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Neurotransmissores: conheça um pouco da química produzida pelo nosso cérebro

Por| Editado por Luciana Zaramela | 09 de Abril de 2021 às 10h00

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LightFieldStudios/envato
LightFieldStudios/envato

Mesmo na atualidade, a ciência e a medicina continuam em constante busca para desvendar os enigmas do cérebro, trazendo à tona novas informações sempre que possível. Nesse sentido, uma das complexidades que mais chamam a atenção é a produção de substâncias, principalmente num contexto onde percebemos tanta importância na saúde mental.

Para entender quais são as principais substâncias produzidas no cérebro humano e o efeito delas enquanto neurotransmissores, a equipe do Canaltech conversou com Dr. Fabio Porto, neurologista comportamental do Hospital das Clínicas de São Paulo, e com o Dr. Renato Andrade Chaves, neurocirurgião.

Como o cérebro produz química

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Os especialistas explicam que as substâncias produzidas no cérebro integram um grupo chamado monoaminas, que atuam no corpo humano como neurotransmissores. Cada uma tem um formato diferente, e é produzida numa região diferente do cérebro.

"Cada neurotransmissor tem uma função e uma localização específica. Na verdade, é como se fosse uma orquestra em que vários instrumentos trabalham para fazer um som final. Muito difícil dizer que um determinado neurotransmissor funciona para determinada tarefa", explica Dr. Fabio.

Segundo o neurologista, todos esses neurotransmissores funcionam através da transmissão sináptica, que ocorre quando um neurônio se comunica com outro. O primeiro neurônio se chama pré-sináptico, enquanto o segundo se chama pós-sináptico. Quando um neurônio estimula outro — ou seja, passa o impulso elétrico para outro — libera neurotransmissores no espaço entre eles, que por sua vez se chama fenda sináptica.

"A comunicação entre um neurônio e outro se dá por vários neurotransmissores. Cada área do cérebro tem o predomínio de um neurotransmissor.", esclarece Dr. Fabio. "As áreas do cérebro responsáveis pela liberação dos neurotransmissores são o córtex motor, o sistema límbico e o tronco cerebral", acrescenta Dr. Renato.

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As substâncias

Existem inúmeras substâncias químicas, inúmeros neurotransmissores, o que torna essa área da neurologia muito mais complexa do que imaginamos. No entanto, Dr. Fabio reitera a importância de compreender que o trabalho em equipe é o que faz o cérebro trabalhar de maneira afinada, ainda que exista sempre o predomínio de um ou outro neurotransmissor para determinada função. De qualquer forma, trazemos aqui as substâncias mais debatidas entre cientistas e leigos — e resumimos em poucas linhas o que cada uma delas faz.

Dopamina

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A dopamina é produzida numa região chamada substância negra, que fica no tronco cerebral, mais especificamente no mesencéfalo (uma estrutura responsável por algumas funções como a visão, audição, movimento dos olhos e movimento do corpo). Dr. Fabio relembra que a dopamina é, por exemplo, o neurotransmissor que fica reduzido na doença de Parkinson, proporcionando rigidez muscular e dificuldade na movimentação.

O neurologista explica que a dopamina tem muito a ver com a questão motora e com o processamento de recompensa. Inclusive, entramos nesse mérito em uma matéria de julho do ano passado, sobre vídeos satisfatórios. "A falta de dopamina muitas vezes causa apatia, a pessoa não consegue sentir prazer, ou em situações de muito estímulo dopaminérgico, a pessoa fica viciada, tem dificuldade de controlar impulso", acrescenta.

Serotonina

Enquanto isso, a serotonina é produzida em outra região do cérebro chamada de núcleo da rafe. "Também fica no tronco cerebral, mas na ponte, em outro ponto. Tanto a dopamina quanto a serotonina são sintetizadas em pontos específicos do cérebro, mas depois se espalham para várias regiões do órgão. Cada uma tem uma função de modular um certo domínio", explica Dr. Fabio. 

