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Há evidências de que o universo não começou com o Big Bang. E agora?

Por| Editado por Patricia Gnipper | 04 de Abril de 2023 às 19h45

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Chris Blacke/Sam Moorfield
Chris Blacke/Sam Moorfield

O Big Bang foi mesmo o começo de tudo? Segundo estudos mais recentes sobre os limites do universo observável, não. Cientistas já obtiveram evidências consistentes o suficiente para sustentar a hipótese de um período anterior — conhecido como inflação cósmica —, responsável por “configurar” o cosmos antes de a matéria preenchê-lo. Conheça algumas delas.

Existem duas ideias predominantes sobre o Big Bang: a de uma singularidade que deu origem a tudo, e a da inflação cósmica. A primeira — e mais popular — diz que toda a energia e matéria do universo estava confinada em um único ponto de densidade infinita, enquanto a segunda descarta essa possibilidade.

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Há alguns motivos para rejeitar a ideia de singularidade, como o próprio conceito de um único ponto no universo onde tudo estaria concentrado. Por mais que seja inevitável na Teoria da Relatividade Geral, a singularidade “quebra” a matemática e a física deixa de fazer sentido.

Além disso, observações da radiação cósmica de fundo — a luz remanescente que confirma a teoria do Big Bang — mostram que mesmo no comecinho do universo já havia uma certa configuração, uma espécie de “impressão digital”, que resultou nas concentrações de massa e nos “vazios” distribuídos pelo cosmos.

Imperfeições da radiação cósmica de fundo

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Nos primeiros instantes após o Big Bang, o universo era quente e denso, formado por um plasma de fótons, elétrons e bárions. À medida que o universo se expandia, o plasma se espalhava, esfriando até que elétrons pudessem se juntar a prótons para formar átomos de hidrogênio e hélio.

Só a partir daí que os elétrons puderam viajar livremente pelo espaço, o que resultou na radiação cósmica de fundo (CMB, na sigla em inglês) — um brilho residual emitido cerca de 380.000 anos após o início do Big Bang. Não podemos observar nada além desse período, pois os fótons não podiam viajar até nós.

Embora a CMB seja isotrópica (tem as mesmas propriedades físicas em qualquer parte do universo), ela apresenta algumas flutuações de temperatura (anisotropia, ou imperfeições, com algumas áreas mais quentes que outras), o que implica em diferenças na concentração energia. E, como Albert Einstein demonstrou com a fórmula E=mc², energia é matéria — e vice-versa.

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Desse modo, tais flutuações da CMB correspondem a regiões superdensas e regiões subdensas no cosmos. À medida que o universo se expande e esfria, as regiões superdensas atrairão mais matéria e energia, crescendo com o tempo; enquanto isso, as regiões subdensas cederão matéria e energia para as mais densas, tornando-se “bolhas” vazias.

Essa distribuição serviu como uma espécie de semeadura para formar as estruturas cósmicas que vemos hoje, com aglomerados de galáxias e a grande teia cósmica, e qualquer teoria sobre o início do universo precisa explicar esse fenômeno.

Singuladidade x inflação cósmica

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De acordo com a explicação do Big Bang com uma singularidade, o universo simplesmente “nasceu” com esse conjunto de flutuações que cresceram e evoluíram para resultar no colapso gravitacional de matéria conforme as áreas densas atraíam matéria para si.

Já a teoria da inflação cósmica, onde o Big Bang surge apenas após um período inflacionário, essas imperfeições observadas na CMB já haviam sido semeadas por flutuações quânticas. A teoria que sustenta essa ideia é a da relação de incerteza energia-tempo.

Essas flutuações quânticas são geradas nas menores escalas e esticadas para escalas maiores pela inflação cósmica, enquanto flutuações mais recentes e posteriores são esticadas sobre as primeiras, criando uma superposição de flutuações em todas as escalas de distância.

Por fim, essas flutuações superpostas espalhadas por todo o cosmos, causam as imperfeições de densidade no início do universo, que por sua vez levam às flutuações de temperatura que medimos na radiação cósmica de fundo. Em outras palavras, as flutuações quânticas configuraram a anisotropia do universo antes mesmo do Big Bang.

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As flutuações nas maiores escalas podem ter sido criadas, sim, a partir das flutuações que surgiram durante o período inflacionário antes do Big Bang, mas também há outra explicação possível: o crescimento gravitacional da estrutura no universo mais evoluído, que tem um horizonte cósmico muito maior do que o universo primitivo.

