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Review Deathloop | Intrigante, inovador e difícil de entender

Por| Editado por Bruna Penilhas | 14 de Setembro de 2021 às 16h40

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Divulgação/Bethesda
Divulgação/Bethesda

É difícil definir Deathloop. A nova aventura é um jogo de tiro em primeira pessoa, com poderes mágicos, armamento personalizável, missões de assasinato e investigação furtiva em meio a um ciclo temporal. Se não bastasse a caravana de elementos, o jogo aplica uma boa dose de caos à equação para dar liga a tudo. 

O resultado é um jogo que impressiona pela criatividade e pela cara única que tem. Deathloop é diferente de tudo que você jogou esse ano, posso garantir. A fórmula, no entanto, às vezes tropeça em sua própria ousadia. Se por um lado é extremamente divertido tentar montar o quebra-cabeça de como matar oito alvos poderosos em 24 horas, por outro, o número de elementos do game atropela o jogador e a história em diversos momentos. Foi difícil aprender a navegar e entender o que estava acontecendo nesse jogo.

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As primeiras horas de Deathloop são as mais críticas na experiência. O primeiro dia na ilha de Blackreef serve como um tutorial de mais ou menos 1 hora. Terminei o período com a sensação de que não estava entendendo nada sobre a jogabilidade, a trama ou o que precisava fazer a seguir. O melhor de tudo foi descobrir que, mesmo totalmente perdido, o primeiro dia apenas arranhou a superfície de tudo que viveria naquela ilha.

Boa parte do problema de Deathloop nasce exatamente na característica que faz o jogo ser tão bom: novas mecânicas e a mistura caótica de elementos. Aprender a navegar pelo loop temporal, selecionar uma missão e entender a personalização de armas e poderes de Colt vai exigir que o jogador assimile muitos menus e leia muitos textos. Mas, passada essa barreira inicial, a experiência se torna incrível.

É louvável que a desenvolvedora Arkane Lyon tenha apostado todas as fichas na ideia de Deathloop e tenha feito um jogo que não tem medo de abraçar o clima de anarquia que vive a ilha de Blackreef, seja na jogabilidade ou na progressão da trama.

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História

Em Deathloop, podemos assumir o papel de Colt. O protagonista vive dentro de uma distorção temporal que faz a enigmática ilha de Blackreef repetir o mesmo dia por toda a eternidade. Sem preocupação com o amanhã, a ilha se tornou morada para uma sociedade decadente que festeja todos os dias, mas esconde comportamentos com a pouca humanidade de quem deixou de enxergar sentido na morte do próximo. 

Convencido de que precisa quebrar esse ciclo e fugir de Blackreef, Colt embarca em uma missão para matar oito alvos que mantêm o pesadelo temporal vivo na ilha, os Visionários. Todos eles precisam ser mortos antes que o dia reinicie, tarefa que vai se mostrar particularmente difícil de ser realizada em um único dia.

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Colt é um dos únicos da ilha que consegue guardar memórias de um ciclo temporal para o próximo, conveniência narrativa que permitiu a Arkane desenvolver uma história com efeitos borboleta. Realizar uma ação com o protagonista avança a narrativa e cria consequências em um mundo em que, teoricamente, as ações não importam.

Para ajudar na cruzada de assassinar os oito alvos, Colt se arma com pistolas e outros armamentos encontrados pela ilha. As armas não são o único poder de fogo do personagem, que ainda pode contar com habilidades especiais (como correr mais rápido e pular duas vezes), além das interessantes Placas. Essas Placas conferem poderes sobrenaturais como teleportar e ficar invisível.

Nenhuma das habilidades, sejam especiais ou sobrenaturais, são aprendidas por Colt. Elas são encontradas no mapa como itens que podem ser recolhidos e equipados. O que significa que os mesmos podem ser perdidos, caso Colt morra durante a exploração na ilha.

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A Arkane Lyon merece elogios pela forma como construiu a progressão dessa aventura. Em Deathloop, o jogador até pode repetir o mesmo dia sempre, mas um dia nunca será igual ao outro. O design de níveis é rico, abrindo novos caminhos, salas e possibilidades inéditas, mesmo enquanto você repete os quatro cenários em quatro partes do dia até o final de tudo.

É curioso como o jogo aposta alto na jogabilidade, mas não se arrisca na história. A trama de Deathloop tem reviravoltas dignas de novela e um desfecho final que não combina em nada com a grandiosidade de toda a caminhada. As três possibilidades de finais do jogo são tão contidas e simples, em comparação com o resto, que se tornam anticlimáticas. A sensação é que o jogo não acabou, em qualquer um dos desfechos. 

Outro ponto em que a história peca, é no desenvolvimento da relação entre Julianna e Colt. O embate entre os dois personagens é uma experiência marcante de se jogar, mas estranha de acompanhar. Quando entendi o que liga os dois, os diálogos e as motivações que levam aos combates ficaram vazios de sentido. A Arkane quis empregar o espírito de Anarquia de toda a ilha para basear a relação dos seus protagonistas, mas o tiro sai totalmente de rota. 

