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Eclipses solares em Marte causam uma pequena inclinação no Planeta Vermelho

Por| 07 de Setembro de 2020 às 13h00

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Eclipses solares em Marte causam uma pequena inclinação no Planeta Vermelho
Eclipses solares em Marte causam uma pequena inclinação no Planeta Vermelho
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Os eclipses solares em Marte são bem mais comuns que na Terra. É que o Planeta Vermelho conta com duas luas, sendo que uma delas, Fobos, tem órbita acelerada — ela completa três voltas ao redor do Planeta Vermelho em um único dia marciano. Os cientistas decidiram usar a sonda InSight da NASA para observar o evento, e descobriram algo bem curioso: uma sutil inclinação do instrumento.

Com a InSight, os cientistas puderam detectar um momento em que Fobos passou na frente do Sol. Isso aconteceu algumas vezes desde que a sonda pousou por lá, em 2018, mas foi preciso esperar algum tempo para que um eclipse interessante ocorresse no local onde a sonda está localizada — a planície Elysium Planitia. Com as medições do evento, os pesquisadores puderam identificar uma série de consequências em Marte.

Essa nova pesquisa é o tipo de ciência que não estava na agenda da InSight, mas pode ser uma agradável surpresa entre as missões extra da sonda, que já está perto de ultrapassar seu tempo de vida útil previsto pela equipe científica. "É uma observação completamente sortuda", disse Simon Stähler, autor principal do estudo.

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Fobos é a maior das duas luas marcianas e a que orbita mais perto do Planeta Vermelho. No entanto, ela ainda é pequena demais para cobrir todo o disco solar - por isso os eclipses de Marte são bem diferente dos terrestres. Lá, existem apenas eclipses parciais, enquanto nós temos, eventualmente, eclipses solares totais. Mesmo assim, os cientistas decidiram ver se a sonda era capaz de notar algo especial durante os trânsitos - passagem de um objeto espacial entre outros dois, neste caso, de Fobos entre o Sol e o planeta.

A equipe deixou a sonda coletando os dados dos eventuais eclipses durante algum tempo, mas demorou até que alguém decidisse analisar os resultados. Quando Stähler e seus colegas decidiram dedicar um tempo para olhar os dados depois de um ano, perceberam que algumas coisas pareciam incomuns. “Encontramos alguns sinais não muito conclusivos”, disse ele. “Mas, de qualquer forma, isso nos deu uma ideia sobre o que olhar no eclipse que se aproximava”. Ele se referia a um trânsito que aconteceria do dia 24 de abril.

Naquela data, o eclipse parecia promissor, pois ocorreria pouco antes do meio-dia, ou seja, haveria muito Sol para “pouca Fobos”. Os cientistas esperavam uma queda de 30% na luz solar que atinge a sonda nesse horário, seis vezes a diferença para alguns dos trânsitos anteriores. O que será que aconteceria com a região de Elysium Planitia durante o fenômeno? Talvez nada especial. Stähler e seus colegas esperavam os mesmos tipos de fenômenos que os eclipses solares podem causar na Terra, como as respostas atmosféricas ao frio que a sombra repentina causa, por exemplo.

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Mas durante o eclipse marciano do dia 24 de abril, os instrumentos da InSight haviam registrado algo: uma diferença nas medições do sismômetro e do magnetômetro da sonda. Por quê? A princípio, ninguém sabia explicar. Talvez a queda de temperatura durante o eclipse tenha acionado um sistema de baixa pressão em Marte, o que elevaria um pouco a superfície marciana. Isso explicaria os resultados do sismômetro. Mas quando os pesquisadores olharam mais de perto, descobriram que não houve um fenômeno atmosférico ali.

Foi aí que uma mina localizada na Floresta Negra, na Alemanha, deu aos cientistas a peça que faltava.

O sismômetro alemão

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Na Floresta Negra havia uma mina que foi abandonada e transformada em centro de pesquisa. Lá é o local de trabalho de Rudolf Widmer-Schnidrig, um colega de Stähler. Rudolf trabalha com sismologia de baixa frequência, observando oscilações da Terra para estudar a estrutura do manto e do núcleo. E ele achou que os dados da InSight durante o eclipse pareciam estranhamente familiares.

Certa vez, Widmer-Schnidrig deixou uma luz acesa perto de um sismômetro, apenas para que um cronômetro automático a desligasse durante a noite - mas a alguns metros de distância, o sismômetro registrou uma alteração. Ele viu um pequeno tique, uma pequena inclinação, semelhante ao Stähler viu em Marte. Então Widmer-Schnidrig repetiu os passos do interruptor de luz no fundo da mina, desta vez de propósito. E os sinais coincidiram, sugerindo que sismômetros sensíveis, particularmente bem isolados - como os da InSight e os da Floresta Negra - podem de fato detectar uma pequena inclinação no solo causada pela luz se transformando em escuridão. Isso está associado ao efeito de resfriamento.

Essa inclinação registrada pelo sismômetro da InSight é realmente minúscula. Stähler compara a uma mesa de 1 metro se levantamos um dos seus lados apenas o equivalente ao diâmetro de um átomo. Esse é o movimento de inclinação que o sismômetro sofreu durante o eclipse. Quanto ao sinal do magnetômetro, ele reflete a queda repentina na energia que flui através dos painéis solares durante o eclipse. Em outras palavras, de certo modo, Marte se inclina. Bem pouquinho.

Implicações e aplicações

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No início, essa conclusão foi meio decepcionante para a equipe, pois eles esperavam que fosse algum fenômeno planetário mais interessante. Mas os dados serão bastante úteis, pois os efeitos acontecem com bastante frequência. Como o magnetômetro coleta dados em intervalos muito curtos, os dados da sonda permitirão aos cientistas cronometrar os trânsitos de Fobos com muita precisão, identificando a localização da lua com mais precisão do que nunca.

Em outras palavras, os cientistas podem agora usar o minúsculo sinal de inclinação de Marte para mapear a órbita de Fobos com mais precisão do que nunca, já que agora podem usar o sinal para dizer quando exatamente o eclipse começa e quando termina. Isso pode ser importante para futuras missões espaciais, pois para pousar na pequena lua é preciso saber exatamente onde ela está. A agência espacial japonesa JAXA, por exemplo, planeja enviar uma sonda às luas de Marte em 2024 e trazer amostras de Fobos de volta à Terra.

Além disso, o sinal poderá ajudar a saber mais sobre o futuro do sistema marciano. É que a localização de Fobos está em constante mudança, não só por causa de sua órbita ao redor de Marte, mas também porque ela está cada vez mais se aproximando do Planeta Vermelho, devido ao puxão gravitacional de Marte. Um dia, daqui a alguns milhões, ou bilhões de anos, a lua colidirá com a superfície do planeta. Por isso, os movimentos dela precisam ser monitorados, e as observações de trânsito da InSight não são apenas as mais precisas, mas também se baseiam em décadas de medições - são 40 anos de dados coletados sobre Fobos e seus trânsitos.

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Por fim, os pesquisadores querem saber se Marte foi formado do mesmo material que a Terra, ou se diferentes componentes poderiam explicar porque a Terra tem placas tectônicas, uma atmosfera densa e condições que suportam a vida - características que faltam em Marte. Os sinais podem ajudar a encontrar pistas para isso. Resta agora saber se a NASA poderá estender o tempo de missão da InSight e deixá-la ativa por mais tempo, monitorando os eclipses solares de Marte.

Fonte: Phys.org