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HQs clássicas: por que Os Supremos é a pedra fundamental dos filmes da Marvel

Por  • Editado por Claudio Yuge | 

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Homem de Ferro, o cientista bilionário e megalomaníaco. Thor, o deus com comportamento descontraído e mundano. Capitão América, o supersoldado deslocado no presente. Viúva Negra, a superespiã russa de lealdade dúbia. Muitos de vocês conhecem esses personagens do cinema, mas a verdade é que os filmes recentes devem bastante a Os Supremos (The Ultimates, no original em inglês), título que teve três volumes em uma Terra alternativa da Marvel Comics; e reinventou os Vingadores para o século 21. A importância desse material nos conceitos por trás dos filmes de super-heróis da Marvel é imensa; e até hoje direciona seu universo cinematográfico.

Lançada entre 2002 e 2007, a obra dos britânicos Mark Millar e Bryan Hitch fazia parte de um então novo universo criado pela Marvel chamado Ultimate — a Terra-1610. A proposta era contar do zero a origem e primeiras aventuras dos principais personagens da editora, sob um contexto e narrativa que flertava com os blockbusters de ação da época; mas em uma linha de revistas à parte da cronologia da editora, que já acumulava décadas de vida. Assim, poderia atrair novos leitores enquanto apresentava perspectivas alternativas atualizadas para os fãs antigos.

O novo universo começou com revistas próprias para alguns dos principais heróis da Marvel: Homem-Aranha, X-Men e Quarteto Fantástico. Mas foram os Supremos, isto é, os Vingadores de Millar e Hitch, que mudaram o jogo e transformaram as páginas de papel em verdadeiras cenas de um filme arrasa-quarteirão.

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O primeiro arco de 13 partes começa com um resumão da atuação do Capitão América na Segunda Guerra Mundial, mas o herói desaparece no mar. As edições seguintes apresentam no presente os demais heróis do grupo: Homem de Ferro, Gigante (Hank Pym), Vespa, Thor, Hulk, Feiticeira Escarlate, Mercúrio, Gavião Arqueiro e Viúva Negra, além de seu mentor, o agente Nick Fury. Descobrimos que o Capitão foi revivido após ser descongelado; e o grupo precisa enfrentar a raça alienígena Chitauri, que consegue mudar de forma e, infiltrada entre humanos, tramou um plano de dominação da Terra.

O que chamou a atenção na época foi a forma habilidosa como Millar “remixou” os primeiros anos de histórias originais da cronologia dos Vingadores em uma trama que dialogava com a estética e a narrativa de blockbusters recentes do cinema da época, como Independence Day, Missão Impossível e Matrix. A arte grandiosa, realista e detalhada de Bryan Hitch também foi destaque, ao demonstrar domínio dos planos usados nos filmes e transpô-los com habilidade às páginas da história, com direito a cenas de ação gigantescas nas duas edições finais.

Também chama a atenção a abordagem de Millar sobre os personagens, tirando um bocado do verniz heroico e virtuoso de suas versões canônicas e colocando mais arestas no comportamento deles, além de atualizar seus visuais.

O Capitão América, que sempre foi a bússola moral da Marvel, ainda mantém sua grande ousadia em batalha e capacidade de liderança, mas demonstra ser um sujeito de valores bastante conservadores e de métodos questionáveis para conseguir a vitória — afinal, ele é, acima de tudo, um soldado em uma guerra, que mata. Por exemplo, esse Steve Rogers diz para o Hulk que um vilão transmorfo estava “traçando a Betty” [Ross,a amada do alter-ego do monstro, Bruce Banner], que responde com fúria assassina e arranca a cabeça do alienígena.

Banner, por sinal, teve seu conhecido complexo de inferioridade bastante acentuado aqui. Em um momento importante da história, injeta em si de novo uma tentativa de Soro do Supersoldado (uma reprodução incompleta, produzida com uma amostra de sangue do Capitão América). Ele se transforma no Hulk, após ser ridicularizado por seus colegas Vingadores — no filme Vingadores é possível ver a influência disso. Na primeira vez que o Gigante Esmeralda de Mark Ruffalo vê Rogers, ele fica com um olhar de deslumbramento; e vale lembrar que o Capitão é o único a quem a criatura obedece em toda a trama do longa.

Hank Pym, o Gigante, também tem suas neuroses e chega a comandar um ataque de formigas, que fere seriamente a Vespa — tudo por ciúmes dela e seu possível interesse no Capitão. Thor é retratado como um neo-hippie e beberrão que protesta contra o Fórum Econômico Mundial; e o Homem de Ferro é um dos que mudaram menos, pois Tony Stark continua sendo o playboy ultragenial de sempre, mas claro, com um pouco mais de egocentrismo e hedonismo que o “normal” dele no universo tradicional da Marvel.

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O recado que Millar e Hitch queriam dar a fãs novos e antigos era: sim, eles essencialmente ainda são os Vingadores que conhecemos, mas não espere deles o "bom-mocismo" de antes. A história ainda trazia alguns subtemas que conversavam com o tom político da época, como os EUA de George W. Bush enviando suas tropas ao Oriente Médio. A continuação, Supremos Vol. 2, publicada de 2005 a 2007, trouxe Loki como o supervilão da vez — uma reverência à estreia dos Vingadores em 1963 — liderando um exército de meta-humanos chamados Os Libertadores.

Millar tem uma carreira marcada por histórias que desconstroem e “adultizam” o gênero super-herói seja na Marvel e DC ou com personagens próprios, como KIck-Ass, Guerra Civil, Authority, Superman: Entre a Foice e o Martelo e Wolverine: Velho Logan. Os Supremos foram a síntese do seu estilo e recebeu aclamação geral do público e da crítica, embora com críticas moderadas ao cinismo e agressividade do tom da história.

Em 2008, após a falta de interesse da dupla criativa original em continuar trabalhando com os Supremos, a Marvel encomendou mesmo assim um volume 3, deixando-o nas mãos do escritor Jeph Loeb e do artista Joe Madureira. Vendeu menos que os dois arcos anteriores e recebeu muito mais críticas negativas. Loeb ainda assinou o crossover Ultimatum, que foi ainda mais mal visto, com uma série de mortes e violência gratuita ainda mais acentuada que a fase de Millar e Hitch.

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Mas o triste final não apaga os méritos da fase de ouro dos Supremos, que como pudemos ver, serviu de "bíblia conceitual" para os filmes do Universo Cinematográfico da Marvel de 2008 até aqui, ainda que com uma abordagem mais leve que sua matriz. O Thor fanfarrão de Chris Hemsworth, o Tony Stark irônico e cheio de recursos de Robert Downey Jr. e a escalação de Samuel L. Jackson como Nick Fury são apenas alguns exemplos de como a arte imitou a arte, pois todos eles já estavam lá na HQ anos antes de migrarem para a telona. Atendo-se apenas à comunidade de quadrinhos, a obra fica como parâmetro de que não há limites para o que bons artistas podem fazer no papel em termos de escala e narrativa de ação.

Onde comprar

Os dois primeiros arcos de Supremos foram publicados originalmente pela Editora Abril, mas foram encadernados pela Panini e podem ser adquiridos com relativa facilidade na loja online da editora (R$ 122 o vol.1, e R$ 173,90 o vol. 2). Também está disponível com desconto na Magalu e outras varejistas.