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Navegando por menus 

Deathloop é um jogo de muita personalidade e que tem certeza das mecânicas novas que quer adotar. Talvez por isso, o começo do jogo não seja exatamente muito fácil de assimilar, com muitas opções estranhamente novas sendo mostradas ao jogador. Mas não desista.

Quando inaugura o seu save, o jogador vai se deparar com uma infinidade de menus, opções e muito, muito texto. Nada contra a leitura em jogos, mas as pequenas sessões de ação frenética do começo, intercaladas com a leitura de pistas e da tentativa de entendimento da interface, não deixam uma boa primeira impressão. À primeira vista, o jogo parece ser picotado por menus.

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Isso acontece por uma razão. Os oito visionários alvos de Colt estão espalhados por quatro distritos de Blackreef, em quatro partes diferentes do dia: madrugada, manhã, tarde e noite. Deathloop não permite que o jogador mude de distrito ou de parte do dia por conta própria.

Para avançar no tempo ou ir para o próximo distrito em busca de um novo alvo, o jogador precisa levar Colt para uma base secreta, que abre uma espécie de lobby. Nele, o jogador tem acesso aos menus e pode equipar Colt com armas que recolheu para a próxima parte do dia, infundir itens com Residuum para que eles sejam levados de um ciclo temporal para o outro e ler pistas encontradas sobre o paradeiro dos Visionários pela ilha.

Com missões curtas no começo, a sua primeira experiência em Deathloop será fazer uma atividade simples como abrir um cofre ou uma porta e voltar para o lobby e os incontáveis menus atrás das pistas descobertas.

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São essas pistas que vão ajudá-lo a escolher para qual distrito e em qual parte do dia Colt vai a seguir. O jogo permite que o jogador escolha livremente o próximo passo que vai dar, com base nas pistas que reuniu sobre a localização dos Visionários.

Multiplayer de Deathloop: jogo de gato e rato 

O principal algoz de Colt na missão de matar os Visionários é Julianna, uma assassina rival que está sempre à espreita. A personagem pode ser controlada por outro jogador real, que decide atrapalhar a campanha de um Colt pelo mundo. Como Colt, encontrei outros jogadores que encarnavam diferentes Julianna. Alguns partiam para cima com tudo. Outros, adotavam uma abordagem furtiva e se escondiam.

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O elemento multiplayer ajuda a diversificar ainda mais a experiência de tornar cada dia diferente do outro. Não só o Colt possui modos de variar e inventar no mundo do jogo, como uma Julianna pode obrigar o jogador a mudar seu estilo de exploração e progressão. 

No geral, a impressão que fica é que jogar com Julianna é mais divertido do que correr o risco de ter todo o avanço de história perdido após ser morto como Colt. A antagonista não perde nada ao morrer para o protagonista, enquanto Colt coloca em risco pistas, armas e poderes acumulados ao longo de todo o dia. 

Para ser sincero, o multiplayer de Deathloop não parece ser muito justo. É natural que alguém opte por jogar como Julianna após terminar o jogo. Esse jogador conhecerá mais os detalhes da ilha e terá todos os NPCs como aliados contra um Colt que ainda está tentando entender o que está acontecendo. 

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Mas, no final das contas, o balanço do multiplayer é positivo. O Colt que não está afim de ser atacado por bons jogadores online pode ativar Julianna controlada pela inteligência artificial da máquina. Os que terminaram a história como Colt, mas ainda querem acumular armas e continuar explorando Blackreef, têm a possibilidade de continuar vivendo nesse mundo no papel da vilã. 

A liberdade de jogar como Julianna é divertida, ainda mais anárquica e a experiência definitiva do mundo de Deathloop e dos jogos da Arkane Lyon. 

Conhecimento é poder 

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Cada novo ciclo em Deathloop é uma oportunidade de aprender com o passado e de se adaptar para o futuro. A arma mais forte do jogo é a informação. O jogador vai se deparar com pistas ao longo da jornada, que se tornam essenciais para eliminar os alvos antes que o dia reinicie.

Será necessário descobrir relacionamentos, decorar programações e ouvir diálogos para conseguir mudar o destino e fazer com que os Visionários se reúnam no mesmo lugar. 

Quando chega ao lobby, Colt consegue analisar e ler todas as pistas que reuniu e, com base nisso, decidir qual é o próximo passo. Para os mais apressadinhos que não querem ler cada pista, a Arkane criou uma interface que resume todas as informações coletadas e sugere algumas ações que podem ser feitas a seguir na ilha.

Exploração em Blackreeaf 

Deathloop é um caldeirão de referências. O jogo bebe da fonte de Hitman e da forma como The Legend of Zelda: Majora's Mask lida com o tempo. A aventura de Link é a base do conceito de ciclo temporal de um dia no jogo da Arkane, ao lado de All You Need is Kill, mangá que deu origem ao filme No Limite do Amanhã.

