Águas corrompidas, ar infectado: como gregos e romanos lidavam com a poluição
Por Augusto Dala Costa • Editado por Luciana Zaramela |
As preocupações com o meio-ambiente, apesar de estarem em alta nos tempos atuais, não são novidade aos seres humanos — povos da antiguidade, como gregos e romanos, já se preocupavam com a qualidade do ar e da água, e escreveram muito sobre a importância dessa preservação, mesmo sem o conhecimento científico que hoje temos.
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Ler os relatos de filósofos e escritores militares é curiosamente familiar, já que suas ideias fazem muito sentido nos dias modernos, talvez mais do que nunca: talvez não surpreenda, afinal de contas, perceber que o ser humano é, há muito tempo, consciente do seu dano ao mundo natural através da poluição.
Ser humano e a poluição na antiguidade
Um dos autores do passado que se preocupou com a natureza e sua poluição foi Plínio, o Velho, que viveu no primeiro século d.C. e tratou do assunto na obra História Natural. Nela, escreveu: “Nós manchamos os rios e os elementos da natureza, e o próprio ar, que é o principal suporte da vida, nós transformamos em um meio de destruição da vida”.
Mas não só os filósofos pensaram no assunto. O escritor militar Flávio Renato Vegécio, que viveu entre os séculos IV e V d.C., notou que “[...] se um exército numeroso continua em um lugar por muito tempo no verão ou outono, as águas ficam corrompidas, e o ar, infectado, gerando destemperos malignos e fatais, de forma que só a mudança frequente de acampamento pode prevenir”.
A preocupação se estendia, também às cidades — o biógrafo Suetônio, nascido em cerca de 70 d.C., comentou que o rio Tibre, que passa por Roma, estava “cheio de lixo e estreitado por construções onipresentes” antes do imperador Augusto (63 a.C. - 14 d.C.) mandar limpá-lo. A administração local o poluiu diversas vezes, a exemplo do imperador Nero (37 - 68 d.C.), que jogou toneladas de grãos podres no rio.
O poeta romano Juvenal, entre o primeiro e segundo séculos d.C., chamou o Tibre de “jorro de esgoto”, e o médico Galeno (129 - 216 d.C.) disse que o rio era tão poluído que os peixes lá pescados não eram seguros para comer. Mas os antigos não faziam só reclamar: eles também propunham soluções, e, frequentemente, as executavam.
Como os antigos cuidavam do meio ambiente
Em 420 a.C., na república helênica de Atenas, foi instituída uma lei para cuidado do rio Ilisso. Era proibido mergulhar peles de animais nele acima do santuário de Héracles, bem como curti-las no rio ou jogar resíduos de lavagem nele. No século IV, após a lei, autores descrevem o Ilisso como puro e belo, sinal de que a medida de fato funcionou para limpá-lo.
Outras medidas para reduzir a poluição, em geral, incluíam proibir urinar e defecar em público, bem como o banimento da lavagem de roupas ou uso de rios como lixeiras. É improvável, no entanto, que a população obedecesse às medidas o tempo todo. Esforços públicos também incluíam a construção de esgotos e aquedutos para escoar a poluição das cidades.
Obras bem-sucedidas foram os aquedutos de Roma. Sexto Júlio Frontino (35 - 103 d.C.), que os gerenciou por um tempo, escreveu que, graças ao imperador Nerva, que coordenou reparos dessas obras, a cidade de Roma ficou limpa, com ar puro e livre da atmosfera pútrida anterior, melhorando até mesmo a fama da metrópole.
Os antigos, afinal de contas, sabiam que a poluição trazia uma piora à saúde da população, como o próprio imperador Trajano, do primeiro século d.C., escreveu. Como é possível que, com milhares de anos em posse desse conhecimento, seguimos poluindo e pouco nos preocupando com as crises ambientais?
Manter a natureza limpa e protegida não faz bem só a ela, mas a nós também. Quem sabe podemos resgatar conhecimentos como esse e usar os conselhos imemoriais dos gregos e romanos em meio às nossas próprias crises climáticas, nos esforçando, como eles, para manter a vida na Terra em meio a um ambiente salubre e agradável para todos.
Fonte: The Conversation