Por que demorou tanto tempo para Vampire: The Masquerade ganhar continuação?
Por Gabriel Cavalheiro • Editado por Jones Oliveira |

Engana-se quem pensa que RPG de mesa se resume a Dungeons & Dragons, pois há centenas de outras opções com estilos de jogo e focos diferentes. Uma das mais famosas é Vampiro: A Máscara, um RPG de mesa ambientado no mundo contemporâneo e com grande foco na narrativa e na interpretação, que servem até como alternativa ao combate.
O jogo, criado por Mark Rein-Hagen, foi lançado em 1991 e sua popularidade foi tanta que levou Vampiro: A Máscara para outras mídias, como TV, cinema e, claro, os videogames.
Em 16 de novembro de 2004, Vampire: The Masquerade - Bloodlines chegava ao bilionário mercado de jogos eletrônicos. O RPG permitia aos jogadores viver na pele de um personagem em um dos diferentes clãs de vampiros para explorar uma narrativa ambientada na cidade de Los Angeles.
Depois de 21 anos, Vampire: The Masquerade - Bloodlines está recebendo uma sequência. Anunciada em 2019, ela sofreu diversos atrasos e problemas em seu desenvolvimento, incluindo mudanças de estúdios e todo o caos que isso pode gerar. Mas, afinal, por que demorou tanto tempo para que o jogo ganhasse uma continuação?
A história de Vampire: The Masquerade - Bloodlines
Fundada em 1998 por Jason Anderson, Tim Cain e Leonard Boyarsky, a Troika Games foi uma desenvolvedora de vida curta. O estúdio começou com grande ambição e um certo conhecimento de RPGs para PCs, visto que seus fundadores eram ninguém menos que os criadores de Fallout, um dos RPGs ocidentais mais influentes dos videogames.
O estúdio recém-nascido levaria três anos para dar vida ao seu primeiro jogo, um RPG similar a Fallout, mas com inspirações na fantasia de Tolkien e temática steampunk. O título era Arcanum: Of Steamworks & Magick Obscura, lançado em 2001, mesmo ano em que a Troika Games iniciou o desenvolvimento de Vampire: The Masquerade - Bloodlines, que envolveu cerca de 30 pessoas.
Apesar de sua popularidade, mesmo anos após seu lançamento, Vampire: The Masquerade - Bloodlines foi, na verdade, um verdadeiro desastre. A Troika Games estava focada em criar um jogo denso, com um mundo e narrativas expansivas e complexas, como vários títulos da época, a exemplo de Baldur's Gate e System Shock. A ambição do estúdio era enorme, mas todo esse perfeccionismo acabaria indo por água abaixo.
Para alcançar um feito técnico majestoso, a Troika estava desenvolvendo Bloodlines no motor gráfico Source, da Valve. A engine permitia à desenvolvedora implementar um sistema de animação revolucionário para a época, dando vida a personagens como nenhum outro RPG havia feito até então. Na verdade, a Troika foi uma das primeiras desenvolvedoras terceirizadas a ter acesso à cobiçada Source Engine.
No entanto, o motor gráfico se mostrou uma bênção e uma maldição. Naquela altura do campeonato, a engine ainda estava em desenvolvimento, o que gerou problemas técnicos, instabilidade e dificuldades na produção de Vampire: The Masquerade - Bloodlines. Para piorar, a publicadora por trás do projeto estava perdendo a paciência com os constantes atrasos de um desenvolvimento que não parecia ter fim.
Para o azar da Troika Games, a editora do jogo era ninguém menos que a Activision, que não tem a melhor reputação na gestão de seus estúdios. Em 2004, a dona de Call of Duty estabeleceu um prazo final para a desenvolvedora, que teria apenas alguns meses para finalizar, polir e lançar o jogo — algo impossível se a meta era entregar um título minimamente jogável.
A situação gerou um crunch no estúdio, que correu para entregar o jogo, que mesmo assim foi entregue com problemas técnicos e incompleto. A cereja do bolo foi a data de lançamento escolhida para Vampire: The Masquerade - Bloodlines, que chegou no mesmo dia de Half-Life 2.
Nem é preciso dizer que Half-Life 2 roubou todos os holofotes, já que se tornou um clássico cult instantaneamente. A data de lançamento fora da realidade e o estado inacabado do game levaram Vampire: The Masquerade - Bloodlines a um fracasso comercial catastrófico, forçando a Troika Games a demitir funcionários e a fechar as portas de vez em 2005, por não ter fundos para novos projetos.
O renascimento de Vampire: The Masquerade - Bloodlines
Apesar de sua morte silenciosa, um fã alemão chamado Werner Spahl, que havia gostado muito de Vampire: The Masquerade - Bloodlines apesar dos problemas, estava disposto a investir anos de sua vida para consertar o game. Ele não abriria mão tão facilmente da experiência.
Spahl, então, assumiu um projeto para restaurar Bloodlines, mas não se contentou apenas em corrigir bugs. O fã foi além e, com a ajuda da comunidade, não só consertou Vampire: The Masquerade - Bloodlines, como também recuperou e adicionou conteúdos que foram cortados pela Troika devido ao tempo limitadíssimo para entregar o jogo.
