Controvérsia sobre existência do Planeta Nove ganha mais fôlego com novo estudo
Por Patricia Gnipper | •
A conversa sobre a existência ou não do tal do Planeta Nove (também chamado de Planeta X algumas vezes), é antiga. A própria NASA já chegou a admitir que as evidências de sua existência são grandes demais para serem ignoradas, e muitos estudos e observações vêm sendo feitas nos últimos anos para tentar comprovar (ou refutar) essa ideia. E, agora, mais um estudo surge colocando lenha nessa fogueira.
Mas, primeiro, precisamos explicar que evidências são essas, e por que raios imagina-se que exista um objeto tão grande e massivo quanto um planeta nos confins do Sistema Solar, sendo que, até agora, ninguém conseguiu observá-lo diretamente — mesmo com os telescópios mais modernos. Depois, vamos falar sobre esse novo estudo que chega para, talvez, refutar a hipótese do Planeta Nove.
E que objetos são esses, cujas órbitas estranhas podem ser explicadas pela influência gravitacional de um planeta desconhecido? A resposta é: são muitos. Recentemente, por sinal, descobrimos mais de 100 pequenos mundos além de Netuno. Mas falando de apenas alguns deles, aqueles que mais chamaram atenção na comunidade científica nos últimos anos… Um deles é o 2015 BP519, que é grande o suficiente para chegar à categoria de planeta-anão — a mesma da qual Plutão faz parte desde 2006, quando deixou de ser o nono planeta do Sistema Solar, sendo "rebaixado" de categoria.
Outro objeto recentemente descoberto por ali, reforçando a hipótese do Planeta Nove, é o TG387, apelidado de The Goblin. Ele fica extremamente distante, muito mais do que Plutão — uma volta completa ao redor do Sol leva cerca de 40 mil anos para acontecer. E justamente por estar tão distante dos demais grandes mundos do Sistema Solar que ele reforça a existência do Planeta Nove na região. Afinal, como sua órbita seria "bagunçada", como se descobriu, sem a influência de um grande corpo rochoso por lá?
Mais um objeto com características orbitais similares às do The Goblin, que reforça a hipótese do Planeta Nove, é 2018 VG18, apelidado de Farout (que pode ser traduzido como "muito longe"). Estimativas iniciais indicam que ele deve levar mais de mil anos para dar uma volta completa ao redor do Sol, e ele fica 3,5 vezes mais longe do que Plutão está de nossa estrela. E sua órbita também tem características inusitadas, que podem ser explicadas pela influência da gravidade de um mundo grande o suficiente para ser um planeta na região.
No final do ano passado, o telescópio espacial TESS pode ter encontrado pistas capazes de confirmar a existência do Planeta Nove. Pode, mas esse martelo ainda não foi batido. Esse telescópio foi projetado para detectar planetas orbitando outras estrelas que não o Sol, pelo método do trânsito — quando um planeta passa à frente de sua estrela, o brilho dela apresenta uma leve redução, e essa diminuição temporária do brilho é justamente o que o TESS detecta, indicando que existe um planeta na órbita de tal estrela. Mas, mesmo que ele não seja capaz de observar um planeta escuro no Sistema Solar (como seria o caso do Planeta Nove), ele "olha" fixamente para áreas específicas do céu, por longos períodos, tirando muitas fotos do mesmo campo de visão. Empilhando essas imagens, pesquisadores conseguem, então, detectar objetos mais fracos que ficariam ocultos à primeira vista. Ou seja: pode ser que o TESS já tenha descoberto dados concretos sobre o Planeta Nove – e é isso que cientistas vêm tentando confirmar.
Mas pode ser que o Planeta Nove não seja um planeta
Que há alguma coisa ainda desconhecida interferindo na órbita de objetos do Cinturão de Kuiper, isso é quase que inegável. Agora, se essa coisa é mesmo um planeta, a dúvida permanece — e há outras hipóteses na mesa.
Uma delas sugere que o Planeta Nove pode ser um buraco negro primordial — algo ainda no campo hipotético, já que nenhuma observação chegou a comprovar que esse tipo de buraco negro exista. Um buraco negro primordial seria um buraco negro relativamente pequeno, porém muito antigo, formado como consequência de flutuações de densidade que aconteceram no início do universo conhecido, logo após o Big Bang. Se tais objetos existem, os de menor massa já evaporaram há muito tempo, mas os mais massivos poderiam ter sobrevivido até os dias de hoje. Cálculos recentes indicam que um buraco negro primordial com massa de mais ou menos cinco vezes a da Terra (e um raio de apenas cinco centímetros) poderia explicar as anomalias gravitacionais observadas na região onde estaria o suposto Planeta Nove. Ou seja: esse tipo hipotético de buraco negro seria mais um candidato capaz de explicar os fenômenos misteriosos observados naquela região.
Outra ideia sugerida recentemente é a de que o Planeta Nove pode ser, na verdade, um aglomerado de objetos menores atuando em conjunto, exercendo, portanto, a força gravitacional necessária para bagunçar a órbita dos demais objetos da região. E é aí que entra o novo estudo mencionado no título desta matéria, questionando, também, tal possibilidade.
O que diz o novo estudo
Astrônomos da Universidade da Pensilvânia, usando dados do observatório Dark Energy Survey, divulgaram um estudo desafiando a hipótese do aglomerado de pequenos objetos agindo como se fossem um planeta no Cinturão de Kuiper.
A pesquisa mostra que não seria possível haver objetos transnetunianos agrupados de tal maneira. Pedro Bernardinelli, astrônomo e principal autor do artigo, disse que seus dados mostram a região do Cinturão de Kuiper habitada por numerosos objetos pequenos, porém distribuídos de maneira uniforme, e não agrupados.
Resumo da ópera: o novo estudo entra em contradição com a ideia de que, em vez de um planeta grande e rochoso, o Planeta Nove seria a junção de um montão de pequenas rochas impactando a órbita de outros mundos por lá. Mas não chega a refutar a possibilidade de existir alguma coisa massiva o suficiente na região, a ponto de "bagunçar" as órbitas dos planetas-anões recentemente descobertos.
Ou seja: o mistério continua, bem como as controvérsias no meio científico. Samantha Lawler, da Universidade de Regina, no Canadá, entende que "a única maneira de provar que o Planeta Nove não existe é procurar em cada centímetro quadrado do céu, e não encontrá-lo". Só que isso é como procurar agulha em um palheiro, processo que envolve muitos recursos, muitas pessoas, e muito tempo.
Mas há uma luz no fim do túnel surgindo aí: em 2022, o Large Synoptic Survey Telescope, cujo nome recentemente foi modificado para Vera C. Rubin Observatory, será inaugurado. Atualmente em construção no Chile, o telescópio representará a próxima geração desses observatórios terrestres, sendo muito mais potente do que os da geração atual — e proporcionando descobertas sem precedentes. Quem sabe não seja por meio dele que, finalmente, resolveremos o mistério do Planeta Nove, não é mesmo?
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*Com informações de New Scientist e Big Think