É indo do Japão até Hollywood em busca de referências, que Deathloop constrói uma estética com personalidade para os seus cenários. A ilha de Blackreef é um ambiente retrofuturista, inspirado na década de 1960, que por muitas vezes lembra os cenários de BioShock Infinite.

Por não ser um mundo muito grande, a Arkane ganhou tempo para trabalhar bem em cada distrito. As quatro porções da ilha possuem casas, telhados, corredores e todo tipo de rota alternativa para você explorar e eliminar inimigos, seja furtivamente ou não.

Existem mais de duas ou três maneiras de se aproximar de um alvo, seja pelo teto, por uma porta secreta ou ainda pela porta da frente se você resolver incorporar um Colt destemido. 

É interessante como progredir exige criatividade e premia jogadores que arriscam opções menos usuais do que em outros títulos de tiro. Quase nunca a solução mais inteligente será pegar uma arma e enfrentar um dos oito alvos, os Visionários, de cara. Muitas vezes, a solução para ter sucesso em Deathloop é apostar na alternativa mais galhofa possível, como invadir uma boate pelo esgoto, atrapalhar um show de fogos de artifício ou descobrir o ninho de amor de dois personagens.

Deathloop é um roguelike?

A resposta é sim… E não!

Ao morrer ou completar um dia, Colt perde todos os itens, Residium e materiais que não foram infundidos para resistirem à volta do tempo. Toda manhã, o personagem acorda bêbado na praia em que você começa o jogo para reviver as mesmas horas.

O que muda de um ciclo para o outro são as pistas que o jogador vai recolhendo para arquitetar o plano de matar os oito Visionários de vez, além das melhorias definitivas conquistadas por itens equipados e infundidos que deixam Colt mais letal e poderoso.

A base de voltar ao começo do jogo, seja morrendo, seja não completando a missão de assassinato, deixa Deathloop com uma cara de roguelike a princípio. Mas só a princípio.

O jogo se aproxima de Hades como um novo tipo de roguelike que motiva o jogador a repetir os mesmos trajetos em troca de ficar mais forte e conhecer mais da história, mas a grande verdade é que você pode até viver o mesmo dia em Deathloop. No entanto, como já mencionei, o dia nunca será o mesmo.

Completar uma missão ou encontrar uma pista em 24 horas é como passar de fase e causar mudanças na estrutura desse jogo. Novas cutscenes são mostradas e possibilidades se abrem. Efetivamente, cada dia é diferente do outro, seja por novas áreas que podem ser acessadas, por ações que Colt desencadeia na linha do tempo com ações passadas ou descobertas feitas no dia anterior.

Repetir os ciclos poderia se tornar monótono no início. Mas, eventualmente, a experiência de descobrir como progredir em um ciclo temporal repetitivo foi recompensadora.

Vale a pena? 

Se Deathloop fosse um prato da culinária brasileira, o jogo seria um cuscuz paulista. Um claro incremento da receita que a Arkane Lyon fez em Dishonored, com uma série de novos ingredientes que levam a um resultado que vai agradar uns, parecer estranho para outros, mas certamente ser reconhecido como uma aposta exagerada e arriscada por um sabor novo. 

Se você busca ação e diversão crua em um jogo de tiro, ou ainda tem saudade de Dishonored, Deathloop será certamente um dos melhores jogos de 2021 para você. Entretanto, se a sua busca for por histórias emocionantes, como em outros exclusivos de PlayStation, a aventura não entrega o necessário para envolver o jogador. A trama e o desfecho do jogo não acompanham o potencial de inovação de todo o resto. 

O título faz um bom uso do DualSense, controle do PS5. Arrisco dizer que a Arkane entendeu melhor o novo controle da Sony do que outros estúdios que produziram nos últimos meses Ratchet & Clank: Rift ApartReturnal e Ghost of Tsushima: Director's Cut. O que se torna até engraçado, se pensarmos que um dos estúdios que melhor usou o controle até agora pertence a Microsoft.

O uso do feedback tátil e os gatilhos adaptáveis estão integrados ao gameplay. Os autofalantes do controle são usados para surpreender o jogador quando Julianna aparece para importunar Colt em conversas via rádio.

A principal falha na jogabilidade é a qualidade da inteligência artificial dos inimigos. Todos os antagonistas de Colt são burros. Não é difícil se ver em uma situação em que Colt eliminará um inimigo do lado de outro, sem que nenhuma reação seja esboçada. Os adversários também possuem dificuldade de perseguir o protagonista, o que deixa a ação furtiva um pouco sem graça.

Deathloop é diferente de qualquer outra coisa que eu tenha jogado nos últimos tempos. Entretanto, se você der tempo o suficiente para entender o que a Arkane construiu para essa nova franquia, jogá-lo se torna uma aventura divertida e intrigante. 

O jogo está disponível para PlayStation 5 e PC, exclusivo temporário do console da Sony.