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O espaço sideral é completamente silencioso?

Por| Editado por Patricia Gnipper | 03 de Setembro de 2021 às 09h20

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NRAO/AUI/NSF/S. Dagnello/Mary McLean/Daniele Cavalcante
NRAO/AUI/NSF/S. Dagnello/Mary McLean/Daniele Cavalcante

Em filmes mais antigos de ficção científica, é comum ouvirmos explosões e disparos de armas a laser no espaço, eventualmente arrancando alguns sorrisos irônicos do espectador mais atento. Afinal, o som não se propaga no vácuo e, portanto, nada faz barulho no espaço. Mas será mesmo? Bem, depende do que você chama de "som".

Se você estiver falando de algo que podemos ouvir, talvez a resposta seja decepcionante. Mas sabemos que há uma infinidade de sons que nossos animais domésticos conseguem ouvir, e nós não. Então, talvez seja preciso redefinir o que é o som para compreendermos melhor como ele se propaga — ou não — pelo universo.

O espaço sideral é mesmo silencioso?

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O som é feito de ondas que viajam pelo ar de maneira muito semelhante às ondulações em uma água parada ao jogarmos nela uma pedra. As ondas na água se espalham para longe, e quanto mais se afastam, mais enfraquecem — até que deixem de existir. Além de servir para compreendermos a natureza das ondas sonoras, essa analogia também revela uma coisa importante: as ondas precisam de um meio para se propagarem.

Em nosso planeta, esse meio é nossa atmosfera, composta por oxigênio e diversos tipos de gases. É graças à densidade do nosso ar que as ondas de som podem se propagar tão facilmente. Mas como isso acontece? É que elas carregam energia o suficiente para “empurrar” as partículas do ar, que por sua vez empurram as partículas detrás, e assim por diante. Quando essas ondas chegam aos seus ouvidos, são as partículas que vibram em seu tímpano para você ouvir.

Então, se o espaço é um grande vácuo, não há partículas para criar ondas sonoras. Portanto, o som não pode se propagar se estivermos flutuando pelo cosmos. E é aí onde mora a pegadinha: o espaço não é um vácuo absoluto! Na verdade, a natureza "odeia" o vácuo — as coisas pequeninas sempre vazam de algum lugar para preenchê-lo.

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Em nosso Sistema Solar, por exemplo, o Sol está sempre a emitir radiação, que nada mais é que luz em vários comprimentos de onda diferentes. A luz, por sua vez, é feita de fótons, uma partícula fundamental sem peso (ou massa, se preferir). Então, os fótons são arremessados pela nossa estrela o tempo inteiro em direção ao espaço interestelar, e atingindo todos os planetas — e é por isso que temos a luz do dia aqui na Terra.

Os fótons são apenas um exemplo para mostrar que o vácuo completo não existe no universo, mas eles não são as únicas partículas que existem entre os planetas do Sistema Solar. Os ventos solares, por exemplo, enviam constantemente partículas da coroa solar, tais como elétrons, prótons, e neutrinos.

Fora do Sistema Solar, isto é, no espaço interestelar, as partículas do Sol são bem mais escassas, mas ainda podem ser presentes. Prova disso é que aqui, em nosso "quintal cósmico", recebemos um pouco de radiação proveniente de outras estrelas, além de elementos espalhados por supernovas distantes. As sondas Voyager, por exemplo, deixaram o Sistema Solar e ainda conseguiram detectar plasma (sobre o qual falaremos mais adiante).

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Entretanto, há outros fatores a se observar se quisermos saber como é o som no espaço sem ir até lá para descobrir. Um deles é a densidade das partículas presentes nesses lugares. Por exemplo, as partículas dos ventos solares perto da Terra são em quantidades de aproximadamente 10 por centímetro cúbico. Em comparação à nossa atmosfera, isso é quase nada.

Por outro lado, os neutrinos são muito mais abundantes, embora eles não interajam com quase nada, o que certamente inclui objetos que vibram para tentar produzir som. Assim, provavelmente não ouviríamos o martelo cair na superfície lunar durante o experimento que comprovou uma das teorias da gravitação de Galileu Galilei. Contudo, perto do Sol, a densidade de partículas é muito maior, e talvez o som possa existir por lá.

Som através do plasma

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O plasma é nada mais que um dos estados da matéria, no qual o calor é tão intenso que os elétrons são arrancados dos átomos. Como resultado, a composição do plasma inclui elétrons livres, íons e partículas neutras. Há muitos lugares no universo onde podemos encontrar plasma, como nas estrelas e até no espaço interestelar, como as Voyager descobriram, e várias ondas sonoras podem ocorrer nele.

É aqui onde as coisas ficam interessantes, pois as ondas sonoras que se propagam em um plasma de baixa densidade, como a atmosfera superior de um planeta ou o vento solar, vibram em frequências que variam de alguns milhares de ciclos por segundo a alguns milhões de ciclos por segundo, e podem viajar a velocidades supersônicas.

