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Vale a pena jogar Tales of Kenzera: Zau?

Por| 23 de Abril de 2024 às 13h48

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Captura de Tela/Durval Ramos/Canaltech
Captura de Tela/Durval Ramos/Canaltech

Tales of Kenzera: Zau é um daqueles jogos cuja premissa fala muito mais alto do que o game em si. Desenvolvido pela Surgeon Studios sob o selo EA Originals, o metroidvania é uma reflexão bastante pessoal do seu criador, Abubakar Salim, sobre o processo do luto.

Salim é um ator e dublador com passagem em filmes e séries, como Napoleão e Raised by Wolves, e no game Assassin’s Creed Origins. Só que, mais do que isso, ele é alguém que perdeu seu pai há pouco tempo e que decidiu transformar esse sentimento de perda em um jogo. Para isso, usou a cultura africana, com seus mitos e formas de ver o mundo, para dar significado a essa experiência tão pessoal.

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Trata-se de abordagem tão única que diferencia Tales of Kenzera de outros títulos, inclusive dentro do mesmo gênero. Tudo é muito bonito, sensível, simbólico e pessoal. em um ano que já começou com grandes metroidvanias chegando aos consoles, é muito bom ver um lançamento tão cheio de personalidade assim.

Só que, ao mesmo tempo, o fato de essa premissa falar tão alto dessa maneira também serve para esconder os deslizes e poréns que o título apresenta. Por trás de todo esse aspecto tão potente e particular, há um jogo com muito espaço para melhorar.

Uma bela história

Não há como não falar do quanto Tales of Kenzera acerta em sua sensibilidade. A história de luto e sobre esse protagonista que precisa entender o significado da vida e o valor da despedida é algo que conversa com todos nós, mesmo com quem não conhece os bastidores do jogo e toda a carga autobiográfica atribuída.

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A história é desenvolvida em duas camadas — ou três se você levar em conta o próprio Abubakar Salim. Na primeira, temos Zuberi, um rapaz que ainda está lidando com a morte de seu pai e que recebe um livro escrito por ele sobre um jovem xamã que também acabou de ficar órfão e que embarca em uma jornada rumo ao mundo dos mortos para tentar trazer seu pai de volta à vida. 

Esse xamã é o Zau do título e é essa jornada mítica a parte jogável do game. Parece uma narrativa redundante, mas é uma forma interessante de Salim mostrar para o jogador o que é Tales of Kenzera

Da mesma forma que, pela história de Zau, Zuberi passa a entender a morte como uma etapa inevitável da vida e que o luto é um processo pelo qual ele precisa passar, o jogo se desenvolve como essa obra quase terapêutica de Salim em relação à perda do pai. 

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São três camadas muito potentes e que conversam entre si a todo momento, dando muita força ao game. E, como todos nós já encaramos um sentimento de perda como esse, o texto ganha um peso ainda maior com essa cumplicidade com a qual é impossível ficar indiferente. 

Assim, por mais que Tales of Kenzera peque muitas vezes em uma jogabilidade bastante simplória, isso acaba tendo um impacto muito menor diante do todo. Como dito, a história do game (e a história por trás dela) falam muito mais alto.

Um mergulho no imaginário africano

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Outro ponto de grande destaque de Tales of Kenzera: Zau é como usa a cultura e o imaginário africano para desenvolver essa fábula sobre o luto. Abubakar Salim é de família queniana e decidiu trazer essas origens na hora de homenagear seu falecido pai e de traduzir seu próprio pesar.

Isso é um acerto enorme por diferentes razões. Em primeiro lugar, traz para os holofotes uma cultura que aparece muito pouco no universo dos jogos. O simples fato de colocar o protagonista Zau como um xamã tendo que lidar com divindades e mitos africanos é algo que diferencia o título de tudo o que a gente já viu, apresentando um universo que é desconhecido para muita gente.

Além disso, há o fato de que a Surgeon Studios sabe explorar esses aspectos muito bem, sem cair no velho estereótipo que a gente conhece. Ainda que alguns elementos soem familiares, como o caráter tribal daquela sociedade e até a representação de alguns pensamentos, há um respeito enorme pela cultura, pelo modo como ela aparece no game e por tudo o que ela significa. Não por acaso, há uma mistura muito interessante entre esses elementos mais tradicionais com aspectos do afrofuturismo.

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E, em terceiro, há a junção de tudo isso naquilo que é mais importante dentro de todo o jogo: a utilização dessa cultura como forma de contar história. 

A função básica de um mito é justamente criar uma narrativa que ajude o indivíduo a lidar com questões que parecem ir além de sua própria realidade, então trazer elementos da cultura africana — como o Impundulu e o próprio Kalunga, o deus da morte — devolvem a essas entidades míticas seu caráter original de traduzir sentimentos e situações, ilustrando condições inerentes da vida.

Propositalmente ou não, Tales of Kenzera: Zau é como uma lenda, um conto ou mesmo um mito clássico — e é isso que faz com que essa história tão pessoal de seu criador reverbere para muito além daquele caso. É uma história universal.

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Simples até demais

Só que um jogo precisa ir muito além de sua história e suas intenções. Ele também precisa ser uma experiência interativa — e é nesse ponto que Tales of Kenzera: Zau derrapa. Isso porque, apesar de ser um belíssimo metroidvania, ele acaba se contentando em fazer apenas o básico.

Longe de mim dizer que se trata de um game ruim. Quem for ter seu primeiro contato com o gênero a partir daqui vai encontrar uma jornada belíssima e uma exploração deste mundo fantástico de lendas bem satisfatório. Só que isso não muda o fato do quanto este é um jogo simples.

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Em um ano em que o metroidvania está em alta, com Prince of Persia ganhando dois títulos bem diferentes entre si e muito criativos, e que outras iniciativas independentes apostam em mecânicas cada vez mais inventivas, Tales of Kenzera se limita a seguir a cartilha e não entrega nada muito além do feijão com arroz.

O grande recurso de jogabilidade que ele oferece são as máscaras usadas por Zau, que alteram suas habilidades e golpes disponíveis. É algo que lembra bastante Outland, jogo da Ubisoft lançado em 2011 que traz essa ideia de polaridade em um jogo de plataforma. A ideia é o jogador alternar constantemente entre elas para encarar inimigos e outros desafios, mas nada muito elaborado.

Os próprios puzzles são bem simples, em geral se baseando na troca das máscaras do Sol e da Lua e usando aquele sistema de habilidades adquiridas típica de um metroidvania. Mais uma vez, não é nada mal feito, mas nada diferente do que qualquer outro gênero já faz.

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É por isso que a jogabilidade se torna o grande calcanhar de Aquiles de Tales of Kenzera. Afinal, em um game que se destaca tanto pela criatividade e pelo uso criativo da cultura e das experiências pessoais de seu autor para dar vida a algo único, é um pouco decepcionante ver mecânicas tão básicas e pouco inspiradas.

Não é nada que apague seu brilho, mas as histórias de Zau, Zuberi e principalmente Abubakar Salim mereciam um pouco mais do que isso.

Tales of Kenzera: Zau está disponível para PS5, Xbox Series X/S, Nintendo Switch e PC.