Como a África conseguiu driblar a pandemia da COVID-19?
Por Fidel Forato |

Na pandemia do novo coronavírus (SARS-CoV-2), é provável que África já tenha superado o pico de casos da COVID-19, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). Isso significa que a tendência do continente é a queda, lenta e gradual, de novas notificações da doença. Inclusive, a organização alertou, ontem (25), para os riscos do relaxamento nas medidas de proteção.
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“Parece que atingimos o pico e agora o número de novos casos diários está baixo”, afirmou o diretor regional da OMS na África, Matshidiso Moeti, durante coletiva de imprensa. Entretanto, é preciso manter os protocolos contra a COVID-19, porque pode haver uma segunda onda de contaminação.
Controlando os casos da COVID-19, a situação da África chama atenção, já que está geograficamente mais próxima a países que tiveram altos índices de contágio. Além disso, alguns países do continente são reconhecidos pelas poucas condições de atendimentos médicos, como é a situação do vírus do HIV, ainda não controlado em muitas regiões.
Histórico da COVID-19
Na linha do tempo da COVID-19 no continente, o primeiro caso de coronavírus foi confirmado dia 14 de fevereiro pelo Ministério da Saúde do Egito. Era um cidadão chinês que estava viajando pelo país e, por consequência, se tornou a primeira pessoa infectada em todo a África. Em paralelo, a Itália já registrava os primeiros casos nessa época.
Enquanto a Europa sofria os efeitos do novo coronavírus, com centenas de mortes diárias, alguns analistas apontavam para a possível tragédia que a África, o continente considerado mais pobre em termos econômicos e palco de conflitos internos, poderia encarar. Entretanto, até hoje, são registrados 1,2 milhões de casos da COVID-19 por lá, sendo 28,4 mil mortes, segundo a plataforma Worldometer.
Além das possíveis subnotificações, pesquisadores buscam respostas concretas para entender a resistência do continente ao coronavírus. Entre os fatores que ajudam a entender, estão: ser um continente com população, em média, mais jovem; experiências adquiridas no enfrentamento de outras doenças epidêmicas, como o ebola; e atuação precoce e conjunta entre os países.
Para o pesquisador do Centro de Relações Internacionais em Saúde da Fundação Oswaldo Cruz (Cris-Fiocruz), Augusto Paulo Silva, a união entre os países do continente está entre as mais prováveis explicações para o controle. Isso porque a União Africana — uma organização continental com cerca de 55 países — liderou as iniciativas para controlar o contágio da COVID-19. Afinal, o surto de ebola matou mais de 11 mil pessoas entre 2014 e 2016.
Aliado a isso, está o baixo número de testagens para o coronavírus. A África do Sul, com mais de 600 mil casos (e cerca de 50% do total de doentes do continente) realizou 60,2 mil testes para cada um milhão de habitantes. A média do Brasil é de 66,6 mil, segundo a plataforma Worldometer. Já o segundo país do ranking africano, o Egito, realizou 1,3 mil testes para cada um milhão de habitantes, o que é um número considerado baixo.
Continente X Países
No mundo, apenas a Oceania foi menos afetada pelo coronavírus do que a África. No entanto, os países africanos por conta da diversidade de realidades socioeconômicas experimentaram e experimentam tendências diferentes. Ou seja, mesmo que a doença tenha alcançado seu pico no continente, isso não significa que todos os países caminham para o controle dos contágios.
Por exemplo, o número de casos de coronavírus da Namíbia continua a crescer, se distanciando da média continental. Outro risco do continente africano é que a COVID-19 se espalhe, agora, para o interior. Já que o início da pandemia atingiu primeiro as capitais e grandes centros urbanos.
“Estamos observando vários surtos locais, cada um com seus próprios padrões e picos de infecção. É reforçando a resposta no âmbito das comunidades que venceremos essa corrida. A resposta à COVID-19 deve ser integrada na estrutura de cada distrito de saúde”, explica o diretor regional da OMS, Matshidiso Moeti.
Anticorpos?
Um fato curioso quanto ao coronavírus é que algumas pesquisas, conduzidas em diferentes países africanos, apontam para a presença de anticorpos contra a COVID-19 em parcela significativa da população. Esse é o caso de um estudo, desenvolvido pelo Instituto de Pesquisa Médica do Quênia, que apontou para o fato de um a cada 20 quenianos apresentaram anticorpos para a doença.
Uma outra hipótese para o baixo nível de infeções pelo coronavírus é que parte dos africanos já tenham sido expostos, em algum momento da vida, a outros tipos de coronavírus. Isso poderia ter aprimorado as defesas do sistema imunológico contra a COVID-19.
Também é possível que a exposição regular a doenças infecciosas, como a malária, também tenham fortalecido as respostas do organismo de populações específicas no continente. De qualquer forma, só estudos futuros fecharão mais esse capítulo da pandemia.
Fonte: Correio Braziliense e Gazeta do Povo