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Cultivo na ISS: células-tronco que crescem no espaço têm função potencializada

Por| 20 de Agosto de 2020 às 20h15

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Pixabay
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Para solucionar a falta de órgãos para doações, cientistas desenvolvem projetos com impressoras 3D e até planejam o cultivo de órgãos humanos dentro de embriões animais, em laboratórios terrestres. Entretanto, as possibilidades se multiplicam no espaço, como descobriram os pesquisadores da organização norte-americana Mayo Clinic. Em novo estudo, o grupo conseguiu cultivar células-tronco humanas dentro da Estação Espacial Internacional (ISS) e, em breve, essas células poderão compor o tecido de um coração, a partir de terapias regenerativas.

Os pesquisadores da Mayo Clinic estudam como é possível superar as barreiras da bioengenharia e de que forma a produção das células-tronco, que é lenta na Terra, poderia ser acelerada no espaço com a microgravidade e a possibilidade de crescimento em três dimensões. Para isso, a equipe cultivou, na ISS, células-tronco mesenquimais já adultas e que podem se diferenciar em outros tipos.

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Com o objetivo de analisar os benefícios da viagem espacial no cultivo de células-tronco, o experimento regressou para a Flórida, nos EUA, e o Dr. Abba Zubair, Ph.D., patologista e líder no Centro de Medicina Regenerativa, explica os detalhes desse retorno para o Canaltech. "Nossas amostras foram enviadas de volta à Terra usando a cápsula de retorno SpaceX que pousou em algum lugar no Oceano Pacífico e foi recuperada; e as amostras enviadas para o nosso laboratório da Mayo Clinic".

Como foi o experimento?

Procurando entender se o cultivo de células-tronco em microgravidade poderia melhorar a função e acessibilidade, a equipe de Zubair lançou um dispositivo especial para transporte e cultura dessas células. Na ISS, por 14 dias, astronautas captaram imagens diárias dessa cultura celular e colheram amostras no sétimo e no 14° dia. Em paralelo, o experimento ocorreu da mesma forma, só que na Terra.

Em comparação, os pesquisadores observaram que as células que cresceram no espaço tinham melhorado em função se comparadas com as que cresceram na Terra. Entretanto, a microgravidade teve um efeito mais significativo no melhoramento da função celular do que teve na aceleração do processo de crescimento das células, ou seja, elas foram potencializadas com esse cultivo espacial.

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Segundo o patologista Zubair, o cultivo na ISS teve um impacto significativo na capacidade da célula-tronco em secretar citocina (uma proteína e nos fatores de crescimento. Além disso, as células pareceram ser mais potentes em termos de capacidade imunossupressora, como a possibilidade de se evitar rejeição em um transplante, se comparadas ao controle terrestre idêntico.

Quanto ao crescimento e desenvolvimento dessas células-tronco, há um grande diferencial entre os ambientes. Isso porque, na Terra, o cultivo padrão é bidimensional, o que dificulta a formação de tecidos tridimensionais. No entanto, o raciocínio é diferente no espaço que fornece um meio tridimensional mais natural para a expansão de células-tronco e desenvolvimento de órgãos.

"É viável e seguro cultivar células-tronco a bordo da ISS para aplicação em humanos no futuro. Em um futuro próximo", afirma o médico a partir dos resultados. Inclusive, uma preocupação sobre o cultivo em microgravidade é se poderia provocar o aparecimento de células cancerígenas. Entretanto, os testes cromossômicos, que avaliam danos de DNA e de tumorigenicidade, não mostraram evidências de transformação maligna de células cultivadas no espaço.

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Desafios da pesquisa espacial

"Os cientistas têm estudado o crescimento tridimensional de células e células-tronco por décadas, geralmente, usando um andaime como estrutura de suporte [na Terra]. Só recentemente os cientistas exploraram o uso do espaço e seu ambiente de microgravidade para cultivar células em três dimensões", conta Zubair.

Nesse cenário, a pesquisa está entre as primeiras a explorar o uso da microgravidade para expandir as células-tronco, buscando aplicação desse conhecimento em humanos. Afinal, a demanda por terapias regenerativas cresce cada vez mais, independente dos desafios. "As células-tronco são inerentemente projetadas para manter seu número no corpo humano e, quando colhidas, é um desafio expandi-las em uma quantidade significativa para atender à demanda atual", explica o patologista.

Por outro lado, sabe-se que gravidade impacta, praticamente, toda a fisiologia humana, desde a expressão do gene até a divisão celular. "A combinação desses fatores facilita nosso processo de pensamento de que explorar a possibilidade de crescimento de células-tronco e tecidos em condições de microgravidade tem o potencial de resolver a escassez de células-tronco e órgãos na Terra", afirma Zubair.

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Quando a técnica for melhor dominada, o uso de terapia de células-tronco deve auxiliar no tratamento de lesão da medula espinhal, diabetes, doença de Parkinson, doença de Alzheimer, doença cardíaca, queimaduras e até mesmo câncer. Para isso, pesquisas adicionais ainda serão necessárias.

No entanto, além da bioengenharia, pesquisas de grande porte, como a da Mayo Clinic, contam com desafios mais humanos. Afinal, o acesso ao espaço é restrito, ou seja, o número de pesquisas nesse ambiente desafiador é limitado, ainda mais com o reduzido compartimento de carga para o transporte. "Há financiamento limitado para pesquisa espacial, pois os doadores podem não compreender a aplicação imediata à humanidade", completa Zubair sobre a questão dos financiamentos.

Leia o artigo completo sobre as possibilidades do cultivo celular na microgravidade, publicado no Nature Partner Journals Microgravity, clicando aqui.

Fonte: Nature