Substituir açúcar por adoçante faz bem ou mal para a saúde? Médico responde
Por Júlia Putini • Editado por Luciana Zaramela | •
Adoçante faz bem para a saúde. Será? Um novo estudo publicado em setembro na revista científica Nature vai na contramão dessa informação, que se tornou senso comum. Mais abaixo, veja também as quatro principais perguntas sobre o assunto respondidas por um médico nutrólogo.
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Para a pesquisa, desenvolvida no Instituto de Ciências Weizmann, em Israel, foram dados três tipos de adoçantes para ratos: sacarina, sucralose e aspartame.
Após 11 semanas, os animais alimentados com sacarina, em comparação com aqueles alimentados apenas com glicose, apresentaram intolerância à glicose. Esse fator indica maior chance de desenvolver distúrbios metabólicos.
Essa é a primeira vez que surge uma evidência de que os adoçantes podem estar exacerbando doenças metabólicas e também que isso pode acontecer através da microbiota intestinal. A microbiota é a comunidade de bactérias que mora no intestino, responsável por manter a saúde intestinal e auxiliar na digestão.
A equipe também usou dados de um estudo clínico de nutrição feito com quase 400 pessoas. Entre esses indivíduos, também foi possível notar uma correlação entre sinais clínicos de distúrbios metabólicos (como aumento de peso ou menor eficiência na metabolização da glicose) e consumo de adoçantes artificiais.
Mas, afinal, o uso de adoçante faz bem ou mal para a saúde? Veja perguntas e respostas feitas pelo Canaltech ao médico nutrólogo Matheus Azevedo.
Aliado ou vilão?
Segundo o médico, os adoçantes podem ser bem úteis em alguns casos, principalmente para quem tem diabetes, obesidade ou resistência à insulina. Quando usados com moderação, ajudam no controle da glicemia e até no gerenciamento de peso.
"Mas é aquela coisa: o exagero ou o uso de certos tipos de adoçantes pode trazer efeitos não tão legais, como mudanças na microbiota intestinal, desconforto no estômago e, em algumas pessoas, até aumentar o apetite. Então, sempre vale a pena avaliar caso a caso e, se possível, contar com uma orientação profissional", ressalta o profissional.
Vale a pena substituir?
Cada caso deve ser analisado individualmente para ponderar sobre qual a melhor escolha. No entanto, Azevedo destaca que podem ser de grande ajuda em três casos:
- Para o controle do peso, já que têm menos ou até nenhuma caloria, o que contribui para reduzir a ingestão calórica total;
- Para o controle da glicemia, especialmente para quem tem diabetes ou pré-diabetes, porque não impactam os níveis de açúcar no sangue como o açúcar comum faz;
- No combate às cáries, uma vez que adoçantes como o xilitol ajudam a inibir o crescimento da bactéria Streptococcus mutans, que está associada ao surgimento de cáries.
Qual a diferença entre adoçantes?
De acordo com Azevedo, é possível dividir os adoçantes em dois grupos: os naturais e os artificiais. Cada grupo tem entre três e quatro principais representantes. São eles, entre os naturais:
- Stevia: derivada da planta chamada Stevia rebaudiana, tem zero calorias e não altera a glicemia;
- Eritritol: com poucas calorias, quase não impacta o açúcar no sangue;
- Xilitol: tem baixo impacto glicêmico e ajuda na saúde dos dentes.
E não é porque são naturais que não apresentam riscos de efeitos adversos. O médico faz também um alerta: "polialcoóis, como o xilitol e o eritritol, em doses altas, podem causar desconfortos gastrointestinais, como gases, inchaço e até diarreia".
Já entre os artificiais, estão:
- Aspartame: feito de aminoácidos, deve ser evitado por quem tem fenilcetonúria, doença ocasionada pela falta de capacidade do fígado em metabolizar aminoácidos.
- Sacarina: possui um sabor residual forte, o que faz com que seja preterida por muitos.
- Ciclamato: não altera o sabor dos alimentos, mas se consumido em abundância pode causar diarreia.
- Sucralose: talvez o mais popular, vem da cana-de-açúcar e possui sabor semelhante ao açúcar tradicional.
