. Seus principais diferenciais eram a grade frontal e o capô mais elevados, justamente para acomodar o motor 4 cilindros Hurricane.

O CJ3B teve 155 mil unidades produzidas até 1968 e foi considerado o primeiro “carro mundial” da Jeep. O modelo teve até um “irmão gêmeo” militar, o M606, e chegou a ser fabricado também em países como Japão, Índia, França, Espanha e Turquia.

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O Jeep que fez de três escoteiros verdadeiros heróis ao viajarem de São Paulo ao Alasca serviu de inspiração para outros modelos icônicos da marca, como o Wrangler, o Gladiator e até mesmo o Renegade, até bem pouco tempo campeão em vendas do segmento no Brasil.

Será que algum deles também encararia uma viagem entre São Paulo e Alasca com tanta valentia? Quem tiver coragem, dê um passo à frente e boa viagem.