De leões nas ruas a água sanitária: entenda as fake news da COVID-19
Por Fidel Forato |
Sabe essas imagens desfocadas que não conseguimos visualizar direito, mas recebemos acompanhadas de machetes estranhas? Pois bem, desconfie, e desconfie muito. É caso da notícia dos supostos leões — com uma imagem como a dessa capa da matéria, em baixa resolução — que foram soltos na Rússia para obrigar a população a acatar uma quarentena compulsória contra o novo coronavírus (SARS-CoV-2).
Se não bastasse o caráter incomum, a fake news ainda traz o absurdo número de 500 felinos à solta, nas ruas das principais cidades russas. Essa foi uma das checagens de notícias, realizadas de maneira colaborativa por um grupo de 107 checadores de informação, distribuídos por 45 países, falantes de 15 línguas e disponíveis em todos os fusos-horários. No entanto, essas desinformações mirabolantes podem ter seus dias contados, a partir de mentiras mais sofisticadas e, por isso, mais perigosas.
Dos mais de 1.500 fatos checados e concentrados em uma lista no Twitter — que pode ser acessada aqui —, a pesquisadora e jornalista Cristina Tardáguila, também diretora adjunta da International Fact-Checking Network (IFCN), na Flórida, e fundadora da Agência Lupa, no Brasil, é parte desse movimento.
Fake news em ondas
"Quem está acompanhando desde o início, já viu que a desinformação está chegando em ondas. Já estaríamos na quinta ou sexta onda de conteúdos diferentes", explica a pesquisadora que trabalha com confirmação de notícias há mais de seis anos. Para Tardáguila, a primeira onda que apareceu na China, no começo de janeiro, e era sobre a origem do vírus.
A desinformação chegava ao ponto de associar bananas com a sua origem. Depois circularam boatos que era uma criação de Bill Gates e ainda uma arma biológica da China para dominar o mundo. Em seguida, veio a onda de vídeos editados e fora do contexto original, como registros de pessoas caindo nos trens e nos metrôs ou de pessoas desmaiadas nas ruas — como se pode checar, eram casos de pessoas bêbadas, performances artísticas e até mesmo em situações de infarto.
A outra onda "que ainda não passou e nem deve passar tão cedo", segundo a pesquisadora, é a das falsas formas de prevenção e de cura, como indicações para se consumir vitamina C, ingerir alho ou beber água sanitária. Nesses casos, as dicas variam de acordo com a região do mundo e podem ser compreendidas como uma das fakes news mais perigosas.
Uma quarta onda, a do extermínio, que chegou quando o coronavírus já fazia milhares de vítimas na Itália, trazia informações de que a China estaria matando as pessoas infectadas para conter o crescimento da pandemia em seu território. Algumas ainda afirmavam que a China estaria comprando urnas crematórias ou ainda pedindo autorização para exterminar 25 mil pessoas, além de matar cachorros e gatos.
"Essas ondas passam e os checadores têm interpretado isso como o resultado da pressão de checagem. Checaram tanto as informações, que hoje você não recebe mais determinados conteúdos, como o caso dos extermínios da China ou da água sanitária", comenta Tardáguila. "As mudanças das ondas são atestados de que as checagens têm efeito", conclui sobre a importância dessas atividades.
Quem são os autores?
Com tanta energia e tempo gasto na criação, elaboração e disseminação das fakes news que é preciso se perguntar quem são seus autores. De acordo com Tardáguila, "embora não exista uma resposta única, vejo no mínimo três grandes grupos que são o do inocente, o do consciente que faz isso por uma bandeira e o do consciente que trabalha e ganha financeiramente com isso".
Para o grupo de autores de desinformação por inocência ou falta de consciência, nesses casos, a pessoa não tem discernimento suficiente para compreender aquela informação e a propaga sem maldade, acreditando fazer o bem. Já os conscientes têm interesses envolvidos no compartilhamento daquela mensagem, sabem que a informação está errada e assim mesmo a propaga.
Ainda segundo a especialista, por uma posição ideológica, como acreditar em uma bandeira, uma religião, uma política ou uma crença individual, propagam-se as mentiras. Nesses casos, sua motivação é filosófica, ideológica. No entanto, há também aquele indivíduo que propaga desinformação por uma motivação financeira, que foi contratado para aquilo. Na verdade, trata-se de algo parecido com o emprego, que dá retorno financeiro e, por isso, está bem longe de ser uma brincadeira inocente.