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Por que a depressão afeta tantos humoristas?

Por| Editado por Luciana Zaramela | 30 de Maio de 2022 às 11h14

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Divulgação/Magnolia Pictures
Divulgação/Magnolia Pictures

Diversos estudos já destacaram que o riso pode proporcionar diversos benefícios à saúde mental. Mas se esse é realmente o caso, por que a depressão afeta tantos humoristas? Não faltam exemplos de comediantes do Brasil ou de outros países que se depararam com a condição. Qual a teoria, então, dos especialistas da psicologia e da psiquiatria?

O renomado Robin Williams protagonizou um dos casos mais famosos de depressão em humoristas, uma vez que foi um dos fatores contribuintes para seu suicídio, em 2014. Conforme comentam pesquisadores por trás de um artigo da Trends Psychiatry Psychother, Williams apresentava problemas de relacionamento, problemas financeiros e dependência de drogas.

Em entrevista ao programa norte-americano Good Morning America, a viúva Susan Williams mencionou, ainda, que o comediante tinha sido diagnosticado com demência por corpos de Lewy, cujos sintomas são muito semelhantes aos do Alzheimer: perda de memória, desorientação e problemas para se recordar, pensar, compreender, comunicar e controlar o comportamento. Segundo Susan, o declínio progressivo em suas habilidades mentais começou a afetá-lo profundamente.

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Jim Carrey também já falou abertamente sobre a depressão e chegou inclusive a lançar um documentário chamado I Needed Color, que traz à tona a forma como a pintura o ajudou a lidar com a condição, contra a qual tem lutado durante grande parte de sua vida. Anteriormente, o Canaltech conversou com um arteterapeuta para entender os efeitos da arte na mente humana.

Depressão em humoristas

De acordo com o dr. Luiz Scocca, psiquiatra pelo Hospital das Clínicas da USP e membro da Associação Americana de Psiquiatria (APA), o humor é uma ferramenta que ajuda no dia a dia, e assistir a comédias de fato traz impactos benéficos à saúde mental. Mas o comediante trabalha com isso, o que muda a situação.

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"Apesar de trabalhar com humor, o comediante não está livre desse quadro, assim como um ortopedista não está livre de quebrar o braço. A depressão é um transtorno mental grave que tem seu componente biológico, relacionado à produção de substâncias como serotonina, dopamina e noradrenalina", menciona o especialista. A conclusão é que a depressão pode atingir qualquer um, independente da profissão, da classe econômica ou de qualquer outro fator. Ninguém está imune.

O psiquiatra observa, ainda, que é muito comum alguém ter depressão "sem demonstrar", porque as pessoas, de modo geral, imaginam o paciente como alguém triste o tempo inteiro, sendo que um dos pilares da doença é a sensação de vazio, a falta de capacidade de sentir prazer, e não necessariamente a tristeza em si.

O psicólogo e doutor em neurociência do comportamento Yuri Busin complementa as afirmações de Scocca ao descrever a depressão como uma "falta de resposta para o mundo", acompanhada de sintomas como insônia, distúrbio alimentar, dificuldade em realizar qualquer tarefa.

"A gente tem uma idealização de que humoristas estão sempre bem-humorados, felizes, mas muitas pessoas com depressão continuam executando os trabalhos normalmente, então acaba passando despercebido. Acabamos presumindo que pessoas que trabalham com humor estão em um bom momento de vida, mas isso não é necessariamente verdade", pontua.

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Busin ressalta que isso também pode se aplicar não só aos palcos, mas também aos nossos arredores, ou seja: pessoas que parecem bem-humoradas podem ter depressão ou ansiedade, e em alguns casos, até mesmo utilizam do humor como uma forma de defesa, para não mostrar ao mundo a fragilidade.

Perspectiva de quem viveu na pele

Antes de conquistar espaço no mundo do stand-up e alcançar milhares de seguidores em suas redes sociais, o humorista Osvaldo Barros atuava voluntariamente como palhaço em hospitais. "Comecei pensando no bem que eu fazia para as pessoas, e eu ficava bem de fazer uma boa ação", relembra.

Já na ocasião, Osvaldo ficava sabendo, via relatos de familiares, que sua visita despertava "o primeiro sorriso desde a internação" de alguns pacientes. Ao passar para o stand-up, o feedback só fez aumentar, e o humorista passou a receber mensagens nas redes sociais, de pessoas com depressão que passaram a consumir seu conteúdo em busca de alívio.

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Por outro lado, o próprio humorista chegou a enfrentar períodos de depressão em sua vida. Osvaldo reconhece que os principais fatores contribuintes estão relacionados à pressão das redes sociais e ao estresse por trás dos palcos. "Subir no palco e contar piadas é só a 'ponta do iceberg'. Eu tenho que pensar em piadas, escrever, correr atrás para promover os shows, montar. Tudo isso é muito estressante", conta.

"Passei pela depressão por me cobrar muito sobre ser bem-sucedido. Comecei a ver humoristas que começaram depois de mim ganhando destaque maior, e eu sem conseguir acompanhar o ritmo das redes sociais. Não compreendia que eu teria que me adaptar. Achei que tinha ficado para trás e que era um caminho sem volta. Eu me senti incapaz. Foi um período bem difícil", relata o humorista.

Osvaldo revela que já houve casos em que um colega de profissão precisou conduzir uma apresentação mesmo em momentos de luto. Em sua vivência, nunca houve uma situação extrema a tal ponto, mas já chegou a se sentir muito "pequeno e inútil" em determinados shows, mesmo diante dos risos da plateia. "Eu achava que não estava sendo bom o suficiente. Achava que ninguém estava me notando como humorista, e que eu era um coadjuvante naquela noite", conta.

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O comediante relembra situações em que as pessoas o julgaram por demonstrar algum sentimento negativo, como a raiva. "É muito pequeno achar que a pessoa é 24 horas humorista. As pessoas confundem muito, o humorista pensa tecnicamente na graça. Todo comediante tem um pouco da melancolia não por ser comediante, mas por ser humano. Não é por fazer os outros rirem que nós somos felizes e engraçados 24 horas por dia", conclui.

Fonte: Com informações de Trends Psychiatry Psychother, Edge Foundation