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Febre maculosa: doença é endêmica no sudeste brasileiro?

Por| Editado por Luciana Zaramela | 16 de Junho de 2023 às 21h45

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Milan Wulf/Pixabay
Milan Wulf/Pixabay

No Brasil, os primeiros casos de febre maculosa, também conhecida como doença do carrapato, são de 1929. Na época, a bactéria da família Rickettsia foi identificada em pessoas que viviam nos estados de São Paulo e Minas Gerais. Mais de 90 anos depois, a infecção continuou a se espalhar localmente. Hoje, todo o sudeste brasileiro é endêmico para a doença mortal, caso não seja tratada adequadamente.

Nos últimos 17 anos — de janeiro de 2007 até o começo de junho de 2023 —, o sudeste brasileiro concentrou quase todas as mortes por febre maculosa, conforme aponta boletim do Ministério da Saúde. Na região, a Saúde estima que “as taxas de letalidade passam de 50%”. Fora de São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Espírito Santo, alguns poucos óbitos foram identificados ao longo de todos esses anos, como em Pernambuco (1 morte), Mato Grosso (2) e Paraná (5).

Pensando especialmente no estado de São Paulo, uma das regiões endêmicas para a febre maculosa é a cidade de Campinas, localizada a menos de 100 km da capital. Neste ano, o município já acumula nove casos da doença do carrapato-estrela, sendo que seis pacientes faleceram em decorrência da infecção bacteriana.

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Para entender o que é conviver com a infecção de forma endêmica, os riscos envolvidos e o problema que o carrapato-estrela representa, o Canaltech entrevistou Andrea Paula Bruno von Zuben, diretora do departamento de vigilância em saúde da Secretaria Municipal da Saúde de Campinas (DEVISA/SMS) e professora da pós-graduação da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). "Campinas têm casos de febre maculosa há cerca de 20 anos na sua área rural e periurbana", adianta a especialista.

Quando é uma endemia, pandemia, epidemia ou surto?

Os termos usados no monitoramento epidemiológico, como endemia, pandemia, epidemia e surto, normalmente causam confusão em pessoas que não são da área de saúde. Basicamente, eles são usados para dimensionar o tamanho e a intensidade de uma doença.

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Por exemplo, a pandemia é a expressão mais grave de todos, já que faz referência a uma doença que está se espalhando, de forma simultânea, por inúmeros países, como a covid-19. A entidade responsável por decretar uma pandemia é a Organização Mundial da Saúde (OMS).

Enquanto isso, uma epidemia deve ser interpretada como um aumento de casos de uma doença em diversas regiões, estados e cidades, mas sem se tornar global. Afetando uma escala ainda menor, estão os surtos. Estes definem um aumento abrupto de casos, em uma região localizada. Por exemplo, dentro de um hospital ou de um bairro.

Entendendo o que é uma doença endêmica

Agora, “uma doença endêmica é aquela que ocorre regularmente em uma determinada região ou população, mantendo uma incidência constante ao longo do tempo”, explica Zuben. Este é o caso da febre maculosa no sudeste, mas também pode ser usada para descrever outras doenças recorrentes no Brasil, como malária, dengue e febre amarela.

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De forma geral, é difícil (ou quase impossível) extinguir uma doença endêmica. Isso porque esses agentes infecciosos se aproveitam de fatores ambientais, geográficos, climáticos e comportamentais das populações locais, enquanto se proliferam.

“Ao contrário de uma epidemia, que é caracterizada por um aumento abrupto e significativo no número de casos de uma doença em uma área específica e em um curto período de tempo, as doenças endêmicas têm uma prevalência estável e duradoura”, destaca a especialista.

Casos da febre maculosa no sudeste brasileiro

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Para entender o problema da febre maculosa no sudeste brasileiro, é importante olhar para os dados coletados pelo Ministério da Saúde nos últimos 17 anos. Conforme veremos a seguir, fica bastante nítido o problema do sudeste:

Neste intervalo de mais de 15 anos, o sudeste diagnosticou 1.759 casos, sendo 817 óbitos. Considerando apenas o estado de São Paulo, foram 1.064 casos e 574 mortes, o que reforça a posição de estado mais endêmico para a doença.

Os dados também apontam para outra revelação interessante. O estado de Santa Catarina diagnosticou oficialmente 579 casos de febre maculosa, mas nenhum óbito foi confirmado. A explicação para isso é que, no local e em alguns outros estados brasileiros, ocorre apenas a circulação de uma bactéria que desencadeia casos mais brandos da doença, a Rickettsia parkeri. No sudeste, a circulação normalmente é da Rickettsia rickettsii, associada com a elevada mortalidade.

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A doença do carrapato em Campinas

Neste ano, Campinas é uma das cidades que mais registraram casos e óbitos da febre maculosa, com uma alta após o evento na Fazenda Santa Margarida, no distrito de Joaquim Egídio, no começo do mês.

Por causa disso, a Secretaria de Saúde do Estado da Saúde de São Paulo emitiu um alerta para as pessoas que estiveram no local e que apresentem sintomas característicos da febre maculosa, como febre, dor no corpo, dor cabeça ou manchas avermelhadas, procurem “atendimento médico imediatamente”.

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Aqui, é importante observar que todos os casos recentes estão, até o momento, concentrados em uma única região. Dessa forma, Zuben afirma que “a cidade não está em surto”, apontando para a existência, sim, de um surto localizado, também conhecido como surto focalizado ou surto restrito.

A expressão faz referência “a um aumento incomum no número de casos de uma doença em uma área geográfica específica, em um período de tempo relativamente curto”, pontua Zuben .

Por que Campinas não extingue a doença do carrapato?

Enfrentar a febre maculosa em regiões endêmicas é um problema bastante complexo. Em Campinas, “as características ecoepidemiológicas da região, com presença de muitos cursos d’água, abundância de áreas verdes, áreas de proteção ambiental e uma população expressiva de capivaras tornam o ambiente muito favorável à existência das capivaras e dos carrapatos-estrela”, aponta Zuben.

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Os cavalos — outro tipo de animal relevante para a febre maculosa — e as capivaras “são animais extremamente adaptáveis, podendo ocorrer em ambientes altamente alterados pelo ser humano que vêm ocupando as áreas verdes em ambientes urbanos”, acrescenta. Ambos podem ser picados pelo carrapato-estrela, assim como os humanos, cachorros e gatos.

Enquanto as vacinas ainda estão em desenvolvimento, com pesquisas promissoras lideradas por um grupo da Universidade de São Paulo (USP), os moradores dessas regiões devem permanecer vigilantes. Além disso, são necessárias ações das prefeituras na conscientização, no treinamento das equipes médicas e no controle dos carrapatos. Inclusive, o Canaltech já compartilhou algumas medidas individuais de proteção, como o uso correto de repelentes.

Fonte: Ministério da Saúde, Governo de SP, Prefeitura de Campinas e Instituto Butantan