Fiocruz: detecção de bactérias resistentes a antibióticos triplicou na pandemia
Por Fidel Forato • Editado por Luciana Zaramela |
Entre janeiro a outubro deste ano, mais 3,7 mil amostras de bactérias resistentes a antibióticos foram identificadas pelo Laboratório de Pesquisa em Infecção Hospitalar do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz). Este número de superbactérias — como são chamados os agentes infecciosos que resistem aos remédios comuns — é três vezes maior do que o registrado no período pré-pandemia da covid-19, durante o ano de 2019.
Em 2019, pouco mais de mil casos de superbactérias foram encaminhados, por diferentes laboratórios de saúde pública brasileiros, para análise completa da Fiocruz e, posteriormente, confirmados como agentes resistentes aos antibióticos.
Em 2020, primeiro ano da pandemia da covid-19, o número de amostras positivas passou para quase 2 mil, o que também chamou a atenção. A tendência de aumento nos registos de superbactérias reforça uma preocupação dos especialistas: durante a emergência da covid-19, também ocorre o aumento na disseminação de microrganismos capazes de resistir a diversos antibióticos, o que pode ser um risco para a saúde pública.
"Não temos como precisar a dimensão do problema em nível nacional, mas é importante agir e isso tem sido reforçado pela Anvisa [Agência Nacional de Vigilância Sanitária]”, comenta a pesquisadora e chefe do Laboratório de Pesquisa em Infecção Hospitalar, Ana Paula Assef. Nesse sentido, o desafio pode ser ainda maior.
Vale explicar que este centro de análise da Fiocruz atua como um laboratório de retaguarda da Sub-rede Analítica de Resistência Microbiana em Serviços de Saúde (Sub-rede RM), instituída pela Anvisa e pelo Ministério da Saúde (MS).
Antibióticos agem apenas contra bactérias
Uma das justificativas para as bactérias resistentes se tornarem mais comuns está no uso excessivo de antibióticos.“Existem bactérias vivendo no nosso organismo, nos animais e no ambiente. Sempre que usamos antibióticos, em unidades de saúde, em casa ou na agropecuária, aumentamos a pressão seletiva sobre esses microrganismos. Isso acelera a emergência e a disseminação da resistência, pois as bactérias conseguem transmitir os mecanismos de resistência umas para as outras”, explica Assef.
Com a covid-19, as prescrições destes remédios cresceram de forma muito acentuada e permitiu que as bactérias se tornassem mais resistentes. "Em parte, a alta na prescrição de antibióticos nos hospitais durante a pandemia pode ser justificada pelo maior número de pacientes graves internados, que acabam desenvolvendo infecções secundárias e necessitando desses medicamentos. Porém, o uso excessivo precisa ser controlado para evitar que se impulsione a resistência bacteriana”, reforça.
Afinal, a covid-19 é causada por um vírus. E vírus podem ser combatidos com antivirais, como o potencial Molnupiravir, da farmacêutica MSD. O uso dos antibióticos é restrito para bactérias e não funciona como profilaxia contra o coronavírus, por exemplo. Outro risco é o indivíduo que começa a fazer o tratamento, mas o abadona antes do fim, permitindo que algumas bactérias resistam em seu organismo.
“Não se pode tomar antibiótico por indicação de conhecido ou familiar. Para que esses medicamentos continuem eficazes, eles devem ser usados com critério, apenas com prescrição médica. O paciente precisa seguir a receita de forma irrestrita, com a quantidade de dose e duração da administração exatas”, lembra a microbiologista.
Superbactérias e alta mortalidade
Em agosto deste ano, a Anvisa publicou uma nota técnica com orientações para prevenção e controle da disseminação de bactérias resistentes em serviços de saúde no contexto da pandemia. O texto reforça que, no cenário da covid-19, os antibióticos são recomendados apenas para os casos com suspeita de infecção bacteriana associada à infecção viral do coronavírus.
Além disso, é importante explicar que infecções causadas por bactérias resistentes, geralmente, estão associadas à alta mortalidade, já que não existem remédios eficazes para a maioria dos tratamentos. Inclusive, a nota destaca um surto registrado em uma Unidade de Terapia Intensiva (UTI) de Maringá, no Paraná. No local, dez pacientes internados por covid-19 infectados por bactérias A. baumanii resistentes a antibióticos carbapenêmicos, sete morreram em decorrência da infecção.
Fonte: Agência Fiocruz e Anvisa