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A que distância fica a fronteira do universo — se é que ela existe?

Por| 20 de Fevereiro de 2020 às 08h00

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Pablo Carlos Budassi
Pablo Carlos Budassi

O espaço. A fronteira final. Se você já assistiu a alguma série ou filme da franquia de ficção científica Star Trek, já conhece essa introdução que desafiou nossa imaginação sobre o que poderia existir nos confins do universo. Será que ele acaba? Existe mesmo uma fronteira? Se pudéssemos viajar mais rápido que a velocidade da luz em busca dos limites do universo, chegaríamos ao fim do tecido do espaço-tempo ou simplesmente viajaríamos em um espaço ilimitado? Poderíamos audaciosamente ir até onde nada mais existe? Será que acabaríamos voltando ao ponto de partida, como se estivéssemos dentro de um grande círculo? Ou eventualmente atravessaríamos uma fronteira invisível e entraríamos em um universo paralelo, regido por leis físicas completamente diferentes das que conhecemos?

Embora essas perguntas pareçam mais filosóficas do que científicas, existem algumas teorias e fatos observáveis que podem explicar como o espaço se comporta além daquilo que chamamos de "universo observável". E podemos chegar a diferentes respostas dependendo de como interpretamos a pergunta, ou seja, o que exatamente estamos chamando de “fronteira” do universo. Quem aborda o assunto é o astrofísico Ethan Siegel, que mantém um blog chamado Starts With a Bang na Forbes.

Uma das formas de encarar essa pergunta é simplesmente imaginar uma viagem a esmo, em linha reta, em busca do fim da estrada. Mas também podemos considerar que os limites do cosmos incluem tudo o que poderia entrar em contato conosco desde o início do Big Bang. São abordagens diferentes, que podem levar a diferentes respostas. Independente disso, no entanto, algumas regras da astrofísica precisam ser observadas antes de buscar uma resposta.

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O primeiro - e talvez principal - conceito a ter em mente é que o espaço não aceita a forma como concebemos a ideia de território e fronteiras. Normalmente, pensamos no espaço como um sistema de coordenadas, assim como fazemos para determinar fronteiras aqui na Terra. No caso do cosmos, imagina-se uma grade tridimensional, com distâncias em três eixos, onde a menor distância entre dois pontos é uma linha reta. Também imagina-se que essas distâncias não mudam com o tempo.

Mas todas essas suposições falham quando começamos a observar o universo. A primeira delas é a ideia de que a menor distância entre dois pontos é uma linha reta. Isso perde o sentido assim que começamos a estudar massas, energias e forças gravitacionais. É que o próprio tecido do espaço-tempo está sujeito a curvaturas causadas pela presença de matéria e energia. Assim, a menor distância entre dois pontos depende do formato que o universo tem entre esses pontos.

Além disso, o universo cheio de matéria e energia não pode ser estático e imutável. Ele deve evoluir expandindo ou contraindo. As evidências de que o universo está se expandindo são muitas, e isso faz com que as distâncias entre os objetos aumente cada vez mais. A maioria das pessoas supõe que, se o cosmos existe desde o Big Bang, que ocorreu há 13,8 bilhões de anos, então o limite de quão longe podemos ver será de 13,8 bilhões de anos-luz. Mas isso só seria verdade se o universo fosse estático e não se expandisse.

Na verdade, quanto mais longe olhamos, os objetos distantes parecem se afastar de nós ainda mais rapidamente. Astrônomos foram capazes de reunir informações sobre os componentes do universo e chegaram a um valor, incluindo a distância do horizonte cósmico observável: 46,1 bilhões de anos-luz.

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Esse limite, no entanto, não é uma "fronteira" do universo, porque não se trata de um limite no espaço. Se por acaso estivéssemos localizados em qualquer outro ponto do cosmos, ainda assim poderíamos detectar e observar tudo à nossa volta nessa esfera de 46,1 bilhões de anos-luz centrada em nós. Em outras palavras, estamos falando de um limite no tempo, e não no espaço.

