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Será que existe um universo paralelo com versões alternativas de nós mesmos?

Por  • Editado por  Patricia Gnipper  | 

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Jaime Salcido/EAGLE COLLABORATION
Jaime Salcido/EAGLE COLLABORATION

A suposta existência de universos paralelos (como aqueles apresentados na ficção científica e em filmes da Marvel) é uma possibilidade tanto para a cosmologia quanto para a mecânica quântica. Entretanto, ao contrário dos filmes, é muito improvável haver uma versão alternativa de nós mesmos em algum lugar do multiverso.

Existem diferentes hipóteses que poderiam explicar a existência de outros universos além deste onde vivemos. Algumas dizem existir muitos universos parecidos com o nosso, outras propõem infinitas “bolhas”, cada uma com seu próprio cosmos. Talvez seja impossível comprovar a existência de qualquer universo paralelo ou alternativo, mas a ideia não deixa de ser sedutora — principalmente sabendo que a física que conhecemos permite essas hipóteses.

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Mas a ideia de existirem infinitos universos implica que algum deles será, inevitavelmente, parecido com o nosso? Com uma Via Láctea alternativa, onde um outro Sistema Solar orbita um outro Sagitário A* (o buraco negro supermassivo central da nossa galáxia)? E se esse universo “gêmeo” existir, haverá nele uma Terra alternativa, habitada por seres humanos e, entre eles, existiria uma versão alternativa minha e sua? Se houver, será que eles tomaram decisões diferentes das nossas?

Essa última pergunta é a mais tentadora de todas — e tema principal das histórias fictícias sobre universos paralelos. Infelizmente, no entanto, ainda que a quantidade de possíveis universos seja próxima de infinito, as chances de algum deles ter nossas versões alternativas seriam quase nulas.

Não há evidências concretas de outros universos, e talvez seja impossível obtermos qualquer pista real sobre eles, caso existam. Tudo o que sabemos é que o modelo cosmológico atual permite essa hipótese.

Contexto cosmológico

Na teoria cosmológica mais aceita atualmente pelos cientistas, o Big Bang não foi o início de tudo. Antes dele, existiu algo chamado período inflacionário, que, de certa forma, “preparou” o espaço para ocorrer o Big Bang.

Durante esse período, o espaço em si foi preparado para o “surgimento” da matéria ao se expandir em um ritmo extraordinário. Então, veio o Big Bang, dando origem a um universo denso, quente e uniforme. Aquele universo denso, quente e uniforme foi evoluindo para um estado mais frio, mais difuso e “granuloso” — isto é, com “falhas” onde a matéria acabou por se aglomerar pela força da gravidade.

Com o passar do tempo, as partículas formadas após o Big Bang interagiram entre si até formar as estrelas, galáxias e aglomerados de galáxias que conhecemos hoje. Podemos ver algumas evidências desse processo, como a radiação cósmica de fundo — radiação em micro-ondas remanescentes do Big Bang.

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Infelizmente, não podemos ver nada mais distante que esse limite, não porque não exista mais nada para além do universo observável, mas por uma limitação imposta pelo tempo. Se o nosso universo possui espaço e tempo unificados (segundo a Teoria da Relatividade Geral de Albert Einstein), não houve tempo o suficiente para alguma luz ainda mais antiga se formar e viajar até nós através do espaço. Em outras palavras, a radiação cósmica de fundo é a mais antiga que podemos ver, porque foi a primeira a conseguir viajar pelo universo por 13,7 bilhões de anos-luz.

E o universo não era homogêneo e uniforme durante o período inflacionário; ao contrário, a inflação ocorreu de modo diferente em determinadas regiões do espaço criado por ela. O motivo: as leis quânticas bizarras.

Contexto quântico

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A inflação cósmica pré-Big Bang aconteceu como uma onda que se espalhou ao longo do tempo, como um tipo de campo quântico. À medida que o tempo passava, mais e mais e mais espaço foi criado. Porém a natureza quântica dos campos fez com que certas regiões tivessem mais probabilidade de ter sua expansão finalizada. Enquanto isso, outras regiões teriam mais probabilidade de continuar sua inflação.

Essas regiões não são pequenas, já que a inflação cósmica ocorreu em escala exponencial. Isso significa que, à medida que o tempo passa de forma incremental, as distâncias entre dois pontos ficam duas vezes maiores, depois quatro vezes, oito, dezesseis, trinta e dois, e assim por diante.

Além disso, esses “aumentos” exponenciais de espaço acontecem em uma escala de tempo em frações de segundos. No momento em que 10⁻³⁴ segundo (uma fração ridiculamente minúscula de segundo) se passa após o início da expansão, o espaço ficou cerca de 10^3 (ou 1000) vezes seu tamanho inicial. No momento em que 10⁻³³ segundos se passaram, o espaço se tornou cerca de 10³⁰ (o número 1 seguido por 30 zeros) vezes seu tamanho inicial. E assim por diante.

