Pesquisadores estudam os efeitos genéticos da radiação de Chernobyl em humanos
Por Fidel Forato • Editado por Patricia Gnipper |
O acidente na usina nuclear de Chernobyl, na Ucrânia, completa 35 anos nesta segunda-feira (26). Depois de três décadas, os pesquisadores ainda investigam os efeitos potenciais à saúde da exposição à radiação ionizante daquelas pessoas, através de ferramentas genômicas. Na última semana, dois novos estudos sobre a questão foram publicados na revista científica Science.
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Liderada por pesquisadores do National Cancer Institute (NCI) — parte do National Institutes of Health (NIH) dos Estados Unidos —, uma rede de cientistas de todo o mundo investigou quais formas a exposição a diferentes doses de radiação, durante o acidente de Chernobyl na Ucrânia, impactaram as características genéticas das vítimas.
No primeiro estudo científico, o objetivo era encontrar evidências de que a exposição à radiação para os pais resultou em novas mudanças genéticas sendo passadas de pais para filhos. No entanto, não foram identificadas provas concretas dessa suspeita, o que pode apontar para a limitação dos estragos radioativos a uma única geração. O outro estudo analisou a estrutura de tumores de pessoas que desenvolveram câncer de tireoide após serem expostas, quando crianças ou fetos, à radiação.
"Nos últimos anos, os avanços na tecnologia de sequenciamento de DNA nos permitiram começar a abordar algumas das questões importantes, através de análises genômicas abrangentes realizadas em estudos epidemiológicos bem planejados", explicou o pesquisador Stephen J. Chanock, diretor da Divisão de Epidemiologia e Genética do Câncer (DCEG) do NCI, nos EUA, sobre as investigações que buscam entender os efeitos da radiação ao longo dos anos.
Inclusive, as novas pesquisas dependeram, diretamente, do Banco de Tecidos de Chernobyl, fundado há mais de 20 anos e que preservou amostras do acidente nuclear. Curiosamente, a fundação ocorreu antes mesmo da ciência alcançar o nível técnico para conduzir os estudos genômicos realizados agora.
Efeitos da radiação podem ser transmitidos de pais para filhos?
Para entender se a exposição à radiação pode resultar em mudanças genéticas que, por sua vez, podem ser transmitidas de pais para filhos, a equipe de pesquisadores liderada por Chanock analisou o genoma completo de 130 pessoas que nasceram entre os anos de 1987 e 2002. Além disso, estes genomas foram comparados com os dos respectivos pais.
O interessante é que, para ser incluído no grupo de estudo, pelo menos um dos pais precisou ter participado nas atividades de socorro no pós-acidente nuclear ou ter sido evacuado, na época, por morarem perto do local do acidente. Como essas pessoas, envolvidas na tragédia, foram expostas a diferentes doses de radiação ionizante, os riscos de cada caso também foram considerados na análise.
Para a gama de exposições à radiação experimentada pelos pais, os pesquisadores não encontraram evidências de mutações que foram transmitidas de forma hereditária e nem de um número maior de mutações "de novo" — aquelas que ocorrem aleatoriamente em um óvulo ou esperma — nos filhos nascidos após 46 semanas do acidente nuclear e até 15 anos depois. Dessa forma, é possível concluir que o acidente teve um impacto mínimo, se algum, na saúde da geração seguinte.
A partir desta conclusão, o pesquisador Chanock comenta que os dados são "muito tranquilizadores para as pessoas que viviam em Fukushima na época do acidente em 2011". Isso porque "as doses de radiação no Japão são conhecidas por terem sido menores do que as registradas em Chernobyl", complementa.
Relação do câncer de tireoide com o acidente nuclear de Chernobyl
No segundo estudo, os pesquisadores usaram o sequenciamento para traçar o perfil das mudanças genéticas nos cânceres de tireoide de 359 pessoas expostas na infância ou no útero à radiação ionizante que foi liberada pelo acidente de Chernobyl. Para fins comparativos, o estudo também verificou 81 indivíduos que não foram expostos e que nasceram mais de nove meses após o acidente, mas que desenvolveram o mesmo tipo de câncer por outros fatores.
De acordo com a equipe de pesquisa, o aumento do risco de câncer de tireoide foi um dos efeitos adversos à saúde mais observados após o acidente nucelar. Inclusive, este foi um dos fatores que motivaram o estudo a comparar, exclusivamente, casos de tumores na tireoide. Os cânceres de tireoide que ocorreram em pessoas expostas a doses mais altas de radiação, durante a infância, eram mais propensos a resultar de fusões gênicas. Isso significa que a formação do tumor se deu quando as fitas do DNA foram rompidas, no local inicial, e as partes se conectaram de forma inesperada.
Por outro lado, as pessoas que não foram expostas ou que estiveram expostas a baixos níveis de radiação apresentaram outras causas principais para a formação do tumor na mesma região. A partir dessas descobertas iniciais, novos estudos devem investigar de que forma a radiação pode estimular a formação de tumores.
Para acessar o estudo que investigou alterações genéticas transmitidas, de forma hereditária, após a exposição à radiação, clique aqui. Para conferir o artigo sobre a relação do câncer de tireoide com o acidente nuclear, acesse aqui.
Fonte: NIH