"A sucralose está entre os adoçantes que podem alterar a microbiota intestinal, então é bom usar com moderação", reitera Azevedo. Esse também é o caso da sacarina, que mostrou alterar a microbiota dos ratos no estudo israelense.
Quais os riscos associados ao consumo de adoçantes?
Entre os riscos associados ao consumo de adoçantes estão: alterações na microbiota, efeito rebote no apetite, impactos metabólicos e câncer.
Azevedo explica que alguns, como a sucralose, podem alterar a microbiota intestinal, como também foi descrito no estudo israelense, mas causado pela sacarina. "Isso significa que eles podem mudar a composição das bactérias boas no intestino, o que pode trazer impactos para a saúde geral", afirma Azevedo.
Além disso, ele destaca o efeito rebote no apetite. Alguns adoçantes acabam estimulando ainda mais a vontade de comer doces, o que pode dificultar o controle do peso.
"Tem também a questão dos possíveis impactos metabólicos. O uso exagerado pode interferir na forma como percebemos o sabor doce e até no funcionamento do metabolismo", afirma o médico.
Quanto ao câncer, ele destaca que as pesquisas mais recentes não indicam um risco significativo de câncer intestinal quando os adoçantes são consumidos dentro dos limites aceitáveis. "Mas, para quem tem histórico familiar de câncer, é sempre bom ser ainda mais moderado e conversar com um médico", finaliza Azevedo.
Para saber as quantidades ideais e recomendadas de adoçante, o ideal é procurar um nutrólogo ou nutricionista. O profissional fará uma série de análises e cálculos e saberá estipular a dosagem correta para cada indivíduo, de acordo com seu peso, altura, índice glicêmico, dieta e grau de atividade.
Em nota, a Associação Brasileira da Indústria de Alimentos para Fins Especiais e Congêneres (ABIAD) emitiu um posicionamento sobre as novas pesquisas no ramo, afirmando que os edulcorantes são seguros para consumo.
"Estes adoçantes foram amplamente avaliados por órgãos reguladores internacionais e nacionais, como a ANVISA no Brasil, a Administração de Drogas e Alimentos dos EUA (FDA) e a Autoridade Europeia de Segurança Alimentar (EFSA). Todos passaram por rigorosas análises, com avaliações de segurança conduzidas pelo Comitê de Especialistas em Aditivos Alimentares da FAO/OMS (JECFA) e são considerados seguros para a saúde.
Há estudos independentes que questionam os efeitos dos edulcorantes na saúde da população, sugerindo que podem contribuir para o ganho de peso e afetar negativamente o metabolismo. No entanto, tais estudos, em maioria observacionais, são limitados a associações e não são capazes de estabelecer causalidade. Estes estudos envolvem indivíduos com condições pré-existentes, como sobrepeso e obesidade, o que pode influenciar nos resultados.
A entidade internacional de edulcorantes, ISA (International Sweeteners Association) destacou recentemente que adoçantes sem ou de baixas calorias podem ajudar a reduzir a ingestão de açúcares e fazer parte de uma alimentação e de um estilo e vida equilibrados e saudáveis. Duas revisões sistemáticas e meta-análises de ensaios clínicos randomizados (ECRs)1 e de estudos observacionais2, ambos em humanos, indicaram potenciais benefícios cardiometabólicos quando as bebidas com adoçantes sem ou de baixas calorias são utilizadas em vez de produtos açucarados por pessoas que vivem com ou em risco de obesidade ou diabetes.
Quando se trata do aspartame, o JECFA reafirmou sua segurança ao revisar todas as evidências disponíveis, mantendo a Ingestão Diária Aceitável (IDA) em 40 mg/kg de peso corpóreo/dia. Em termos práticos, o consumo de 2400 mg de aspartame para um adulto com 60kg seria a ingestão de 45 a 50 latas de refrigerante zero por dia. Essa recomendação baseia-se em estudos rigorosos, que não apontam riscos para a saúde quando consumido nas quantidades indicadas.
A ABIAD reitera que os adoçantes são uma opção segura e benéfica para aqueles que buscam reduzir a ingestão de açúcar e calorias. A Associação seguirá monitorando os avanços científicos e colaborando com autoridades competentes para assegurar que a sociedade tenha acesso a informações baseadas em ciência, promovendo a confiança no uso seguro e consciente dos adoçantes."
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Fonte: Nature