O projeto ficou conhecido como "Unofficial Patch for Bloodlines" e ganhou sua última grande atualização em setembro de 2024, 20 anos após o lançamento do título original. As atualizações contam com conteúdo de altíssima qualidade criado do zero pela comunidade
O ciclo se repete: Vampire: The Masquerade - Bloodlines 2
Em paralelo ao patch não oficial que manteve o jogo vivo por todos esses anos, uma sequência de Vampire: The Masquerade - Bloodlines foi anunciada. O ano era 2019, um ano antes de uma das crises sanitárias mais impactantes da história moderna.
A expectativa para a sequência estava nas alturas, já que a desenvolvedora do projeto, a Hardsuit Labs, trouxe o roteirista do título original, Brian Mitsoda, como diretor de narrativa. A Paradox Interactive, empresa conhecida por apoiar projetos de simulação e estratégia, assumiu a publicação de Vampire: The Masquerade - Bloodlines 2. O cenário parecia perfeito para a série alcançar seu merecido sucesso, sem uma Source Engine instável ou um Half-Life 2 para ofuscar sua glória.
O RPG prometia uma Seattle sombria e detalhada, com uma narrativa forte e um mundo semiaberto com grande ênfase nas decisões dos jogadores. A jogabilidade teria foco no combate em primeira pessoa com poderes vampíricos, as Disciplinas, e em um sistema de diálogo complexo e profundo com consequências — a mesma ambição do primeiro jogo, de 2004.
Vampire: The Masquerade - Bloodlines 2 estava planejado para 2020, mas foi adiado. Um dos motivos era, obviamente, a pandemia de Covid-19, que impactou toda a indústria, embora tenha elevado o consumo de jogos em um certo período. No entanto, o problema era bem mais profundo e enraizado que a crise de saúde da época.
O fantasma da publicadora retornaria em 2020, com a Paradox Interactive demitindo Brian Mitsoda — visto como a alma de Vampire: The Masquerade - Bloodlines 2 — e o diretor criativo Ka'ai Cluney, como parte de uma reestruturação da equipe de desenvolvimento do RPG.
A notícia chocou não apenas os fãs, mas também o próprio Mitsoda, que comentou na época: "Bloodlines e seus fãs significam o mundo para mim. Por isso, emprestei meu legado com a franquia, meu nome e minha participação no marketing, mesmo que tenha sido extremamente difícil e com um custo mental e físico. Tudo porque eu queria fazer o melhor para o jogo e para a equipe". A demissão das mentes por trás de Vampire: The Masquerade - Bloodlines 2 levou à saída de outra peça importante do RPG: a designer sênior Cara Ellison.
A partir daí, o projeto foi ladeira abaixo. Em 2021, a Paradox anunciou que a Hardsuit Labs não estava mais trabalhando no jogo. A publicadora suspendeu as pré-vendas, e o futuro do título se tornou incerto, com especulações de que seria cancelado.
Após dois anos de silêncio, a Paradox Interactive revelou que o estúdio britânico The Chinese Room (Amnesia, Still Wakes the Deep) havia assumido o desenvolvimento de Vampire: The Masquerade - Bloodlines 2 em 2021, reiniciando o projeto do zero. Nessa troca, muito do que foi feito pela Hardsuit Labs foi substituído, criando praticamente dois jogos diferentes.
A nova desenvolvedora manteve a ambientação em Seattle, mas alterou muitos aspectos da versão original. Na proposta da Hardsuit Labs, os jogadores viveriam como um Thinblood, um vampiro fraco que ascenderia lentamente na cidade, construindo sua reputação enquanto tentava desvendar os mistérios de suas origens.
A The Chinese Room, no entanto, mudou radicalmente a história, apresentando Phyre, uma vampira Anciã com séculos de existência e uma lenda no mundo dos Membros, que acorda nos tempos modernos após 100 anos de torpor. A personagem já tem uma história de fundo definida, e os jogadores devem preencher lacunas em seu passado pré-estabelecido.
O novo estúdio também alterou o estilo de jogo, abandonando o mundo semiaberto com foco em exploração e missões secundárias por um RPG de ação mais linear e focado na narrativa. Houve ainda cortes de conteúdo, sendo o mais drástico a redução do número de clãs de seis para quatro, já que alguns exigiriam narrativas, diálogos e mecânicas únicas, pesando ainda mais no desenvolvimento.
Agora com a The Chinese Room, Vampire: The Masquerade - Bloodlines 2, que estava planejado para 2024, mas foi novamente adiado e tem data marcada para 21 de outubro de 2025 e chega ao PC, PlayStation 5 e Xbox Series.
Vampire: The Masquerade - Bloodlines 2 compartilha destino do clássico de 2004
Quatro dias antes do lançamento oficial de Vampire: The Masquerade - Bloodlines 2, a crítica especializada começou a emitir suas opiniões sobre a aguardada sequência, lançada duas décadas após o título original.
Todas as mudanças e adiamentos resultaram em um jogo que não agradou. Alguns críticos julgaram a narrativa como vazia, o level design como repetitivo e um potencial desperdiçado. Além disso, sites reportaram problemas técnicos, mostrando que a história da Troika Games pode ter se repetido.
No entanto, será que a comunidade salvará Vampire: The Masquerade - Bloodlines 2 novamente?
Leia também no Canaltech:
-
Os 10 melhores jogos de vampiro de todos os tempos
- Quais são os tipos de jogos RPG?
- 7 diferenças entre JRPG e RPG ocidental
Vídeo: Nintendo Switch, PS5 ou Xbox? Ainda vale a pena comprar um console em 2025?