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Dr. Renato completa que a serotonina está diretamente relacionada com o humor das pessoas. "É derivada do triptofano [um aminoácido essencial, utilizado pelo cérebro junto com a vitamina B3] e grande causa da depressão", explica o neurocirurgião. Assim, quando uma pessoa tem depressão, os especialistas costumam indicar remédios que aumentam [os níveis da] serotonina, visando a melhora de seu estado.

Endorfina

Já a endorfina é produzida na hipófise (uma glândula localizada na base do cérebro que tem as funções de regular o trabalho das glândulas suprarrenal, tireoide, testículos e ovários), tal como outros pontos do cérebro. "Tem muito a ver com a modulação de estímulos dolorosos, mas também com recompensa. Classicamente, quando se faz exercícios, tem-se a liberação de endorfina. Então a endorfina é um dos neurotransmissores que modulam essa sensação de prazer", afirma Dr. Fabio.

Dr. Renato completa que a endorfina pode ser também considerada uma morfina endógena, ou seja, que se origina no interior do organismo.

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Histamina

No hipotálamo (localizado na base do encéfalo, tendo mais ou menos o tamanho de uma amêndoa e responsável por coordenar a maior parte das funções endócrinas e agindo sobre a regulação da temperatura, apetite, sede, ciclo do sono e sistema nervoso), a histamina regula funções térmicas e relacionadas ao despertar. Enquanto isso, no restante do organismo a histamina é importante para regular o fluxo sanguíneo e a resposta à inflamação.

Acetilcolina

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Já a acetilcolina envolve a atividade de áreas cerebrais relacionadas à atenção, aprendizagem e memória. É liberada por núcleos chamados colinérgicos, e atua na boa digestão e no relaxamento muscular.

Noradrenalina

A noradrenalina, por sua vez, está relacionada com a excitação física e mental e ao bom humor. A produção é centrada na área do cérebro chamada de locus coeruleus (uma parte pequena e azulada do tronco cerebral). A falta de noradrenalina também costuma ser associada a transtornos depressivos.

GABA

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O Ácido gama-aminobutírico (GABA) é o principal neurotransmissor inibidor no sistema nervoso central. É sintetizado a partir do glutamato (um dos neurotransmissores mais importantes do nosso sistema nervoso). "O GABA é um neurotransmissor não estimulante, e é responsável por abaixar a atividade cerebral", aponta Dr. Renato.

Como liberar essas substâncias?

Determinadas atividades podem desencadear a produção dessas substâncias. Os especialistas trazem alguns exemplos: no caso da dopamina, por exemplo, essa recompensa vem de alguma atividade particularmente prazerosa, como comer um chocolate, e quando se consegue resolver conflitos, tornar situações estáveis, equilibradas, os especialistas entendem que tem modulação da serotonina. Para desencadeá-la, é preciso realizar atividades que te deixam alegre, realizado.

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Já a endorfina está muito relacionada com a prática de exercícios. "Mas é muito mais um trabalho em equipe, em conjunto, do que 'comeu doce, liberou dopamina, fez exercício, liberou endorfina'. Isso é uma simplificação, na verdade", aponta Dr. Fabio.

Para o neurologista, a importância de se entender esses neurotransmissores é conseguir manipular isso farmacologicamente. "A gente não consegue mudar a estrutura do cérebro, mudar as conexões cerebrais. Por outro lado, a gente consegue aumentar ou reduzir os neurotransmissores", afirma. O especialista exemplifica que se uma pessoa está com anedonia, sem sentir prazer, há tratamentos que podem aumentar a dopamina. "A dopamina em excesso às vezes causa delírio, alucinação, psicose. A gente pode reduzir", observa.

Já a serotonina, quando está reduzida, é associada a estados depressivos, por isso alguns remédios inibem a recaptação da substância no organismo, aumentando seus níveis no sangue. "Quanto à endorfina, a gente consegue sintetizar algumas substâncias que são derivadas, chamadas de opióides. A morfina, por exemplo, é um equivalente à endorfina, mas é externa. O entendimento desses neurotransmissores permite à medicina desenvolver e até modular um pouco algumas funções do cérebro que têm a ver com os neurotransmissores. Essa é a principal importância. Quando você entende a fisiologia, é muito mais fácil tentar desenvolver uma medicação para normalizar a química do cérebro", conclui.