Perda inestimável: Observatório de Arecibo será desativado para evitar desastre
Por Daniele Cavalcante |
O Observatório de Arecibo, que durante muito tempo foi o maior radiotelescópio do mundo, terá sua antena parabólica desativada. Após o rompimento de dois cabos de sustentação, os engenheiros concluíram que um eventual reparo seria muito arriscado para os funcionários e para os equipamentos que ainda podem ser resgatados. Isso coloca um fim a quase 60 anos de história de um dos observatórios espaciais mais importantes do mundo.
- Observatório aéreo SOFIA volta a operar após paralisação devido ao coronavírus
- Observatório brasileiro de importância internacional tem futuro incerto
- Observatório histórico resiste a incêndio devastador nos EUA; amador é destruído
Localizado no município de Arecibo, em Porto Rico, o radiotelescópio foi construído no início da década de 1960 e entrou para a história dez anos depois, ao ser usado para enviar uma mensagem a civilizações alienígenas, em 1974. Em agosto de 2020, um dos cabos secundários escorregou do soquete e caiu sobre o prato refletor, deixando uma parte da estrutura em pedaços.
Após o incidente, múltiplas equipes trabalharam para avaliar os danos e as possibilidades de um reparo, um processo longo para garantir que não haveria nenhum risco para as equipes envolvidas no conserto. Contudo, no início de novembro, um segundo cabo se rompeu, deixando o equipamento suspenso ainda mais instável. Uma zona de segurança foi criada para proteger o prato, restringindo o acesso, e equipes independentes de engenheiros foram acionadas para analisar o problema.
Esses cabos sustentam uma plataforma de 900 toneladas que fica suspensa sobre a parabólica e permite que os cientistas direcionem o observatório para um trecho específico do céu. Ali, há antenas, transmissores de radar e muito mais, portanto, pode-se dizer que a plataforma suspensa é o coração científico do observatório.
Após considerar três relatórios das equipes de engenharia, a National Science Foundation (NSF), dona da instalação, decidiu que o observatório não está estável o suficiente. "Nosso objetivo é encontrar uma maneira de preservar o telescópio sem colocar a segurança de ninguém em risco", disse Sean Jones, da NSF. "No entanto, após receber e revisar as avaliações de engenharia, não encontramos nenhum caminho a seguir que nos permitiria fazê-lo com segurança”, concluiu.
Drones e câmeras foram usados para monitorar a estrutura e avaliar as condições dos cabos que restaram, e descobriram que alguns também estão danificados. De acordo com as análises de engenharia, se mais um cabo na Torre 4 romper, a plataforma desabará no prato refletor e provavelmente fará com que as torres também caiam. Ralph Gaume, diretor da Divisão de Ciências Astronômicas da NSF, disse que “mesmo tentativas de estabilização ou teste de cabos podem resultar na aceleração da falha catastrófica”.
Agora, a tarefa é elaborar um plano para desativar o telescópio de maneira controlada e segura, sem causar um desabamento da estrutura. A agência contratou engenheiros para desenvolver esse plano, o que levará algumas semanas. Os funcionários não disseram qual estratégia deve ser utilizada, mas mencionaram o potencial uso de helicópteros ou explosivos.
Uma perda para a ciência
Foi graças a um erro de cálculo na fase de design que o Arecibo se tornou tão icônico e importante. Ele foi projetado inicialmente para estudar a ionosfera terrestre, mas o erro nos cálculos fez com que seu prato fosse construído cerca de 10 vezes maior do que o necessário para essa pesquisa. Assim, ganhou uma parabólica de 305 metros de diâmetro, a maior do mundo até 2016, quando a China completou seu Telescópio Esférico de Abertura de Quinhentos metros (FAST).
Isso lhe permitiu fazer muito mais do que o planejado. Entre as principais áreas de pesquisa exploradas pelos pesquisadores no Arecibo estão as galáxias e os pulsares — cada uma com direito com um terço do tempo de observação do telescópio; o último terço é reservado aos estudos da ionosfera. É um dos principais instrumentos para procurar por novos pulsares, porque o tamanho permite buscas mais sensíveis.
Apesar de sua importância nessas áreas, ele ficou mais conhecido pela mídia como “telescópio que busca por extraterrestres”, em parte graças à famosa transmissão de sinal que ficou conhecida como “Mensagem de Arecibo”. Ela foi enviada em 16 de novembro 1974 ao espaço com informações sobre o planeta Terra e a civilização humana.
O envio foi realizado pelo projeto SETI com o uso do radiotelescópio porto-riquenho e direcionado para o Grande Aglomerado Globular de Hércules, localizado a aproximadamente 25.000 anos-luz de distância, e que possui cerca de 300.000 estrelas. Os 1679 impulsos de código binário levaram três minutos para serem transmitidos na frequência de 2380 MHz.
Seu radar planetário ainda era considerado uma raridade, sendo a maior instalação do mundo que poderia lançar um feixe em objetos próximos à Terra ou até em alguns dos planetas vizinhos. Com isso, os cientistas podem esperar o eco do feixe ser devolvido e analisá-lo. No caso dos asteroides, esse eco fornece informações para determinar se os objetos apresentam algum risco de colisão com a Terra.
A NSF agora trabalhará com os cientistas que planejavam usar o radiotelescópio em suas próximas pesquisas para realocar os projetos, direcionando-os a outras instalações, por exemplo — algumas delas ali mesmo, em Arecibo, caso seja possível desativar o telescópio de forma controlada, sem danificar o restante dos ativos do observatório, como o centro de visitantes e instrumentos de ciência atmosférica.
No entanto, essa instalação era única, principalmente para os que estudam os asteroides próximos à Terra. “Parte da ciência de Arecibo será transferida; parte não", disse Gaume.
Fonte: Space.com