Os números acima são inimagináveis para a mente humana, mas dão uma boa noção de como o espaço se tornou estupendamente grande em pouco tempo. Mas, como já dissemos, algumas regiões do espaço aumentaram mais, outras menos.

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Aqui está a reviravolta: cada uma dessas regiões onde a inflação termina dará origem a um Big Bang e a um universo como o nosso. Isso implica que, se houveram infinitas regiões onde a inflação terminou, existem infinitos universos.

Com o passar do tempo, por causa da dinâmica da expansão, duas regiões onde a inflação acaba nunca vão interagir ou colidir, pois as regiões onde a inflação não acaba se expandirão entre elas, afastando esses “universos-bolha” uns dos outros.

Existe uma Terra alternativa em um universo paralelo?

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Não sabemos muito mais a respeito dos supostos universos paralelos. É impossível dizer se eles seguem as mesmas leis da física ou se são completamente exóticos. Não sabemos nem mesmo o número de regiões do espaço onde a inflação cósmica terminou. Por isso, não podemos sequer deduzir a quantidade de universos que poderiam existir além do nosso.

Mas podemos calcular algumas probabilidades baseadas em nosso próprio universo, ou melhor, no tempo e quantidade de matéria que existe nele. Por outro lado, as chances mais otimistas de existir um universo onde haja versões nossas exigem algumas coisas realmente difíceis de terem acontecido.

Primeiro, o estado inflacionário que precedeu o Big Bang precisa ter durado uma quantidade de tempo infinita. Vamos supor que o universo tenha expandido exponencialmente por 13,8 bilhões de anos (a idade do nosso cosmos). Isso criaria volume suficiente de espaço para 10^(10⁵⁰ ) universos como o nosso, ou 10^10000000000000000000000000000000000000000000000000 universos.

Não podemos negar que seja um número muito grande de universos, mas para o mundo das probabilidades quânticas não é o suficiente. É um número finito que não supera a quantidade de probabilidades para cada um desses universos-bolha.

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Então precisamos quantificar o número de resultados possíveis. Como um outro universo poderia se desenvolver? Existem muitas probabilidades de arranjos e leis físicas diferentes daqueles encontrados em nosso próprio universo, que levariam a resultados bem diferentes daquilo que vemos em um telescópio.

São tantas as possibilidades de configurações de um outro universo que nem vale a pena pensar em como eles poderiam ser. Então, vamos pensar novamente em números.

Existem cerca de 10⁹⁰ partículas em nosso universo (o número 1 seguido por 90 zeros, o que não é pouca coisa), incluindo fótons e neutrinos. Para que algum outro universo seja parecido com o nosso, ele precisa ter a mesma quantidade de partículas, cada uma delas com a mesma história de interações desde o Big Bang. Nosso universo tem 13,7 bilhões de anos, então o suposto universo “gêmeo” do nosso precisaria ter a mesma idade. Isso nos dá esse período de tempo para as 10⁹⁰ partículas interagirem.

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Ainda nesse cenário, existem vários resultados possíveis após o tempo de 13,7 bilhões de anos. Dadas as leis da física quântica e a taxa de interações de partículas, esse universo ainda poderia ser bem diferente do nosso.

Cientistas estimam que o número de resultados quânticos possíveis para essas interações de partículas é um pouco maior que (10⁹⁰)! Este sinal de exclamação é parte do número, e significa uma multiplicação fatorial. Por exemplo, para calcular a expressão 5!, temos que multiplicar o número 5 e todos os seus antecessores:

  • 5 x 4 x 3 x 2 x 1 = 120

Já a expressão 1000! seria:

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  • 1000 x 999 x 998 x 997 e assim por diante até 3 x 2 x 1

O resultado dessa multiplicação é um número de 2477 dígitos. Esse número é a quantidade de probabilidades de configurações para este universo (com o mesmo número de partículas e mesma idade do nosso). Culpe a natureza dos processos quânticos.

Isso nos deixa com um problema. O número de universos paralelos possíveis tende ao infinito, porém eles só podem surgir em uma taxa limitada. Já o número de resultados possíveis para este universo inicialmente parecido com o nosso também tende ao infinito, e esses resultados aumentam muito mais rapidamente.

Conclusão

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Tudo isso implica que, a menos que a inflação esteja ocorrendo por uma quantidade de tempo verdadeiramente infinita, não surgirão universos paralelos idênticos ao nosso. O número de resultados possíveis das interações entre partículas aumenta mais rápido do que o número de universos possíveis formados a partir da inflação.

Seriam necessários muito mais universos paralelos do que poderiam existir. Ainda que, contra todas as probabilidades, houvesse algum universo idêntico ao nosso, suas linhas de tempo podem não incluir um você alternativo. Afinal, seus pais nessa realidade paralela podem nunca ter se conhecido, ou talvez as formas de vida nunca tenham saído da água para evoluir em seres terrestres.

Ou seja: a ideia de que existe um outro você vivendo uma vida diferente da sua em um universo paralelo continua sendo apenas trama de ficção científica, ainda que existam cientistas conduzindo estudos sérios sobre o assunto.

Fonte: Starts With a Bang