Já em um plasma de alta densidade, como o interior das estrelas, vibra em uma ampla faixa de frequências e viajam em velocidades subsônicas ou supersônicas, dependendo da fonte da vibração. Então, sim, existe som na nossa estrela — inclusive ele pode ser usado para estudar o Sol.

Tipos de onda sonora em plasma

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Dependendo do meio e do tipo de plasma, as ondas sonoras podem ser de vários tipos. Por exemplo, as ondas sonoras que se propagam em um meio de plasma altamente ionizado, produzidas pela interação espontânea de partículas carregadas, são chamadas de ondas eletroacústicas.

As ondas sonoras eletroacústicas são dominadas por forças eletrostáticas e eletromagnéticas, que produzem várias flutuações na velocidade das partículas, em vez das colisões de partículas como ocorre com o som "normal". As velocidades médias desse tipo de onda podem ser o valor da velocidade da luz ao quadrado dividida pela velocidade do som ao quadrado.

Existe ainda outras categorias de ondas sonoras que se propagam em um meio de plasma altamente ionizado como as ondas magnetoacústicas. Elas são o resultado do acoplamento entre ondas eletromagnéticas e eletroacústicas devido à presença no meio de um campo magnético externo. Isso pode ser encontrado em lugares que recebem o vento solar ou uma magnetosfera planetária.

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Por fim, as ondas solares, conhecidas também como ondas heliosísmicas, são infra-som que ocorre no interior do Sol, sem outras perturbações no meio circundante. Em outras estrelas, essas ondas são conhecidas como ondas asterossísmicas. Elas são estacionárias e oscilam em períodos regulares e irregulares, variando de alguns minutos a várias horas. Elas viajam ligeiramente acima da velocidade normal do som.

Na região logo abaixo da superfície do Sol, está a zona de convecção, que atua como uma cavidade acústica na qual fluxos de gás quente formam granulações solares que sobem para a superfície. As ondas ficam presas nessa zona de convecção, oscilando repetidamente devido aos gradientes de temperatura e densidade.

Então o som se propaga onde existir plasma? Bem, sim e não. Acontece que, mesmo havendo partículas no espaço, a densidade é tão baixa que quaisquer sons emitidos por lá não poderiam ser percebidos pelos ouvidos humanos. Na verdade, as ondas provavelmente morreriam após percorrerem distâncias bem curtas.

O meio interestelar

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Se o vento solar e o plasma não são o suficiente para existir uma sinfonia de barulhos cósmicos, existe algum outro lugar onde haja algo além do completo silêncio? Talvez. As nuvens de poeira e gás, existentes por várias regiões do universo, principalmente em galáxias onde estrelas nascem, é possível que haja densidade o suficiente para que as partículas transmitam energia na forma de ondas sonoras.

Nada disso significa que você ouviria esses sons, se pudesse ir ao espaço e tirar o capacete sem sufocar. Acontece que as variações de pressão desses sons são muito fracas para mover o tímpano: são bilionésimos de Pascal, equivalente a 100dB negativos de nível de pressão sonora. Por sinal, decibéis negativos são possíveis porque o dB não é uma unidade de medida universal, e sim uma grandeza relativa.

Esse valor (-100dB) significa algo tão silencioso que você precisaria de um tímpano do tamanho do planeta, ou ainda maior, para ouvir qualquer som. Além disso, mesmo que os sons pudessem mover nossos tímpanos, ainda não conseguiríamos ouvir nada, porque esses sons estão na faixa de frequência ultrabaixa (ULF). A nossa faixa auditiva é de cerca de 20 a 20.000 Hertz, enquanto os sons do espaço são cerca de 20 mil vezes mais baixa que isso.

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Mas existe uma maneira de ouvir esses sons, através de satélites sensíveis que monitoram o ambiente espacial da Terra. Eles podem medir o movimento das partículas, ou seu efeito no campo magnético no espaço. Com esses dados, os cientistas podem amplificar as gravações dos satélites e acelerar bastante a reprodução — o resultado é algo que pode ser editado para, finalmente, entrar na faixa audível dos seres humanos.

Ouvir essas ondas captadas por satélites são extremamente úteis para a ciência, pois permite descobrir fenômenos que, de outra forma, não poderiam ser detectados. Em 2003, por exemplo, o Chandra X-ray Observatory da NASA conseguiu captar um som cósmico, que veio da galáxia Perseus, a mais de 250 milhões de anos-luz de distância. O som foi medido e tratava-se de um buraco negro, em Si bemol, em uma frequência bilhões de vezes abaixo da faixa dos ouvidos humanos.

Fonte: ENT & Audiology, The Fact Site, The Path of Sound