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Bactérias geneticamente modificadas podem ser ingeridas para tratar doenças

Por| Editado por Luciana Zaramela | 08 de Novembro de 2022 às 14h30

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CDC/Unsplash
CDC/Unsplash

Cientistas estão utilizando engenharia genética para modificar bactérias, as tornando não apenas saudáveis para o corpo humano, mas também benéficas, fazendo funções específicas no corpo, como filtrar proteínas em pacientes de fenilcetonúria (PKU), que não conseguem filtrar um aminoácido chamado fenilalanina, encontrado em alimentos com muita proteína, como carne e ovos. A bactéria em questão é a E. coli.

Bactérias do bem

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A origem desse uso bacteriano é curiosa: durante a Primeira Guerra Mundial, milhares de soldados foram acometidos de disenteria, uma espécie de diarreia severa espalhada por água contaminada com a E. coli. Um soldado alemão servindo nos Bálcãs, no entanto, não ficou doente ao ser exposto à bactéria, diferente de todos os seus colegas. Um cientista, Alfred Nissle, isolou uma cepa da bactéria das fezes do soldado em 1917, descobrindo efeitos protetivos muito grandes contra a Shigella, uma das causadoras da disenteria.

Nos últimos 100 anos, a cepa — que ficou conhecida como E. coli nissle — foi sendo usada como probiótico para promover a saúde intestinal e tratar problemas gastrointestinais como doença inflamatória do intestino. Agora, ela vem integrando esforços para criar "remédios vivos", como o da companhia americana Synlogic, que busca tratar a PKU. Sem tratamento, a condição pode acumular fenilalanina no cérebro e causar distúrbios cognitivos, epilepsia e sintomas comportamentais.

Na fase 2 dos testes, 20 voluntários beberam o composto de bactérias modificadas misturadas com líquido, o que diminuiu a quantidade dos aminoácidos em questão. Normalmente, a PKU é tratada com uma dieta restritiva, que corta carne, peixe, laticínios e ovos da alimentação, além de adicionar suplementos, em alguns casos, para evitar a deficiência de nutrientes no corpo.

A severidade da condição é variável, e alguns pacientes podem consumir apenas algumas proteínas por dia — um pedaço de pão branco, por exemplo, contém 1 ou 2 gramas de proteína. Há 2 remédios aprovados para uso contra a fenilcetonúria, mas um deles não é muito utilizado porque pode causar uma reação alérgica séria, e o outro ajuda apenas alguns tipos de PKU. O novo tratamento busca dar mais opções dietéticas aos pacientes, que não têm muita liberdade na hora de comer.

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Engenharia bacteriana

A E. coli modificada pelos cientistas produz uma enzima presente em plantas, leveduras e outras bactérias cuja função é digerir fenilalanina. Também foi removido um gene da bactéria para impedir que ela se replique, evitando que se assente no intestino e causa problemas futuros. Dentro de uma semana, ela some do sistema gastrointestinal. Então, 3 vezes por dia, após todas as refeições, os 20 pacientes tomaram o composto bacteriano com água ou suco.

Os participantes tiveram de continuar consumindo as quantidades de proteína usuais, para que fosse possível notar o efeito em seus corpos. Deles, 15 seguiram tomando todas as doses até o final da pesquisa, e 60% (9 pessoas) tiveram uma redução de mais de 20% nos níveis de fenilalanina a uma ou duas semanas do início do tratamento, medida por exame de sangue. A média de redução de fenilalanina nos participantes foi de 42%.

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Apesar de não parecer muito, os cientistas afirmam que qualquer redução nos níveis do metabólito já permite que os pacientes possam comer outros tipos de proteína, flexibilizando bastante a sua dieta diária. Uma redução de 20% era o objetivo da empresa, já que o número implica numa redução nas chances de dano cerebral por acúmulo de fenilalanina.

Agora, a companhia planeja levar o estudo para a fase 3, aumentando os participantes para 100 a 200, investigando os efeitos de longo prazo da bactéria no organismo. Entre os objetivos, está descobrir a causa da diferença na redução de fenilalanina nos pacientes, que pode ser por conta de um maior consumo de proteína por alguns deles.

Desafios e o futuro do tratamento

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Entre os desafios da pesquisa com tratamentos que envolvem o microbioma, está o fato de que as colônias bacterianas são muito influenciadas por alimentação e remédios, podendo mudar em poucos dias. A longo prazo, o piso de eficiência para terapias como essas fica bem alto. Além disso, há os efeitos colaterais: dos 5 pacientes que não completaram o tratamento, 3 se retiraram por efeitos gastrointestinais adversos, 1 retirou o consentimento e um último teve rubores faciais, uma possível reação alérgica à bactéria.

A E. colimodificada já é utilizada em laboratório para coletar proteínas terapêuticas, como insulina e algumas utilizadas para tratamento de câncer. A diferença é que, nesses casos, o paciente recebe o produto final, enquanto na pesquisa da PKU, é tomada a bactéria em si. Com o sucesso de receber o tratamento direto no intestino, a bactéria poderá ser modificada pra tratar outras doenças, como diabetes, artrite reumatoide, problemas de pele e até mesmo câncer, todos com relações com o microbioma intestinal.

Fonte: Wired, Synlogic