Essa margem representa o limite do que podemos ver porque a velocidade da luz, mesmo em um universo em expansão, apenas permite que sinais viajem dentro do limite de 13,8 bilhões de anos de história do universo. Essa distância ultrapassa os 13,8 bilhões de anos-luz por causa da expansão do universo, mas ainda é limitada pelas leis da física.

Isso implica em outros fatos que podem parecer meio estranhos se não compreendermos os princípios apresentados acima. Por exemplo, a uma certa distância - aproximadamente 18 bilhões de anos-luz - podemos ver a luz emitida, há muito tempo, por uma estrela, por exemplo. Mas jamais seremos capazes de ver a luz que está sendo emitida agora. O sinal nunca chegará a nós.

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Isso significa que, se estivéssemos em um foguete de alta potência, todos os objetos atualmente contidos nesse raio de 18 bilhões de anos-luz seriam eventualmente alcançáveis por nós, mesmo que o universo continuasse a se expandir e essas distâncias continuassem a aumentar durante nossa viagem - afinal, nosso foguete estaria no mesmo tecido do espaço-tempo em expansão.

No entanto, os objetos além dessa distância nunca seriam alcançáveis. Mesmo que alcançássemos distâncias cada vez maiores, elas retrocederiam mais rápido do que poderíamos viajar, e 94% de todas as galáxias no universo observável já estão eternamente além do nosso alcance.

Até aqui estamos falando do universo observável, mas ainda há uma fronteira diferente que podemos considerar: podemos olhar para o infinito, mesmo que tenhamos apenas algumas hipóteses e teorias sobre o que há mais além daquilo que podemos observar. Por exemplo, podemos ponderar se o universo não observável se dobra ou não.

Podemos tentar responder isso com uma extrapolação do que observamos quando tentamos medir a curvatura espacial do universo. Se o universo for curvado positivamente, as linhas paralelas convergirão e os três ângulos de um triângulo somarão mais de 180 graus. Se o universo for negativamente curvado, as linhas paralelas divergirão e os três ângulos de um triângulo somarão menos de 180 graus. E se o universo for plano, as linhas paralelas permanecerão paralelas e todos os triângulos terão exatamente 180 graus.

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Para determinar isso, seria preciso pegar os sinais cósmicos mais distantes de todos, como a luz que resta do próprio Big Bang, e examinar em detalhes como as flutuações são padronizadas. Se o universo for curvado em uma direção positiva ou negativa, os padrões de flutuação que observamos acabarão distorcidos para aparecer em escalas angulares maiores ou menores. Isso não aconteceria em um universo plano.

Se pegarmos os melhores dados disponíveis, que provêm das flutuações do fundo cósmico em micro-ondas e dos detalhes de como as galáxias se agrupam em grandes escalas a várias distâncias, chegamos a uma conclusão: se o universo for curvado, será em um nível que não ultrapassa 0,4%. Isso significa que se a curva for como uma hiperesfera, seu raio será pelo menos 250 vezes maior que a parte observável para nós.

Novamente, a resposta depende da definição de “fronteira”. Se você definir a fronteira do universo como o objeto mais distante que poderíamos alcançar se começássemos nossa jornada agora, então o limite atual é uma mera distância de 18 bilhões de anos-luz, abrangendo apenas 6% do volume do universo observável. Se definir como o limite do que podemos observar através de emissão de algum sinal, a margem chega a 46,1 bilhões de anos-luz. Mas se estivermos falando das bordas do cosmos não observável, o limite que temos como resposta é de pelo menos 11.500 bilhões de anos-luz - e pode ser ainda maior.

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Quer dizer que o universo pode ser finito? Bem, é hipoteticamente possível que ele tenha até mesmo a forma conhecida como “toro” - ou seja, uma rosquinha gigante. Mesmo que imenso e em constante expansão, ainda é finito, com uma quantidade finita de informações para nos transmitir. Se existe algo além do nosso universo, seja ele um hipertoro, uma esfera ou tenha uma forma plana, ainda é impossível saber. Resta apenas imaginar.

Fonte: Forbes