Isso exige evidências mais concretas para fortalecer o modelo inflacionário. E elas já foram encontradas. Uma delas é que se a temperatura antes de um trilionésimo de segundo após o nascimento do universo fosse alta o suficiente para nos permitir supor a singularidade, haveria ondas gravitacionais na polarização da radiação cósmica de fundo.

Entretanto, nas medições mais recentes da radiação cósmica de fundo essa temperatura nunca foi superior a cerca de 10¹⁵ GeV, em termos de energia. Isso implica em um limite mínimo de tamanho. Para um tempo de 10⁻³⁵ segundos, temos uma escala de aproximadamente 1,5 metro, então o universo, não poderia ser menor que isso em seu estágio mais primordial.

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Talvez a maior evidência a favor da inflação cósmica sejam as flutuações de super-horizonte do universo: um limite para a distância que um sinal poderia viajar à velocidade da luz desde o início do Big Bang. Esse limite é conhecido como horizonte cósmico, enquanto além dele fica o super-horizonte. Abaixo do limite, está a escala sub-horizontal.

Quando o satélite WMAP observou em 2003 uma correlação entre uma luz polarizada e as flutuações de temperatura na radiação cósmica de fundo, os cientistas ganharam uma ferramenta poderosa: as flutuações de temperatura finalmente poderiam ser medidas em cada uma dessas escalas de horizonte, super-horizonte e sub-horizonte.

Por que isso é tão importante? É que ambos os modelos — singularidade e inflação cósmica — fazem previsões sobre essas medições, e todas elas correspondem às previsões de um período inflacionário antes do Big Bang.

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Por outro lado, os sinais que aparecem em escalas de super-horizonte não deveriam aparecer de forma alguma caso o universo tivesse começado com uma singularidade.

Na imagem acima, a linha pontilhada representa a previsão do modelo de singularidade, enquanto a linha sólida em ondas corresponde às previsões da inflação cósmica. As observações do WMAP validaram a linha sólida.

Em 2015, o satélite Plank fez observações ainda mais precisas das flutuações do super-horizonte, em um número maior de faixas de comprimento de onda, com maior sensibilidade à temperatura. Os dados finais de correlação (abaixo) são ainda mais favoráveis à inflação cósmica.

Nesse gráfico, com as flutuações observadas no super-horizonte, demonstra que o modelo de singularidade do Big Bang não combina com o universo que astrônomos observam.

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E a teoria do Big Bang?

Uma das explicações mais recorrentes sobre o Big Bang é: se o universo está em constante expansão, podemos retroceder no tempo até chegar a um ponto onde tudo se resumia a um simples ponto — a singularidade.

Contudo, os gráficos acima mostram que só podemos retroceder até um certo momento. Antes desse momento, um estado inflacionário multiplicou o espaço em todas as três dimensões a cada trilionésimo de segundo, configurando o universo com as flutuações quânticas que determinaram as regiões de alta e de baixa densidade.

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O multiverso pode ser inevitável

Se o universo existia antes do Big Bang e se expandia em escalas inimagináveis, será que outros Big Bangs poderiam ter acontecido, dando origem a outros universos? Dependendo de como você observa, nosso universo só teria chances de existir caso outros também tenham nascido.

Nosso universo é perfeitamente ajustado para comportar tudo o que observamos — galáxias, estrelas, planetas, vida. Até o momento, os cientistas ainda não sabem dizer se isso foi sorte ou resultado de alguma outra “regra” além da nossa compreensão.

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Essa regra bem poderia ser a probabilística: se uma grande quantidade de Big Bangs tivesse dado origem a outros infindáveis universos, a mais ínfima diferença nas flutuações quânticas entre eles poderiam resultar em alguns universos bem-sucedidos e outros universos natimortos.

Conforme a Teoria das Cordas (ainda não comprovada observacionalmente), a realidade consiste em cerca de 11 dimensões, 8 delas tão compactas que não podemos vê-las. Cada tipo de compactação poderia criar um universo com diferentes propriedades físicas, e as leis das probabilidades fariam com que outros Big Bangs tivessem essas diferenças em relação ao nosso.

Portanto, outros universos podem ser regidos por leis diferentes, com física exótica, gravidade funcionando de outros modos, e assim por diante. De fato, pesquisas recentes sugerem que podem existir universos ainda mais amigáveis ​​à vida do que o nosso, embora a maioria poderia nascer “fracassada”.

Claro, nada disso pode ser comprovado, mas as possibilidades de encontrar evidências são reais. Mas, antes de qualquer coisa, os cientistas ainda terão trabalho para encontrar mais evidências para o modelo de inflação cósmica, até que ele seja, de certa forma, inquestionável.

Fonte: The Astrophysical JournalUniversity of Chicago, ESA; via: Starts With a Bang