Os desafios da OSIRIS-REx e por que é tão difícil coletar amostras de asteroides
Por Daniele Cavalcante | 19 de Outubro de 2020 às 08h49
Faltam poucos dias para a tão aguardada coleta de amostras do asteroide Bennu, e as expectativas da NASA são altas — afinal, será a primeira vez que uma nave dos EUA tentará realizar uma missão desse tipo. A nave em questão é a OSIRIS-REx, e as amostras que ela trará à Terra devem fornecer aos cientistas pistas sobre a formação do Sistema Solar. O grande dia será na terça-feira (20), mas não será uma tarefa fácil.
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Os desafios são muitos. Além de ser um asteroide relativamente pequeno, com cerca de 500 metros de diâmetro, há diversas rochas do tamanho de casas sobre sua superfície. A NASA descreveu as manobras necessárias para o pouso como tentar estacionar uma van em um estacionamento onde há apenas uma vaga livre. Bem, estacionar um carro pode ser fácil para quem já tem prática, mas a OSIRIS-REx nunca realizou a manobra completa, apesar de alguns treinos terem sido realizados nos últimos meses.
A complexidade do TAG (sigla para “Touch-And-Go”, o nome do evento que consiste em tocar na superfície do asteroide para pegar as amostras e voltar ao espaço apenas poucos segundos depois) consiste não somente em descer até o chão do Bennu sem colidir com as rochas, mas também permanecer na inclinação e velocidades corretas para não cair e não prejudicar os instrumentos robóticos que tocarão no solo. Um mínimo erro de cálculo de velocidade, por exemplo, e o braço de coleta das amostras pode ser irremediavelmente danificado.
Em um vídeo recente da NASA, alguns dos membros da equipe da missão falaram sobre os desafios de realizar o TAG, e sobre como os cientistas prepararam tudo nos mínimos detalhes para garantir que tudo dará certo. Tudo começará com uma queima de combustível que vai tirar a nave de sua órbita atual e a levará rumo a uma descida cautelosa em direção à superfície, mais precisamente ao local chamado Nightingale.
Assim que a espaçonave iniciar a descida, entrará em ação um sistema chamado Natural Feature Tracking (NFT), que cuidará da navegação da OSIRIS-REx usando um catálogo de imagens com as imagens de navegação em tempo real obtidas durante a descida. Essas imagens serão comparadas com os dados coletados pelo instrumento a bordo chamado Laser Altimeter (OLA), que ficou mapeando o Bennu durante o tempo que a nave orbitou o asteroide, permitindo criar o que a equipe da missão chama de "mapa de perigo". Essa representação detalhada mostrará os locais arriscados à medida que a nave desce rumo ao alvo.
Essa comparação entre as imagens do NFT e o mapa de perigo acontecerá em tempo antes de tocar a superfície. Se a nave estiver no caminho de uma colisão, o sistema aciona automaticamente um “abortar missão”, ou seja, uma manobra que levará a nave de volta para uma altitude segura. Os cientistas calculam que esse cenário que tem uma probabilidade de menos de 6%, com base em simulações. Não parece muito, mas é o suficiente para querer tomar todas as preocupações cabíveis.
Se a comparação de imagens mostrar que a nave desce em uma direção segura, ela estenderá seu mecanismo de coleta TAGSAM, preso no braço robótico de 3,3 metros de comprimento. Uma vez que tudo der certo, o toque na superfície será realizado por mais ou menos 10 segundos. O contato com a superfície de Bennu será detectado pela OSIRIS-REx, que vai disparar uma das três garrafas de nitrogênio a bordo. Como um aspirador de pó reverso, o mecanismo vai agitar a poeira da superfície para dentro do coletor antes que a espaçonave se afaste.
Se algo der errado com a coleta movida a nitrogênio, o mecanismo usará uma série de pequenos discos pegajosos projetados para coletar poeira simplesmente grudando-as no aparelho. Não é o ideal, mas pode funcionar.
Um dos grandes desafios dessa etapa é que o controle da missão na Terra não poderá ver tudo em tempo real, controlando como se fosse um vídeogame. É que o Bennu está tão longe que os sinais de transmissão entre a nave e o controle da NASA levarão 16 minutos para chegar. Ou seja, quando os funcionários da agência espacial estiverem vendo a manobra de descida, que levará 8 minutos, a nave já terá retornado para longe da rocha espacial. Então, o sistema autônomo deverá ser preciso.
Depois que a nave se afastar, a equipe examinará as filmagens feitas pela câmera chamada SamCam, acoplada no cabeçote de coletas e programado para filmar quando o contato for detectado pela nave. O SamCam é uma das três câmeras a bordo da espaçonave construída no UArizona. Com essas filmagens, a NASA finalmente saberá como tudo ocorreu: se a nave estava inclinada, se o gás estourou para o lado, se o material foi agitado o suficiente para ser “aspirado” pela máquina, entre outros detalhes. Também verá a localização exata do Nightingale onde a OSIRIS-REx fez o TAG para a coleta.
Depois de saber o ponto de coleta, os cientistas vão comparar com o mapa que eles possuem para avaliar se o pouso ocorreu em uma área onde há bastante material, ou se foi em uma área mais rochosa. Isso será fundamental para determinar se a OSIRIS-REx estará carregando amostras o suficiente para análises em laboratório. Seria decepcionante se a nave chegasse aqui com menos material do que o desejado.
A câmera SamCam também vai tirar imagens do próprio cabeçote de amostras depois que a espaçonave se afastar do Bennu. A equipe poderá examiná-lo em diferentes orientações em relação ao Sol e verá toda a poeira que estiver grudada em outra parte do TAGSAM ou no braço mecânico. Isso dirá à equipe se a poeira foi bastante movimentada pelo gás.
Depois, a equipe passará uma semana inteira avaliando quanta amostra foi coletada, usando vários métodos para estimar a quantidade do material. A NASA também vai avaliar imagens que dirão se a nave e seus instrumentos foram desgastados de algum modo.
Há no total três garrafas de nitrogênio, o suficiente para que a nave faça outras tentativas de coleta caso a primeira dê errado ou não consiga coletar amostras o suficiente, já que o objetivo científico principal é obter pelo menos 60 gramas. Se uma nova tentativa for necessária, a nave será colocada de volta em órbita e uma série de queima de combustível será feita para alinhar sua posição, preparando-a para uma nova tentativa.
Embora Nightingale tenha sido identificado como o melhor lugar para obter uma amostra, há outros locais interessantes onde as novas tentativas poderão ser feitas, como o Osprey.
Todo esse processo poderá ser acompanhado em uma cobertura ao vivo da NASA, que começará na segunda-feira (19) e terminará na quarta. Após realizar a coleta das amostras com sucesso, a OSIRIS-REx deixará o Bennu e em 2021 começará sua viagem de volta à Terra. Ela deverá chegar por aqui com o material alienígena no dia 24 de setembro de 2023.
Fonte: Space Daily